"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

agosto 12, 2012

E NO... PARA O brasil SEGUIR "MUDANDO" COM A GERENTONA : CADÊ O DINHEIRO QUE ESTAVA AQUI ?

O crescimento do Brasil em ritmo mais lento e as intervenções do governo na economia - como nas margens dos bancos, na valorização do câmbio e na taxação da renda fixa - foram um balde de água fria na euforia dos investidores estrangeiros.

Com uma contribuição da crise europeia, o dinheiro trazido por esses investidores - de fundos de investimento e fundos de pensão até fortunas de famílias e de empresas - para a compra de ações e títulos de renda fixa no país encolheu 40% no primeiro semestre, frente ao mesmo período de 2011:
de US$ 12,4 bilhões para US$ 7,5 bilhões, segundo dados do Banco Central (BC).


Para os grandes bancos de investimento, o Brasil que ilustrou a capa da revista inglesa "The Economist", em novembro de 2009, com o Cristo Redentor literalmente decolando, ficou sem combustível.

Ou "Lento e sem medalhas", como classificou o banco americano Morgan Stanley em relatório na semana passada. Se havia euforia demais, o pessimismo agora se tornou extremo.

- O investidor está sempre de olho nas regras do jogo.
E houve mudança de regra, como na atuação do governo no câmbio, o que corroeu o ganho dos estrangeiros. Isso afeta o humor do mercado - afirma o americano Alexander Gorra, estrategista-chefe do BNY Mellon ARX, a gestora do banco de Nova York.


- Quando o estrangeiro olha o Brasil, ele olha de maneira relativa. A curto prazo, o país cresce menos.

E assim, os fundos globais de ações dedicados ao Brasil sofreram saques de US$ 1,5 bilhão neste ano por seus cotistas. Os fundos de ações tiveram resgates de US$ 1,4 bilhão, e os de títulos, de US$ 100 milhões.

Os dados são da consultoria americana EPFR Global. Cameron Brandt, analista da consultoria, diz que os investidores têm "agressivamente" sacado do Brasil.


- O país é visto como uma peça da demanda chinesa por produtos básicos. E a economia chinesa está desacelerando - avalia Brandt.


México atrai capital brasileiro

Uma das maiores gestoras globais de recursos, a Franklin Templeton viu investidores sacarem recursos de seus fundos de ações dedicados ao Brasil, oferecidos exclusivamente na Coreia do Sul e Japão, conta Marco Freire, chefe de Investimento da área de renda fixa e multimercados.

- No mercado de ações, essa preocupação tem origem na desaceleração do Brasil e no ceticismo do mercado sobre a intervenção do governo em setores como o bancário e na própria Petrobras, no caso dos combustíveis - diz Freire. - Isso somou-se ao cenário externo ruim, o que afasta investidores de aplicações de risco.

A Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) registra saídas de estrangeiros há quatro meses. São R$ 3,6 bilhões a menos na Bolsa brasileira desde maio passado. O Ibovespa, principal índice de ações do país, apresentava na sexta-feira uma queda de 4,15% em dólares no ano.

Segundo gestores de recursos, o temido tsunami monetário não passou pelo Brasil. O capital estrangeiro buscou outros emergentes, que crescem mais. Chamado de "novo Brasil" por uma parte do mercado, o México é um dos destinos desse dinheiro.

A Bolsa de Valores mexicana avança 17,03% este ano, em dólares, no embalo do setor manufatureiro e de uma lua de mel entre investidores e o novo governo do país.

O diretor de Pesquisa para Emergentes do banco japonês Nomura, Tony Volpon, diz que clientes americanos e japoneses estão trocando o Brasil por apostas no México.

- O crescimento do Brasil apoiado em commodities valorizadas e aumento de consumo não vai sustentar uma expansão do país em 4% ao ano, como aconteceu na média dos últimos anos. O potencial de crescimento é menor do que se imaginava. É preciso fazer reformas e investir mais - afirma Volpon. - O mercado financeiro segue o sucesso.

E, nesse momento, a economia do Brasil tem tudo, menos isso.

Além do México, Indonésia, Coreia do Sul e Turquia também entraram no foco do mercado. E, claro, esses países foram agrupados e ganharam um nome:
Mist, algo como "névoa" em inglês.

O autor do acrônimo é Jim O"Neill, economista do banco Goldman Sachs que também criou o termo Brics, grupo de emergentes formado por Brasil, Rússia, Índia e China. A África do Sul foi mais tarde integrada ao grupo.

Volpon frisa, contudo, que o desalento de investidores não se resume ao "B" dos Brics.

- A China vive um processo de desaceleração econômica; a Índia sofreu recentes apagões de energia elétrica; a Rússia passou por eleições questionadas internacionalmente. Os Brics ficaram, em geral, menos atraentes.

Para os ex-presidentes do Banco Central Arminio Fraga e Gustavo Franco, os investidores estrangeiros exageram em suas avaliações. Segundo Arminio, sócio da gestora Gávea Investimentos, o Brasil passa por uma "desaceleração cíclica e influenciada pela crise europeia". Para ele, no entanto, "nada mudou aqui".

- O que mudou foi a percepção externa, que foi de muito otimista para muito pessimista - avalia Fraga. - O Brasil vai bem, mas tem desafios para sustentar um crescimento mais elevado: investir mais, educar melhor.

Gustavo Franco, sócio da Rio Bravo, usa a mesma analogia da capa da "Economist" para criticar os excessos.

- O Cristo nunca teve turbinas, jamais decolaria, tampouco se desfaria como no filme "2012". Nesses termos, a normalidade do ciclo econômico fica parecendo uma alternância esquizofrênica entre céu e inferno - diz.

Nessa esquizofrenia, o Investimento Estrangeiro Direto (IED), destinado à atividade produtiva, caiu 8,5%, para US$ 29,7 bilhões entre os semestres. O fluxo segue acima da média dos últimos anos.

Bruno Villas Bôas e Gabriela Valente O Globo