"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

março 17, 2014

DESAVERGONHADA, discurse na Copa!


Será uma pena se Dilma Rousseff não fizer, como é habitual, o discurso de abertura da Copa do Mundo de Futebol, que começa daqui a 87 dias. A presidente teria muito a explicar a respeito da enorme frustração que o evento deixará entre os brasileiros em termos de benefícios duradouros que, esperava-se, fossem gerados. O governo petista transformou o que era sonho em pesadelo.

O Brasil foi escolhido para sediar a Copa em outubro de 2007. Lá se vão, portanto, seis anos e meio, período mais que suficiente para construir o que quer que fosse. Mas não para o PT. Nunca antes na história, um país-sede indicado pela Fifa tivera tanto tempo para se preparar. Nunca antes na história, um país-sede chegou às vésperas do torneio tão despreparado.

Quando o Brasil foi escolhido, criou-se em torno da realização da Copa do Mundo no país a fantasia de que o torneio traria uma miríade de benefícios para a população, ajudaria a impulsionar a economia, a modernizar nossa infraestrutura e, sobretudo, a melhorar a vida de quem mora nas nossas metrópoles. Basta olhar em volta para perceber que tudo não passou de devaneio.


A infraestrutura continua tão em frangalhos quanto estava em 2007, sendo os aeroportos por onde transitarão os torcedores a melhor imagem do caos que cerca a véspera do evento futebolístico. Neste caso, o atraso médio é de seis meses, com metade das obras ainda pendentes – nos terminais de Fortaleza, Salvador, Confins e Galeão, elas não ficarão prontas a tempo do torneio. 
Não é só:
 portos, sistemas para fornecimento de energia e infraestrutura para comunicações também estão fora do cronograma.

A Copa é um dos eventos economicamente mais excitantes do planeta, mas encontra no Brasil a sua antítese. Chegamos ao torneio com a economia em debandada – apenas para ilustrar, no início do ano passado, as previsões dominantes davam conta de que o PIB brasileiro se expandiria à taxa de 3,5% em 2014, prognóstico que hoje está em menos da metade (1,7%). Ou seja, desperdiçamos a oportunidade de gerar emprego e renda para os brasileiros.


O mais grave, contudo, é o que aconteceu com a preparação das cidades-sede com vistas à Copa. A expectativa de transformação dos grandes centros com importantes obras de mobilidade passou longe de se efetivar. Metade das obras inicialmente previstas foi deixada de fora. Mas, ainda assim, uma de cada quatro intervenções de mobilidade programadas não serão entregues a tempo do torneio.

O custo com a Copa já bateu em R$ 26 bilhões e pode chegar a R$ 33 bilhões, quase 40% acima do inicialmente previsto. Cerca de um terço disso será torrado com reforma e construção de estádios, cujo orçamento triplicou desde o início da preparação até agora.

Os estádios do Mundial de 2014 serão os mais caros da história no quesito custo por assento: R$ 13,1 mil. Para se ter ideia da fortuna despendida, Alemanha e África do Sul gastaram R$ 5,5 mil por assento nas Copas de 2006 e 2010, respectivamente, segundo o Sinaenco. E, ao contrário do que costuma dizer o governo federal, quase todo o dinheiro gasto nos campos de futebol é oriundo de cofres públicos.

A má preparação do Brasil para a Copa virou até motivo de chacota ao redor do mundo, como foi o caso da revista francesa So Foot, que alertou aqueles que se dispõem a vir assistir o torneio in loco a se preparar para encontrar um “bordel”, palavra que em francês pode designar tanto casas de prostituição quanto bagunça.
https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhkKkNzwI1ylqXsvx7hmoRjUDqOnwIJbH94WHjJ5-q_cYd9KUkEZlhF1oqjnQqDKwQQfkaSg_qg9FaMYmBKvShFZw2efJfsNyv1JKXX7Otqn3cqdWFe_e2QaNfJNHj7VN7ZrVbSTqElvaaW/s1600/1001057_383555761748707_2095756294_n.jpg Na semana passada, ficamos sabendo que, infelizmente, Dilma Rousseff, que tanto gosta de exercitar sua capacidade oratória, será poupada de falar aos brasileiros e ao mundo na abertura da Copa. A versão oficial é de que a decisão foi da Fifa, ciosa de que se repetisse em junho próximo o vexame de um ano antes, quando nossa presidente foi fragorosamente vaiada em Brasília. Mais certo é que se trate de jogo jogado, a pedido do Planalto.

Mas seria muito interessante ver Dilma dar sua versão desta triste história, da qual participou desde o início – primeiro como ministra-chefe da Casa Civil, depois como “mãe do PAC” e, finalmente, como presidente da República. No mínimo, ouviríamos mais um de seus rompantes, como o que protagonizou na sexta-feira, ao ser vaiada em Tocantins. 

Ou o mais provável é que escutaríamos a torcida canarinho cantando em uníssono, a plenos pulmões: 
“Êh, ôh, a Dilma é um horror”.

Dilma, discurse na Copa!
Este e outros textos analíticos sobre a conjuntura política e econômica estão disponíveis na página do Instituto Teotônio Vilela

A HORA E A VEZ DE RECUPERAR O BRASIL DECENTE OU : Chega de cinismo

Recentemente, depois de uma conversa com estudantes em São Paulo, fui abordado por um universitário. Leitor voraz, inteligente e apaixonado, seus olhos emitiam um sinal de desalento. "Deixei de ler jornais", disse de supetão. "Não adianta o trabalho da imprensa. A impunidade venceu." Referia-se à vitória dos mensaleiros no Supremo Tribunal Federal (STF). Confesso, caro leitor, que meu otimismo natural estremeceu. Não se tratava do comentário de alguém situado no lusco-fusco da existência. Não. Era o diagnóstico de quem está nascendo para a vida.

Por uns momentos, talvez excessivamente longos, uma pesada cortina toldou meu espírito. Acabei reagindo, pois acredito na imensa capacidade humana de reconstruir a ordem social. Estou convencido de que os países construídos sobre os valores da verdade e da liberdade têm demonstrado maior capacidade de superação.

E o Brasil, não obstante os reiterados esforços de implosão da verdade (a mentira e o cinismo tomaram conta da vida pública) e de destruição da liberdade (a desmoralização programada das instituições democráticas e a transformação das imensas massas de excluídos em instrumentos do marketing populista), ainda conserva importantes reservas éticas. Escrevo, por isso, aos homens de bem. Eles existem. E são mais numerosos do que podem imaginar os voluptuosos detentores do poder.

Escrevo aos políticos que ainda acreditam que a razão de ser do seu mandato é um genuíno serviço à sociedade. Escrevo aos magistrados, aos membros do Ministério Público, aos policiais, aos servidores do Estado. Escrevo aos educadores, aos estudantes, às instituições representativas dos diversos setores da sociedade. Escrevo aos meus colegas da imprensa, depositários da esperança de uma sociedade traída por suas autoridades. Escrevo aos pais de família. Escrevo, enfim, ao meu jovem interlocutor. Quero justificar as razões do meu otimismo. Faço-o agora.

O Brasil está, de fato, passando por uma profunda crise ética. 
A corrupção, infelizmente, sempre existirá. Ela é a confirmação cotidiana da existência do pecado original. Mas uma coisa é a miséria do homem e outra, totalmente diferente, é a indústria da corrupção. Esta, sem dúvida, deve e pode ser combatida com os instrumentos de uma sociedade democrática. 
A simples leitura dos jornais oferece um quadro assustador do cinismo que se instalou nas entranhas do poder. Os criminosos, confiados nos precedentes da impunidade, já nem se preocupam em apagar suas impressões digitais. 
Tudo é feito às escâncaras, num processo programado de corrosão da democracia. Valores e princípios são mandados para o espaço. 
O que importa é não soltar o poder.
Os lulopetistas sempre menosprezaram os prejuízos eleitorais decorrentes do mensalão. Dizem que, mesmo depois de descoberto o esquema, Lula conquistou duas vezes a Presidência da República e elegeu Dilma Rousseff sua sucessora. O mesmo discurso foi entoado pelos advogados dos mensaleiros. Dilma, aparentemente, é mais recatada. Todavia as ações concretas da presidente mostram que sua visão ética da vida pública é a mesma de Lula: 
pragmatismo absoluto, vale-tudo, ausência de qualquer vestígio de estadista.

Mas não é só a impunidade que conspira contra os valores democráticos. 
Um dos últimos capítulos da novela de desestabilização das instituições foi o espetáculo de vandalismo em Brasília patrocinado pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST), que transformou a Praça dos Três Poderes num campo de batalha. Tudo começou com uma passeata de protesto contra o governo e a prisão dos mensaleiros.

Mas não demorou para o MST mostrar sua verdadeira cara:
15 mil militantes marcharam até a sede do STF, tentaram invadir o Palácio do Planalto e atacaram policiais militares (PMs), num confronto que resultou em 42 feridos, entre PMs e manifestantes. 

A reação do governo indica o apreço das autoridades pelas instituições democráticas:
os militantes foram recebidos pela presidente da República como se nada tivesse acontecido. Faz-se, de fato, o diabo para conquistar votos.

O respeito à democracia é detalhe menor.
Mas a coisa foi mais longe:
Gilberto Carvalho, braço de Lula no Ministério de Dilma, afirmou que o governo continuará a financiar o MST.
Resumo da ópera:
recursos públicos - o seu dinheiro, amigo leitor - devem ser usados para financiar entidades que caminham na contramão dos valores democráticos.

A ação do MST não foi uma explosão irresponsável de vandalismo. Foi uma estratégia de desmoralização da democracia. E o que fez a presidente? Acariciou os baderneiros e abriu o caixa para financiar a bagunça.
O comportamento de Dilma é muito parecido com o de Lula:
corrige em público, mas afaga e patrocina em privado. Assim foi com os protagonistas do maior espetáculo de corrupção da História deste país. E assim será com seus bibelôs radicais. Todos, afinal, estão a serviço da consolidação do projeto autoritário de poder.

O que espanta, caro leitor, é a covardia e ausência de propostas de amplos setores da oposição. Como cães sem raça, ladram, mas não mordem. Transmitem a sensação de que há muito rabo preso nos bastidores da Ilha da Fantasia.

A sociedade está cansada de tanta inconsistência, de tanto jogo de faz de conta, de tanto cinismo. Quer mudança. Quer um projeto verdadeiramente transformador. Os protestos da cidadania não foram decodificados com profundidade. A opção consumista é página virada. O povo quer educação, saúde, transporte. A classe emergente vai mostrar sua cara e sua força.

As eleições estão aí.
É preciso votar bem. 
Renovar, profundamente, o cenário nacional.
Não devemos votar em candidatos sob suspeição, em políticos indiciados, em oportunistas ou covardes. Verdade, liberdade e cidadania podem fazer do Brasil um grande país. Só depende de cada um de nós.
*Carlos Alberto Di Franco é doutor em comunicação pela Universidade de Navarra, é diretor do departamento de Comunicação do Instituto Internacional de Ciências Sociais. E-mail: difranco@iics.org.br.