"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

março 23, 2011

DOIS FATOS REAIS NUMA GRANDE FARSA.



Aquele pobre marciano das inspeções a estranhos fenômenos nacionais veria uma situação política ímpar no Brasil dos últimos dois meses. Há, por aqui, teria anotado, partidos políticos com doutrina, princípios e convenções.

O quadro partidário é amplo, mas isso se deve a nuances imperceptíveis tal a sofisticação das inclinações político-ideológicas dos brasileiros.
Relatório esse que não sobreviveria à farsa por dois minutos.


Logo se daria conta da realidade:
Gilberto Kassab, prefeito de São Paulo, a maior cidade do país, saiu do DEM para fundar o PSD pela mesma razão que uma das maiores críticas desse quesito, Luiza Erundina, ex-prefeita da mesma maior cidade, saiu do PT para ingressar no PSB.


Não foi outra a razão o esperneio do também crítico Gabriel Chalita, que deixou o PSDB para ingressar no PSB; ou que o ex-ministro, ex-governador e ex-candidato a presidente Ciro Gomes deixou a Arena, o PDS, o PSDB, o PPS, para matricular-se no PSB.

Por que um grande grupo saiu do PMDB para fundar o PSDB?
Que razões ideológicas levaram o PT, parte dele à esquerda, vá lá, a admitir a saída de companheiros para fundar o P-SOL?
E a estar agora seriamente ameaçado pela saída do festejado ex-prefeito de Recife, João Paulo?
Por que José Sarney saiu do PDS?
Por que o PT alia-se aos direitistas do PP e do PR e ao sortido PMDB para firmar as bases de sua aliança nacional e recusa esses parceiros em alguns Estados?

troca+troca
A definição de partido político dos dicionários inexiste no Brasil.
Por aqui há o partido-sigla, partido-rótulo, que recebe a entidade-candidato para que se apresente aos eleitores e consiga um mandato.


O resto é fingimento, coreografia em torno de apenas dois fatos reais, concretos e inquestionáveis em toda esta movimentação:
Gilberto Kassab quis sair do DEM, onde não tem mais espaço político, por quinhentas razões, sendo a principal delas a necessidade de armar uma sucessão viável para seu cargo.
Pelo menos estar em um barco que possa navegar em algum rumo, e o DEM é um partido "onde ninguém mais entra".


Se o PSD está ficando robusto, tanto melhor para o líder, mas não era necessário. Poderia ficar apenas normal.
Seu horizonte é 2012, a eleição municipal.
Depois disso já é o tempo real do segundo fato: entra em negociação com as demais letrinhas para tentar um lugar nas eleições de 2014.
Em que situação o PSD vai estar nesse momento é uma construção a se acompanhar daqui para a frente.


Os sinais emitidos agora são isso, apenas sinais, até para dar robustez aos considerandos em torno da sua criação. Uma conversa com o PMDB já houve, logo engavetada tendo em vista a realidade do partido em São Paulo, com seus destinos totalmente amarrados ao PT:
ou há dúvidas sobre o que Michel Temer quer em 2014? Continuar sendo vice-presidente na chapa de reeleição da presidente Dilma Rousseff, claro. Com oito ministérios em lugar dos seis atuais.


Os partidos da aliança, ou os chamados independentes, o que mais querem é desalojar o PMDB dessa posição, para tomar seu lugar, ou não ficarem atados desta forma ao PT para se viabilizarem à presença na mesa principal.

Melhor conversa que a do PMDB o PSD ouviu do presidente do PSB, Eduardo Campos, governador de Pernambuco, que tem um plano estratégico para a ampliação do seu partido e consolidação rumo ao Sul e Sudeste.

Questões de ordem ideológica estiveram ausentes no diálogo de preliminares. E não são obstáculo à ampliação dessas conversas em torno da expansão, nunca foram.
Quando Miguel Arraes foi convidado pelos quatro redatores do manifesto de criação do PSB a assinar seu ingresso no Partido Socialista Brasileiro ele só fez uma perguntinha: "E existe socialista no Brasil?"


Não foi por essa razão que se travou temporariamente a conversa entre Campos e Kassab, nem pela reação dos neossocialistas. A continuidade virá, a seu tempo certo, com certeza mais perto de 2012 e 2014.
O diálogo não se desgasta mais em torno de fusões ou alianças, agora.

À frente, essa conversa encontrará seu tom.

E não há como duvidar que esses dois fatos - o PSD e o PSB - são a grande novidade que surgiu para o futuro próximo.
O PSB não arredou um milímetro de suas intenções e iniciativas.
Considera que aproveitou-se de um momento oportuno, o de definição de Kassab, que tem um eleitorado grande num colégio em que pretende entrar de vez.


A reação principal à expansão do PSB, fora aquelas individualidades que temem concorrência pessoal, está no PT e PSDB.
Incomoda-os o fortalecimento do PSB, sua entrada no Sul e Sudeste. O partido fez, em 2010, seis governadores de Estado, aumentou suas bancadas na Câmara e Senado.
Fora o Nordeste, elegeu o governador do Espírito Santo, Renato Casagrande, o menor Estado do Sudeste. Tem o vice-governador do Rio Grande do Sul, Beto Grill; o prefeito de Belo Horizonte, Márcio Lacerda; o prefeito de Curitiba, Luciano Ducci.


Considera que já tem esses pontos dos quais irradiar uma imagem, reverberar o nome. Seu diagnóstico justifica a estratégia de crescer mais, de se colocar como um partido de dimensão nacional.
Por que não, uma alternativa ao PT, como líder de um projeto de poder, ou uma alternativa a deslocar o PMDB da aliança estratégica com o PT.


Ao PT e PSDB interessa manter a disputa entre os dois, e apenas entre eles.
O PSB deixou, em 2010, de ser nanico, e agora quer ser grande.
E como um partido cresce?
Seus dirigentes aprenderam, na prática, que é levando novos quadros, por suas ideias e sua história, ou por composição, adesão de quadros insatisfeitos em outras legendas.


Interessa ao PSB e ao PSD aprofundar as conversas iniciadas agora com Kassab. Se elas vão prosperar ou não, é algo que só o tempo dirá, porque depende dos chamados "outros atores da cena política".

A presidente Dilma Rousseff, o ex-presidente Lula, o centro de decisões deste governo, foram todos informados sobre tudo, por Eduardo Campos. O PSB não vê como a movimentação de fortalecimento do partido pode desagradar a presidente. É algo que, no mínimo, se for um projeto de sucesso, poderá livrá-la do jugo do PMDB e do PT.

Rosângela Bittar é chefe da Redação, em Brasília. Escreve às quartas-feiras

RECEITA FEDERAL : ARRECADAÇÃO MENSAL CAI 30,1%.

A Receita Federal confirmou ontem o tombo na arrecadação de impostos em fevereiro e a preocupação do governo em relação à fragilidade das contas públicas neste ano. No mês passado, o valor total recolhido em impostos alcançou R$ 64,1 bilhões, recuo real (acima da inflação) de 30,1% em relação à soma registrada em janeiro (R$ 91,8 bilhões).

Ao lado de incertezas sobre a real capacidade de equipe a econômica conseguir reduzir as despesas de custeio ao longo do ano, a fraca arrecadação deve dificultar ainda mais o esforço, equivalente a 3% do Produto Interno Bruto (PIB), para o pagamento de juros da dívida (superavit primário).


A arrecadação em fevereiro manteve, aos olhos do secretário, uma “boa performance”, espelhando o desempenho dos indicadores econômicos de janeiro — a data-base dos impostos recolhidos.
Nesse período, a produção industrial e as vendas medidas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) avançaram 5,78% e 15,21%, respectivamente.


Esse desempenho gerou arrecadação de R$ 14,6 bilhões em contribuições para a seguridade social (Cofins) e de R$ 9,2 bilhões em Imposto de Renda (IR) e contribuição social (CSLL) pelas empresas.
Em volume financeiro, a receita previdenciária foi a mais expressiva. Sozinha, rendeu R$ 19,2 bilhões.


Confusão
Quando confrontado ao mesmo mês de 2010, o montante arrecadado pela Receita no mês passado foi 9,84% superior e, novamente, representou o melhor resultado nessa base de comparação.

Entretanto, para o professor Fernando de Holanda Barbosa Filho, da Fundação Getulio Vargas (FGV), mesmo que se sustente ao longo do ano em patamares superiores ao de 2010, a arrecadação não será suficiente para determinar o cumprimento da meta fiscal do governo.

Para o professor, a promessa de evitar despesas em R$ 50,7 bilhões continua a ser propagada confusamente pelo governo. Em sua opinião, só será possível segurar o valor prometido via corte de investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
“Foi dito que os gastos nesse tipo de projeto não seriam reduzidos.
Não vejo como economizar R$ 50 bilhões só cortando despesas de custeio”, afirmou.


Gabriel Caprioli Correio Braziliense