Vamos ter que viver quantas crises mais para concluir que o modelo de presidencialismo de coalizão brasileiro está esgotado?
Porque se é o presidencialismo de coalizão que tem garantido a ampliação da base parlamentar e a governabilidade, é esse mesmo modelo que vem comprometendo a gestão pública, ao abrir brechas para a corrupção e para a ineficiência.
Em nome da governabilidade, optamos por um pragmatismo político que tem esbarrado no limite da irresponsabilidade. A regra geral hoje é o patrimonialismo e o aparelhamento partidário dos cargos de confiança.
É certo que o conflito aberto entre Executivo e Legislativo tem como resultado a paralisia política, com enormes prejuízos para a sociedade. Também não dá para negar a lentidão do processo legislativo - e a governabilidade exige respostas mais rápidas.
Mas nada justifica as negociações nem sempre republicanas que vêm assegurando apoio parlamentar ao governo.
Se podemos tirar uma lição da atual crise, é que a coalização partidária que sustenta um governo precisa ser formada a partir de compromissos claros em torno de um programa comum, um projeto nacional baseado no interesse público - o que nem sempre acontece.
Não temos outro caminho senão a profissionalização da gestão pública. O que está longe de significar um governo formado só por burocratas. Até porque um nome técnico não é, necessariamente, garantia de honestidade e correção.
E seria um erro grosseiro associar automaticamente denúncias de corrupção a indicações puramente políticas. A indicação partidária é perfeitamente legítima, desde que feita de modo transparente, atendendo a critérios éticos e de competência técnica.
A atual crise nos leva também a questionar, mais uma vez, o número excessivo de cargos comissionados no setor público. Só o governo federal dispõe de mais de 20 mil cargos de confiança, que dispensam o filtro do concurso público e fazem a festa de muitos apadrinhados por aí.
Na França e na Alemanha, por exemplo, esses cargos não passam de 500.
Reduzir o inchaço da máquina pública não é apenas cortar gastos desnecessários, mas colocar um freio no aparelhamento desmedido do Estado. É permitir um controle mais eficiente da gestão pública.
Mais: apesar do avanço inquestionável na fiscalização e transparência dos gastos públicos, a fragilidade dos mecanismos de controle internos e externos ainda é um problema grave.
Os últimos acontecimentos comprovam a inexistência - ou, pelo menos, a ineficiência - de mecanismos preventivos de controle, capazes de evitar desvios, fraudes e desperdícios.
Desvios e fraudes só têm sido identificados e investigados depois que rios de dinheiro público já foram perdidos. Na verdade, só depois de virarem notícia e crise política.
Quantas crises mais serão necessárias?
Quantas crises mais para nos darmos conta do óbvio?
Ricardo Ferraço O Globo
Porque se é o presidencialismo de coalizão que tem garantido a ampliação da base parlamentar e a governabilidade, é esse mesmo modelo que vem comprometendo a gestão pública, ao abrir brechas para a corrupção e para a ineficiência.
Em nome da governabilidade, optamos por um pragmatismo político que tem esbarrado no limite da irresponsabilidade. A regra geral hoje é o patrimonialismo e o aparelhamento partidário dos cargos de confiança.
É certo que o conflito aberto entre Executivo e Legislativo tem como resultado a paralisia política, com enormes prejuízos para a sociedade. Também não dá para negar a lentidão do processo legislativo - e a governabilidade exige respostas mais rápidas.
Mas nada justifica as negociações nem sempre republicanas que vêm assegurando apoio parlamentar ao governo.
Se podemos tirar uma lição da atual crise, é que a coalização partidária que sustenta um governo precisa ser formada a partir de compromissos claros em torno de um programa comum, um projeto nacional baseado no interesse público - o que nem sempre acontece.
Não temos outro caminho senão a profissionalização da gestão pública. O que está longe de significar um governo formado só por burocratas. Até porque um nome técnico não é, necessariamente, garantia de honestidade e correção.
E seria um erro grosseiro associar automaticamente denúncias de corrupção a indicações puramente políticas. A indicação partidária é perfeitamente legítima, desde que feita de modo transparente, atendendo a critérios éticos e de competência técnica.
A atual crise nos leva também a questionar, mais uma vez, o número excessivo de cargos comissionados no setor público. Só o governo federal dispõe de mais de 20 mil cargos de confiança, que dispensam o filtro do concurso público e fazem a festa de muitos apadrinhados por aí.
Na França e na Alemanha, por exemplo, esses cargos não passam de 500.
Reduzir o inchaço da máquina pública não é apenas cortar gastos desnecessários, mas colocar um freio no aparelhamento desmedido do Estado. É permitir um controle mais eficiente da gestão pública.
Mais: apesar do avanço inquestionável na fiscalização e transparência dos gastos públicos, a fragilidade dos mecanismos de controle internos e externos ainda é um problema grave.
Os últimos acontecimentos comprovam a inexistência - ou, pelo menos, a ineficiência - de mecanismos preventivos de controle, capazes de evitar desvios, fraudes e desperdícios.
Desvios e fraudes só têm sido identificados e investigados depois que rios de dinheiro público já foram perdidos. Na verdade, só depois de virarem notícia e crise política.
Quantas crises mais serão necessárias?
Quantas crises mais para nos darmos conta do óbvio?
Ricardo Ferraço O Globo
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