"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

setembro 13, 2010

EM FEITIO DE EXCEÇÃO .


Posta em xeque no cotidiano, a democracia é discutida como se não fosse valor absoluto

Um quarto de século de retomada da normalidade institucional em tese seria tempo suficiente para a democracia ter sido incorporada à cena nacional com a naturalidade das coisas que simplesmente "são".

Como água encanada e luz elétrica.

Na prática, porém, não tem funcionado assim:
temos discutido muito a democracia no lugar de exercê-la sem discussão, o que seria muito mais natural.
Depois de reconquistada a democracia a impressão que dá é que o País não sabe direito o que fazer com ela.

A questão continua em aberto como ainda nos faltasse, fosse uma meta a ser alcançada, uma cidadela em permanente risco.

Comparemos, para efeito de raciocínio, com a estabilidade econômica.

Tem dez anos a menos e já saiu da agenda para entrar no campo dos consensos. Daqueles arraigados aos quais não há quem ouse agredir sob pena de perder a batalha na sociedade, de tão consolidado que está o conceito.

Não se observa produção robusta e recorrente de pregações sobre os benefícios da estabilidade e a necessidade de preservá-la.

Ela "é" e ponto final. Auto-explicável, auto-aplicável, compreendida e absorvida. Com a democracia não se deu essa incorporação.

A despeito da existência de todos os sinais exteriores de pleno funcionamento do regime de liberdades, garantias, direitos, deveres individuais e coletivos a ponto de inibir quaisquer gestos contraditórios, fala-se tanto dela que mais parece exceção.

E se assim parece é porque assim acontece na realidade. A democracia entre nós é adjetivada.

É posta em xeque no cotidiano, nos Poderes e segue sendo discutida como se não fosse valor absoluto, mas princípio relativo, mutante, manipulável, adaptável ao sabor das circunstâncias, ao grau de consciência e à qualidade de caráter dos governantes.

Recentemente chamou atenção a criação do Instituto Palavra Aberta.
Função?
Defender a democracia, a livre iniciativa e a liberdade de expressão. Se há necessidade defendê-la de forma explícita então faz sentido reafirmá-la constantemente.

Essa evidência é em si a confirmação de como pode vir a ser fragilizada, principalmente quando e se à frente de ações que favorecem o enfraquecimento está o Estado.

Hoje em dia traduzidas nas deformações dos Poderes Executivo e Legislativo, um hipertrofiado e outro atrofiado em seus respectivos papéis na República.

Dois cientistas políticos, integrantes do topo de linha do pensamento nacional ativo (em contraponto à ala inativa por iniciativa própria), os professores José Augusto Guilhon Albuquerque e Leôncio Martins Rodrigues compartilham a certeza de que nos últimos anos está em curso um processo de ruptura de valores que precisa ser combatido.

A mesma pergunta foi feita para ambos:
Por que falamos tanto em democracia?

Guilhón Albuquerque divide a questão em duas.

Uma conceitual, "a ideia de democracia e seus valores"; e outra real, "a democracia realmente existente sob um Estado de Direito operante".

Sobre a primeira, ele acha que precisa mesmo ser reiterada constantemente de "geração em geração" em toda parte, nos meios de comunicação, nas escolas, nas famílias e nos partidos.

Ressalta, no entanto, que os partidos nem sempre dão bons exemplos. "Neste período eleitoral, parcialmente por liberalidade com partidos sem expressão e, portanto, sem responsabilidade com o eleitorado, assistimos diariamente a pregações raivosas e desqualificações debochadas contra os valores democráticos."

Quanto ao que chama de "Estado de Direito realmente existente" - aquele em que "instituições e mecanismos de equilíbrio de poder repõem continuamente a ordem democrática cada vez que a desordem, a opressão e o abuso de poder tentam rompê-la" - Guilhón vê sérios problemas.

"O que estamos vivendo nesses oito anos, muito lentamente no início e com enorme aceleração nos últimos meses é um processo de ruptura das instituições e dos mecanismos de equilíbrio de poder que vêm perdendo pouco a pouco a credibilidade e a própria capacidade de repor a ordem democrática".

Nessa hora, o que fazer?
"Em momentos como esse a democracia precisa desesperadamente de democratas com caráter, que não chegam a ser uma legião."

Leôncio Martins esboça várias hipóteses - nenhuma delas excludente - para explicar porque o debate sobre a questão democrática tem se acentuado ultimamente.

Primeira hipótese:

"O avanço do populismo que menospreza regras do jogo e entende que maiorias, sempre eventuais, podem tudo."

Segunda:

"Quem entende democracia como um governo representativo regido por leis tem motivos para temer as consequências de uma concentração excessiva do poder nas mãos de uma nova elite política de classe média assalariada (incluindo a aristocracia operária) que começou a ascender no fim do regime militar. A elite lulista joga pesado para manter o domínio do Estado e os cargos no governo, porque não querem voltar para os antigos empregos, nos sindicatos ou fora deles."

Terceira hipótese:

"Para a atual oposição, não se trata apenas do "temos de ficar mais algum tempo fora do governo", mas de ser colocada numa situação semelhante à que viveu no passado a oposição sob Perón, Getúlio e agora sob Chávez e Evo Morales. Ou seja, o fim do rodízio no governo."

Quarta:

"Inegavelmente há certos aspectos do comportamento dos ex-plebeus que dá razão à inquietação dos setores liberais: o viés estatizante, o nacionalismo, a reconstrução do aparato sindical getulista, a aproximação entre o capital privado e o aparelho estatal, as tentativas de controle da imprensa, a rejeição da democracia representativa (por parte da esquerda petista), os níveis nunca alcançados de corrupção."

Quinta hipótese:

"A existência de um partido de massas disciplinado, dotado de incomparável vocação para o poder, disposto a colonizar o Estado."

No começo do artigo registro quase estranheza com tanta discussão sobre democracia.

No fim, constato:
há razões de sobra.


Dora Kramer O Estado de S. Paulo

SERASA EXPERIAN : AUMENTO DA INADIMPLÊNCIA TEM PIOR AGOSTO DESDE 2005

A inadimplência do consumidor no Brasil cresceu 11,5% em agosto na comparação com o mesmo período do ano passado, segundo dados da Serasa Experian.

O resultado é o pior registrado em um mês de agosto desde 2005.

Segundo análise da Serasa Experian, o resultado se deve ao fato de o consumidor ter aproveitado a Copa do Mundo para comprar produtos de maior valor agregado, o que fez com que suas dívidas crescessem a ponto de não conseguirem pagá-las em dia.

Em relação a julho, houve alta de 1,8% na inadimplência - as dívidas com cartões de crédito e financeiras foram as principais responsáveis por esse crescimento, com alta de 5,9% no período.

No acumulado do ano, o índice subiu 0,2% na comparação com os oito primeiros meses de 2009.

Da Redação, em São Paulo

OCDE : EXPANSÃO ECONÔMICA DO BRASIL DÁ SINAIS DE PERDA DE FÔLEGO.

O Brasil começa a dar “sinais mais fortesde que sua expansão econômica está perdendo o fôlego e já pode ter atingido o seu pico, afirma a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), em um estudo divulgado nesta segunda-feira.

No relatório sobre o Indicador Composto Avançado (ICA, LCI na sigla em inglês), a organização também afirma que a desaceleração no ritmo de crescimento nos próximos meses é observada de maneira mais forte na maioria dos países ricos.

O ICA analisa mensalmente as tendências econômicas para os próximos seis meses.

“No Canadá, na França, na Itália, na Grã-Bretanha, na China e na Índia, uma desaceleração no ritmo de crescimento para os próximos meses é verificada de maneira mais forte em relação ao último estudo”, diz a OCDE.

“Sinais mais fortes também emergiram no Japão, nos Estados Unidos e no Brasil, mostrando que a expansão pode perder o fôlego”, afirma o relatório.

Para os cálculos do ICA, a OCDE se baseia em diferentes indicadores econômicos de curto prazo ligados ao PIB, como a produção industrial.

O nível de 100 pontos é utilizado como referência para classificar a intensidade da atividade econômica dos países.

Os países que sofreram queda em relação ao último estudo e ficaram abaixo de 100 pontos recebem a classificação de “desaceleração”.

Os que também tiveram diminuição do índice, mas permaneceram acima da barreira de 100 pontos, são considerados como em “leve desaceleração”.

Abaixo do patamar

Dos 31 países da OCDE e quatro grandes economias emergentes analisados no estudo, o Brasil é o único que ficou abaixo do patamar de referência de 100 pontos.

O ICA do Brasil em julho, divulgado nesta segunda-feira, foi de 99,4 pontos, registrando uma diminuição de 0,8 ponto em relação ao de junho, anunciado em agosto.

A queda do ICA brasileiro é também a maior entre os países analisados.

Mas na comparação com os últimos 12 meses, o indicador do Brasil registra um aumento de 4,3 pontos, o que levou a organização a definir a expansão da atividade econômica brasileira como tendo “possivelmente atingido o pico”.

Na zona OCDE, o ICA diminuiu 0,1 ponto em julho, totalizando 103,1 pontos e a expansão da economia também atingiu possivelmente o ápice, diz o estudo.

Após o Brasil, a segunda maior queda do Indicador Composto Avançado foi da China, que perdeu 0,4 ponto, totalizando 102,1 pontos.

Mas, na comparação anual, a China registra diminuição de 0,1 ponto.

Daniela Fernandes/De Paris para a BBC Brasil

COM A "COISA" : RETORNO DA CPMF CAMUFLADA DE CSS, ESTE SERÁ O BRASIL QUE CONTINUARÁ "CRESCENDO" EM 2011. SÓ PRA COMEÇAR.

A CPMF é um cadáver insepulto.

Quando se julgava que, depois da sua rejeição por parte do Congresso no final de 2007, ela estaria morta e enterrada, eis que o tema ressurge, agora sob a denominação de "Contribuição Social da Saúde" (CSS), que foi rapidamente batizada pelos críticos como "Contribuição Sem Sentido".

É importante que haja uma pressão que evite que essa contribuição seja ressuscitada.

Não nos enganemos:

os sinais estão aí.

A possibilidade de recriação dessa figura tributária vem sendo aos poucos recolocada.

Nas críticas recentes lançadas contra a extinção da CPMF no final de 2007, imputando à decisão a responsabilidade pelas dificuldades do setor de saúde, os sintomas de que há um caldo de cultivo para reinserir o tema na agenda são perceptíveis para os olhares acostumados a perceber os movimentos políticos com antecedência.

Na economia, como na vida, o que está certo numa época, pode não estar em outra. Foi correto defender a CPMF no governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) naqueles dias difíceis de 1999, quando o tributo foi essencial para o ajuste fiscal da época.

Da mesma forma, já no governo Lula, foi fundamental conservar inicialmente a contribuição, em 2003, quando o país ainda não podia se dar ao luxo de abrir mão de uma receita de 1,5% do Produto Interno Bruto (PIB) em um contexto em que as incertezas acerca da trajetória da dívida pública ainda não tinham se dissipado.

Hoje, porém, os tempos são outros.

Não temos que implementar um ajuste fiscal intenso em perspectiva - como em 1999 - nem que enfrentar a ameaça de que a receita despenque sem a CPMF - como no debate de 2003 - uma vez que a CPMF já não é cobrada há anos.

No debate sobre o tema existem duas razões que vêm sendo citadas em defesa do retorno da contribuição - agora CSS - e o elemento comum das duas é que nenhuma é verdadeira.

Vejamos quais são:

1)

A "desproteção da saúde".

O argumento é que, ao ser extinta a CPMF, a saúde, legalmente, teria ficado sem fonte de custeio.

A tese é formalmente errada, por uma razão simples: o financiamento da saúde independe da contribuição.

O que a Constituição estabelece é que as despesas da saúde a cada ano devem estar no mínimo indexadas ao próprio PIB e ponto, sendo indiferente para isso se elas são financiadas com o imposto X, Y ou Z. Portanto, o argumento não tem amparo na realidade legal; e

2)

A suposta deterioração dos recursos para a saúde.

Enquanto o ponto anterior refere-se a um aspecto formal, este diz respeito à suposta evolução dos dados fiscais após o fim da CPMF.

A tese é que a saúde estaria bem, não fosse a alegada erosão das verbas a ela destinadas, em virtude da extinção da contribuição.

Novamente, porém, o argumento não se sustenta.

A receita federal, incluindo a CPMF, foi de 23% do PIB em 2007 e, mesmo sem a contribuição, deverá ser de 23% a 24% do PIB em 2010.

A observação da tabela indica que, na composição das "outras despesas de custeio" (OCC) da Secretaria do Tesouro Nacional, a despesa com saúde em 2009 - já sem CPMF - foi 18% superior, em termos reais, à de 2007 - quando a contribuição ainda vigorava.

Ressalte-se ainda que, nos sete meses transcorridos até julho, em 2010, usando como deflator o IPCA, houve novo aumento da despesa real "per capita" em relação ao mesmo período de 2009.

Portanto, a ideia de que a saúde tem menos recursos agora por causa do fim da CPMF é falsa.

Na verdade, o que está em questão não é difícil de entender.

A rigor, desde a redemocratização de 1985, há praticamente 25 anos que, com exceção de um ano ou outro, o gasto público primário vem crescendo a taxas superiores às da economia.

Em particular, desde 1991 - quando as estatísticas fiscais passaram a ser apresentadas no formato atual - e 2010, o gasto primário do Governo Central terá passado de 14% para 23% do PIB.

Entre 1985 e 1994, esse crescimento da despesa foi financiado, na prática, via inflação; entre 1994 e 1998, por meio do aumento da dívida pública; e, entre 1998 e 2010, com mais impostos, no que a interseção entre a ciência política e as finanças públicas define como modelo de tipo "gaste e tribute".

Agora, está na hora de colocar um limite nessa tendência, sob pena de um país de renda média como o Brasil ficar com uma carga tributária digna da Escandinávia, com serviços públicos em muitos casos próprios dos países pobres da América Latina.

O setor público no Brasil precisa viver dentro dos seus limites.

Desde 1999, o país acostumou-se à noção de que há uma restrição orçamentária a ser respeitada e tem tido superávits primários sucessivos.

Agora, chegou o momento de aprender que existe também uma restrição tributária e que não é possível aumentar a carga tributária indefinidamente.

Fabio Giambiagi Valor Econômico