"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

junho 26, 2014

DESAVERGONHADA/"GERENTONA"/"FAXINEIRA"... Palavra dada é palavra empenhada


Dilma Rousseff é bastante coerente no que diz. Já se apresentou aos brasileiros como gerentona, como faxineira e, mais recentemente, se disse firme na decisão de não ceder a chantagens partidárias e recusar-se a mexer em sua equipe em troca de apoio eleitoral. 
Em todos os casos, manteve a linha: 
não cumpriu nada a que se propos. 
Percebe-se agora que o que vale não é a palavra empenhada, mas a disposição de vender a alma ao diabo pela vitória.

Dilma Rousseff é uma pessoa de palavra.
Quatro anos atrás, apresentou-se ao eleitorado como gerente gabaritada. 
Eleita, correu para vestir uniforme de faxineira. 
Há algumas semanas, assegurou que não mudaria sua equipe ministerial apenas em troca de alguns minutinhos a mais no rádio e na TV. 
As circunstâncias e o figurino podem mudar, mas Dilma Rousseff mantém a coerência: 
não cumpre nada do que fala.
Dilma havia dito há algum tempo que “faria o diabo nas eleições”. 
Mas, vê-se agora, é muito mais que isso: 
a candidata-presidente está disposta mesmo é a vender a alma ao diabo. 
Os lances mais recentes da montagem do palanque reeleitoral são pródigos neste sentido. No balcão de negócios, o céu é o limite.
A presidente da República trocou ontem mais um de seus ministros para assegurar o apoio de mais um partido à sua elástica coligação eleitoral. 
Dilma dissera que estava muito satisfeita com César Borges no Ministério dos Transportes – e, convenhamos, pelo histórico de inoperância da pasta na era petista ele até vinha bem – e jamais o tiraria do cargo.

A palavra dada pela presidente, contudo, não foi honrada. 
O partido do ministro, o PR, cobrou a substituição de Borges e Dilma prontamente atendeu. Entregou sua cabeça e trouxe de volta para o cargo o mesmo ministro afastado há menos de 15 meses. Se isso não é ser coerente, o que mais pode ser? A Borges, restou a Secretaria dos Portos como prêmio de consolação.

Em 2011, o mesmo partido e o mesmo Ministério dos Transportes estiveram no centro da “faxina” – aquela em que a sujeira é varrida para baixo do tapete – promovida pela presidente. Se havia alguma dúvida do artificialismo do figurino ético de Dilma, não remanesce nenhuma mais. Na alça da mira agora estão a diretoria-geral do Dnit e o comando da Valec, também num movimento de desfazer a limpeza que, embora timidamente, fora feita.
A coerência administrativa da presidente ao nomear sua equipe é de dar gosto. Basta lembrar, também, o que aconteceu no Ministério da Pesca três meses atrás. Lá o ministro que não sabia o que era uma minhoca deu lugar a seu suplente no Senado, um teólogo e jornalista que, possivelmente, não faz ideia do que seja pescar com caniço e samburá.

Em todos estes episódios, salta aos olhos a falta de autoridade da presidente e sua total ausência de controle e critérios para compor uma equipe. Já não bastassem os maus resultados que ela tem a exibir em termos de obras e realizações, cabe a pergunta: 
Que espécie de gerentona eficiente é esta?

No seu vale-tudo pelo poder, o PT faz uso de suas armas mais típicas, como a também odienta caça aos que ousam não compactuar com os planos eleitorais do partido. O Globo noticia hoje que o Planalto foi em busca dos nomes de cada um dos prefeitos do PMDB fluminense que hipotecaram apoio a Aécio Neves. Para que será?

Pego no flagra, o ministro de Relações Institucionais disse que pretendia apenas convidá-los para um convescote no Planalto. “Prefeito, quando você chama para almoçar, para conversar sobre algum assunto, ele vem. Isso é do jogo”, disse Ricardo Berzoini, de notáveis atuações no submundo da guerrilha petista em eleições passadas. 
Não parece um fidalgo?

A uma presidente sem autoridade e com um currículo de parcas realizações para mostrar ao eleitorado como justificativa para merecer um novo mandato, junta-se um partido disposto a tocar o terror para vencer as eleições e perpetuar-se no poder. Nem com todos os arranjos e malandragens do mundo isso vai dar certo. 
O vale-tudo tem limite.
Este e outros textos analíticos sobre a conjuntura política e econômica estão disponíveis na página do Instituto Teotônio Vilela

E ENQUANTO ISSO... PETROBRAS/EXPECTATIVA E PETEBRAS REALIDADE : Mais reservas, menos caixa ou Reserva é o que não falta, extrair o petróleo é que são elas


Do ponto de vista econômico é importante reforço para a Petrobrás, como disse a presidente Graça Foster. Já dispunha de 16 bilhões de reservas medidas, outros 16 bilhões de reservas prováveis e terá à disposição mais 15 bilhões. Reserva é o que não falta. 
Tirar o petróleo de lá é que são elas.

O custo imediato é a cobrança de um bônus de R$ 15 bilhões, em parcelas anuais até 2018. Neste ano, a Petrobrás deverá recolher ao Tesouro R$ 2 bilhões, quantia que deverá reforçar o superávit primário (sobra de arrecadação para pagamento da dívida) do governo federal.

Alguma engenharia financeira já estava sendo esperada porque era preciso fechar um acordo sobre a tal cessão onerosa. 
(Só para quem não acompanhou esse assunto, cessão onerosa é o petróleo da União que já foi transferido à Petrobrás como parcela da União no aumento de capital realizado em 2010. Corresponde a 5 bilhões de barris de petróleo futuro.)

Para a exploração do petróleo da cessão onerosa, a União cedeu o Campo de Búzios (antiga área de Franco), no pré-sal da Bacia de Santos. 
No entanto, Búzios, mais o entorno, revelou muito mais, um total recuperável próximo dos 20 bilhões de barris (5 bilhões da cessão onerosa mais 15 bilhões da nova concessão). Embora a produção regular dessa área só deva começar em 2021, a Petrobrás não poderia equacionar seus investimentos sem conhecer as condições de exploração do campo ou do que excedesse os tais 5 bilhões de barris. 

O especialista em Petróleo Adriano Pires estima que os investimentos necessários para desenvolver apenas essa nova área sejam de US$ 245 bilhões a US$ 380 bilhões.

O maior complicador é que a Petrobrás, que mal vai dando conta do que já tem de fazer, não dispõe dos recursos para investir em mais esses campos. 
Sua capacidade de endividamento (alavancagem) chegou ao limite. A saída seria aumentar o capital. Como tem créditos a receber da Petrobrás e como tem direitos sobre o petróleo futuro (os mesmos que serão produzidos no regime de partilha), a União poderia subscrever sua parte sem tirar recursos do cofre. Bastaria transferir esses recursos futuros ao capital da Petrobrás, como aconteceu por ocasião da cessão onerosa.

O problema está na parcela a ser subscrita pelos demais acionistas, ou dos detentores dos outros 53,9% do capital. Em princípio, ninguém vai colocar nem mais um centavo em capital novo da Petrobrás se continuarem a prevalecer as atuais regras que mantêm achatadas as tarifas dos combustíveis, que estrangulam o caixa da Petrobrás e que a impedem de encontrar sócios para as refinarias que terão de ser construídas.

Já se espera certa descompressão das tarifas, mas é altamente improvável que seja anunciada antes das eleições. E mesmo se for anunciada depois, é preciso ver antes quem vai conduzir o próximo governo e que política reservará à Petrobrás e à política do petróleo.

A entrega de mais essa área exploratória para a Petrobrás exigirá outras medidas complementares. Enquanto não forem conhecidas não dá para avaliar adequadamente sua qualidade. 

CONFIRA:

Estatização?

Nesta quarta-feira o mercado financeiro temeu manobra do governo para estatizar de vez a Petrobrás. Seria decidido forte aumento de capital para garantir os investimentos na área de Búzios. O Tesouro subscreveria sua parte com os tais créditos ou com direitos a petróleo futuro (como está explicado acima). O acionista minoritário não aceitaria subscrever o que lhe coubesse, porque não concordaria com as atuais condições. Assim, o Tesouro teria de assumir a subscrição das sobras. O resultado seria a diluição da participação do setor privado no capital da Petrobrás.

E o caixa?

Essa manobra aumentaria o capital da Petrobrás, mas não resolveria seu grave problema de caixa, mesmo com a melhora da sua capacidade de endividamento proporcionada pelo aumento patrimonial. Ou seja, mesmo se o governo decidisse aprofundar a participação do Tesouro no seu capital, seria necessário municiar a Petrobrás com dinheiro vivo e evitar novos laudos negativos das agências de classificação de risco.

Celso Ming 

Estadão