"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

maio 31, 2011

FRENÉTICA E EXTRAORDINÁRIA : CINCO MESES DE UM VAREJO SEM FIM.


Nos desdobramentos da crise envolvendo o enriquecimento do ministro da Casa Civil, a discussão do momento é sobre o aumento do peso do PMDB no núcleo de poder.

O partido de Michel Temer sente-se confortável para cobrar mais pelo apoio parlamentar, sob ameaça de deixar que alguns de seus senadores tornem a CPI do Palocci uma realidade.

O balcão de negócios do Planalto está a pleno vapor.

Três dos principais jornais destacam hoje a fatura que os pemedebistas estão apresentando ao governo. Para O Estado de S.Paulo, em manchete, "com Palocci fraco, PMDB quer nova articulação política". Segundo a Folha de S.Paulo, o "PMDB cobra mais poder de decisão no governo Dilma". Até o Valor Econômico, que vinha dando menos destaque ao caso, informa, em primeira página, que "Dilma revê coordenação política".

Uma das conclusões em comum é que o PMDB deverá partilhar mais das decisões do governo e Dilma Rousseff irá intensificar os contatos com as lideranças governistas no Congresso. Tudo isso seria decorrência da derrota na votação do Código Florestal, na qual o PMDB não seguiu as ordens do Palácio, e do acirramento das relações ao longo da crise em torno de Antonio Palocci.

Também seria uma forma de reconstruir a abalada autoridade da presidente.

É claro que o governo, qualquer governo, depende de uma boa articulação política para funcionar melhor. Mas, no caso de Dilma, isso é uma dependência química. A inabilidade e a inexperiência políticas da presidente justificam parte das dificuldades. Mas o modo como o condomínio de poder se organiza sob o PT explica muito mais.

Dilma termina hoje o quinto dos 48 meses da sua gestão. Neste período inicial, os governos costumam ser marcados por gestos ousados, pela apresentação dos projetos mais arrojados, pela proposição das mudanças mais significativas para a vida de um país. O que fez o governo da presidente neste sentido até agora?

Não há uma única reforma efetivamente em discussão. Dos principais projetos que tramitaram no Congresso, um trata de assunto corriqueiro na vida da nação - a fixação do salário mínimo - e o outro serviu mais para nos jogar numa encruzilhada do que para apontar novos caminhos - o do Código Florestal. É muito pouco para um governo que se dizia estar "em lua de mel" com o país.

Dilma Rousseff não apresentou, nem parece dedicada a desenvolver, um projeto para o país que tenha força suficiente para galvanizar apoios no Parlamento e na sociedade. É um governo dedicado à administração cotidiana da burocracia, à política miúda, ao curto prazo. Um governo de um varejinho sem fim.

Para funcionar, governos com esta natureza dependem fundamentalmente do "é dando que se recebe". O balcão do fisiologismo tem de estar aberto diuturnamente. A articulação política que Dilma promete azeitar doravante se presta a garantir que estas engrenagens funcionem melhor - o que não significa que tenham parado de funcionar um instante sequer.

A intervenção de Lula na semana passada serviu justamente para reafirmar a prevalência dos princípios fisiológicos no condomínio gerido por Dilma sob a tutela do ex-presidente.

Ele veio lustrar o balcão. Fica muito evidente que esta é a regra que vale para os governos do PT. Basta agirem assim, para saírem sorridentes nas fotos...

A assessoria da presidente cuida de disseminar que a atuação de Lula "desagradou" Dilma.

Bobagem.

A intervenção é parte do jogo que ela aceitou jogar, mas não estava tendo habilidade para conduzir. A interferência do ex-presidente serviu para apaziguar os ânimos e garantir que os canais não serão obstruídos - pode-se imaginar o que flui por intermédio deles.

A correria do governo para atender prontamente os comensais do PMDB e da base aliada também sugere a pouca confiança nas explicações dadas pelo ministro da Casa Civil sobre o crescimento exponencial da sua fortuna. Busca exorcizar investigações, mas a crise está longe de acabar - o Valor chega hoje a cogitar nomes de possíveis sucessores de Palocci: Fernando Pimentel, Paulo Bernardo e Alexandre Padilha.

Pode ser que o Planalto aposte que, no fim das contas, o episódio sobre o enriquecimento suspeito de Antonio Palocci não passe de um "acidente", como aliados do PT do quilate de José Sarney já consideram ter sido o impeachment de Fernando Collor.

No fundo, a intenção acaba sendo esta mesma:

igualar todos.

Por baixo.

Fonte: ITV

CENÁRIO OFICIAL PIORA, INFLAÇÃO ELEVA PESSIMISMO E CALOTE AUMENTA PELO SEXTO MÊS CONSECUTIVO.

O Ministério da Fazenda passou a esperar mais inflação e menos crescimento.
A equipe de Guido Mantega reduziu para 5,1% por ano sua estimativa para a expansão da economia no mandato da presidente Dilma Rousseff.

Até março
, os técnicos trabalhavam com uma projeção média de 5,9% para o período de quatro anos (2011-2014).


A moderação da atividade após o avanço de 7,5% no Produto Interno Bruto (PIB, a soma das riquezas geradas) em 2010 ocorrerá como resultado do aperto fiscal e da elevação dos juros promovidos pelo governo.
E garantirá um crescimento sem descompasso entre oferta e demanda, afirmou a Fazenda em boletim de conjuntura divulgado no site do ministério.

Para este ano, a estimativa de crescimento caiu de 5% para 4,5%, em consonância com o prognóstico usado na última revisão de receitas e despesas orçamentárias. Para 2012, a projeção passou de 5,5% para 5%. Nos dois anos seguintes, de 6,5% para 5,5%.

“Os primeiros dados de 2011 sobre a atividade econômica ainda não mostram de maneira clara o ritmo dessa desaceleração esperada, por causa das defasagens envolvidas nas medidas adotadas e também em virtude das mudanças estruturais em andamento na economia brasileira”, assinalou o ministério no documento “Economia brasileira em perspectiva”.

Diante da perda do poder de compra do real, o governo passou a trabalhar com projeções maiores para a inflação. Neste ano, a previsão passou de 5% para 5,6%. Em 2012, de 4,5% para 4,6%. Em nenhum dos cenários, a carestia fica exatamente no centro da meta, que é de 4,5%.

Para evitar um descontrole, a equipe econômica conta com o aumento da taxa de investimentos de 18,4% no ano passado para 19,5% — a previsão para 2011, antes, era de 20,5%. A expansão, embora num ritmo menor do que o imaginado, deve facilitar o aumento da oferta de produtos, ajudando no combate aos preços altos.


Inflação eleva pessimismo

Mariana Mainenti
Céticos quanto às medidas de ajuste do governo, 71% dos brasileiros acreditam que os preços vão continuar a subir até o fim do ano

A inflação persistente ao longo dos últimos meses fez com que o brasileiro atingisse o seu nível máximo de insatisfação com a carestia em quase 10 anos. Pesquisa da Confederação Nacional da Indústria (CNI) aponta que 71% dos consumidores acreditam que os preços continuarão subindo até o fim do ano.
O pessimismo dos entrevistados revela um descrédito nas medidas adotadas pelo governo até agora para conter o dragão.

Embora as autoridades venham se empenhando em fazer declarações tranquilizadoras sobre o controle inflacionário, o que está determinando a opinião pública é mesmo o dinheiro que começa a faltar no bolso e os itens básicos que já precisam ser retirados do carrinho de compras no supermercado.

Juros ao consumidor disparam

Taxa do cheque especial alcança 178,1% ao ano, o nível mais elevado desde 2003. Índice de calote aumenta pelo sexto mês consecutivo

Sem capacidade financeira para obter empréstimos mais baratos, os brasileiros estão recorrendo ao cartão de crédito e ao cheque especial, que cobram as maiores taxas de juros do mercado, entre 8,9% e 11% ao mês, para honrar suas despesas.

Em abril, as famílias rolaram R$ 20,6 bilhões em débitos nos cartões, por meio do crédito rotativo e do parcelamento das compras
.


O montante representa aumento de 6,7% em relação a março deste ano e de 21% sobre abril do ano passado, que foi um período de intenso consumo. Mesmo tendo uma queda de 4,7% ante março, a rolagem de dívida no cheque especial em abril atingiu R$ 23,7 bilhões, maior patamar desde março de 2010.

Correio Braziliense

IMPOSTURÔMETRO : A liderança inventada e projetada pela cabeça do "cachaça", só tem o alcance de um simulacro e se desfez no primeiro apagão.

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Em 1928, no México, foi assassinado o presidente eleito Álvaro Obregón. O assassinato gerou grave turbulência política. Obregón já tinha exercido a Presidência nos anos 1920-1924. A Constituição de 1917 proibia a reeleição mas não o retorno ao poder após um interregno.

O presidente em exercício, Plutarco Elias Calles, administrou a crise, elegeu outro sucessor e se transformou no dirigente de fato nos anos 1928-1935.

Esse período da história mexicana ficou conhecido como "maximato", ou seja, Calles, considerado o "chefe máximo da revolução", era o dirigente de fato do governo. Este domínio terminou quando Lázaro Cárdenas, seu afilhado político, eleito presidente em 1934, no ano seguinte rompeu com seu mentor.

A crise do governo Dilma Rousseff e o retorno de Lula ao primeiro plano da cena política nacional é o nosso maximato. Lula teve de assumir o posto de presidente de fato, pois a presidente perdeu o controle da situação.

Era esperado que isto fosse acontecer mas não tão cedo, com menos de cinco meses de governo. A inexperiência política da presidente era sabidamente conhecida. Antes de 2003, nunca tinha exercido qualquer cargo de importância nacional.

Desconhecia os meandros de Brasília, além de não saber negociar, conviver com a diferença e com opiniões contrárias. Foi formada em outro mundo e outra época. Para ela, ainda deve valer o centralismo democrático, a forma stalinista de administrar, que trata qualquer opinião contrária como crime ou traição.

Quando foi ministra das Minas e Energia, ou mesmo na Casa Civil, pouco fez política. Outros ministros exerceram esse papel ou o próprio presidente Lula foi o articulador do governo. Sabedor desta dificuldade, Lula escolheu a dedo o chefe da Casa Civil. Antonio Palocci seria uma espécie de primeiro-ministro e encarregado dos contatos políticos com o Congresso Nacional e com os representantes do grande capital.

Contudo, Palocci se encastelou no governo e pouco apareceu. De início foi considerado que era uma atitude de esperteza política, que estava articulando nas sombras.

É a velha prática brasileira de encontrar qualidade onde há nulidade.

O silêncio de Palocci foi entendido como estratégia e não como a mais perfeita tradução de alguém que não tem a mínima capacidade para o exercício do cargo. E para piorar surgiram as denúncias das consultorias pagas a peso de ouro.

A confusão ficou maior quando a articulação no Congresso Nacional demonstrou sua fragilidade. O pesado líder do governo deixou de realizar o papel de elo entre a base e o Planalto.
Ficou cuidando dos seus interesses partidários.
O ministro da Articulação Política é absolutamente inexpressivo (a maioria dos parlamentares sequer sabe o seu nome).

Dada a sua fragilidade, estranho é que tenha demorado tanto tempo para que ruísse o esquema político organizado por Lula no final do ano passado.

O mais curioso é que a crise nasceu no interior do próprio governo. Ou seja, não foi provocada em nenhum instante pela ação oposicionista. A oposição continua desarticulada, politicamente dividida e omissa. A divisão ficou mais uma vez demonstrada na convenção do PSDB.

O governo até recebeu um alento, pois a reeleição de Sérgio Guerra à presidência do partido indica que a oposição peessedebista continuará tímida, quase envergonhada, sem representar perigo. O Brasil desafia a teoria política:
para o governo, o problema não é a oposição mas o próprio governo.

Como contentar o PMDB?
Cedendo espaço na máquina governamental que possibilite bons negócios. Rentáveis para efeito privado e péssimos para o interesse público.
O governo postergou, até o momento, a partilha do butim, não pela defesa da moralidade pública. Longe disso.
Está testando o partido para ver até que ponto é possível negociar.
Outra dificuldade é o relacionamento com o grande capital.

Aí é briga para gente grande.
Não é meramente para controlar alguma licitação de compra de remédios ou de alguma estrada. Representa desenhar o futuro econômico do país, estabelecer o relacionamento dos fundos de pensão com as grandes empresas e bancos, apontar para onde deve seguir o processo de acumulação capitalista.

É uma disputa dentro do PT.
O antigo partido socialista hoje é o partido das grandes corporações. Daí o número de consultores petistas.
De uma hora para outra, todos viraram especialistas em capitalismo.

O mais estranho é que o país segue seu ritmo normal.
Como se voasse com piloto automático. Até certo ponto, a economia vai bem. Segue no vácuo do que já foi feito.
Isto tem um limite.
Já está no momento de traçar novo rumo.
Mas como iniciar esta discussão se o governo mal consegue administrar suas contradições?

Dilma vai precisar demonstrar que comanda.
Pura encenação.
Coisa de ópera bufa.
Nos próximos dias assistiremos à presidente em várias reuniões.
Veremos também (ah, a importância das imagens...) ela, séria, numa reunião ministerial; sorrindo, quando encontrar a liderança do PMDB.
Mas a crise vai continuar.
Palavras não substituem as ações.

E Lula?
Depois que reassumiu informalmente o governo, vai permanecer como o poder atrás do trono. Não vai se imiscuir nas questões do varejo político.
Vai atuar no atacado, valorizando (como gostaria de dizer nas suas célebres metáforas futebolísticas) o seu passe.

E preparando calmamente o seu retorno ao Palácio do Planalto.
Já deve ter jornal preparando a edição especial do dia 1º de janeiro de 2015.

A manchete?
Também já está pronta.
Em letras garrafais, no alto página, estará escrito:
"Ele voltou."

Marco Antonio Villa O Globo