"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

junho 24, 2011

A PROMISCUIDADE NA VIDA PÚBLICA

A frase "restaure-se a moralidade ou locupletemo-nos todos", atribuída ao Barão de Itararé (Aparício Torelly), retrata bem a postura irônica do humorista, de muitas décadas, diante da crônica de maus costumes éticos na vida política do país.
O afrouxamento moral tem longa história, e não parece que terá fim.

A tragédia ocorrida no fim de semana, com a queda de um helicóptero no Sul da Bahia, desvendou ligações do governador Sérgio Cabral com empresários que colocam questões sérias sobre até que ponto deve ir o relacionamento entre pessoas do mundo privado e público, sem que seja ultrapassada a fronteira do conflito de interesses.

Não se pode imaginar que o governador do Rio de Janeiro, seja qual for, não conheça pessoalmente o empresário Eike Batista, inclusive morador do Rio.
Nem que deixe de ter contato com outros empresários, entre eles empreiteiros, cuja parte ponderável do faturamento vem de verbas públicas.

Eles batem sempre à porta do setor público, nada a estranhar.
A questão entra em área sombria quando é perguntado se o governador deveria ter viajado para Porto Seguro no jato de Eike Batista, numa escala para desembarcar num resort próximo, em que haveria a festa de aniversário de Fernando Cavendish, dono da Delta, construtora com R$1 bilhão em contratos com o governo do Rio, alguns obtidos sem licitação.

Eike, procurado pela imprensa, declarou ter emprestado o jato "com satisfação".
Não se trata disso.
Cabral é que teria de perceber a inadequação da carona e a inoportunidade da festa.

Ligações perigosas existem pelo mundo.
Quando os estragos ocorrem na vida da pessoa pública, nota-se que ela nada enxergava de mal naquele relacionamento indevido.

A ministra francesa de Relações Exteriores, Michele Alliot-Marie, por exemplo, era próxima de empresários tunisianos da órbita do ditador Ben Ali. Passou, inclusive, o feriado de Natal em Túnis, quando já cresciam as manifestações contra o regime.

Como nos enredos da maioria das histórias desse tipo, a ministra voou em jatinhos privados. Pois os ventos da Primavera Árabe derrubaram Ali e a ministra.

O próprio chefe da ministra, presidente Nicolas Sarkozy, deve ter pago algum preço ao aparecer no avião particular e iate do amigo Vincent Bolloré. E não faltam amigos para pessoas poderosas na órbita pública.

No Brasil, depois de, no governo Collor, PC Farias ter ultrapassado todos os sinais vermelhos, a ponto de o presidente sofrer impeachment, veio a Era FH, na qual houve alguns cuidados na separação entre o público e o privado.
Criou-se, então, a Comissão de Ética da Presidência.

Já nos oito anos de Lula, a ética - inclusive a comissão - foi mandada às favas, uma contribuição dramática à deterioração dos costumes na vida pública.
O fato de o partido e o grupo de políticos que se apresentavam como reserva moral fazerem o oposto em Brasília funcionou como um "liberou geral".
Até porque o presidente sempre defendeu "mensaleiros" e "aloprados" petistas.

A tragédia no Sul da Bahia ocorreu dentro de todo este contexto. Deveria servir de alerta aos homens públicos que se descuidam e não delimitam os devidos espaços entre os cargos eletivos que ocupam e os interesses que os cercam.
Legítimos, mas tóxicos.
Precisam ser administrados com cuidado.

O Globo

HOJE É DIA DO "ARRAIÁ DO DIRCEU OU DO ZÉ E EVA"

O ex-ministro José Dirceu (PT) receberá hoje, em sua mansão em Vinhedo, a 80km de São Paulo, cerca de 500 convidados para uma festa junina.

No e-mail que ele mesmo enviou a amigos e parentes, pediu para as pessoas levarem "uma prenda e um trem de comer ou beber".

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a ex-primeira dama Marisa Letícia também foram chamados, mas não confirmaram presença. O casal tinha a tradição de promover uma badalada festa de são-joão na Granja do Torto, nos oito anos em que Lula passou no Palácio do Planalto.


A festa de Dirceu ganhou o apelido de Arraiá do Zé e da Eva e foi organizada pela esposa do político, Evanise Santos. Até as 18h ontem, pelo menos 150 pessoas haviam confirmado presença.

O prefeito de Campinas (SP), Hélio de Oliveira Santos, o Dr. Hélio (PDT), acusado de corrupção pelo Ministério Público (MP), está entre os convidados.
O próprio Dirceu responde a inquérito no Supremo Tribunal Federal, ao lado de outros 38 réus, devido à suspeita de envolvimento no episódio do mensalão.


A celebração foi planejada especialmente porque a presidente Dilma Rousseff não manterá a tradição do antecessor. Segundo fontes do PT de São Paulo, o motivo alegado por Dilma seria que a festa de Lula acabava se transformando num encontro político e a nova presidente não estaria bem disposta para um encontro como esse.

Dilma Rousseff também foi convidada, mas, como Lula e Dona Marisa, não confirmou presença na festa de Dirceu.

Até ontem, o casal Lula estava em dúvida se organizava uma festa íntima em uma chácara na Zona Rural de São Bernardo do Campo (SP) ou se ia para o são-joão em Vinhedo.

Correio Braziliense