"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

agosto 15, 2011

NOVA SAFRA DE IRREGULARIDADES

O Ministério da Agricultura continua rendendo vistosas safras de irregularidades. Há três semanas, a pasta chefiada por Wagner Rossi protagoniza casos cabeludos de corrupção e mau uso de dinheiro público.

Como é um feudo blindado do PMDB, a vassoura da faxina da presidente da República não se aventura por lá.


Neste fim de semana, a revista( Veja ) trouxe mais uma reportagem sobre as estripulias de Rossi, que comanda a Agricultura desde março de 2010.

Segundo o texto, o histórico do hoje ministro exibe desvios de alimentos para beneficiar aliados políticos, licitações viciadas com pagamento de propina e uso de recursos da União para quitar dívidas privadas.


As irregularidades aconteceram em alguns dos postos mais importantes ocupados por Rossi em sua carreira política, iniciada modestamente em Ribeirão Preto (SP) em 1982, quando ele se elegeu deputado estadual.

Há casos suspeitos em suas gestões à frente da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento) e da Codesp (Companhia Docas do Estado de São Paulo, um órgão federal).


Segundo Veja, na Conab "o próprio Rossi usou o expediente de distribuir alimentos para obter votos, inclusive para favorecer eleitoralmente o filho, Baleia Rossi, deputado estadual e presidente do diretório do PMDB de São Paulo".

Os principais beneficiados eram prefeitos da base eleitoral do ministro e de seu filho, na rica região de Ribeirão Preto.


Mas o caso mais chocante de desvio de alimentos aconteceu na Paraíba. No fim de 2007, 100 toneladas de feijão foram mandadas para lá para serem distribuídas pela prefeitura local.

Mas, ao invés de servir para saciar a fome de famílias necessitadas, o alimento permaneceu estocado à espera da melhor oportunidade para ser distribuído: as vésperas das eleições municipais de 2008.


Denunciada a manobra por um funcionário da Conab na Paraíba, 8 toneladas de feijão foram despejadas no lixão de João Pessoa, como forma de evitar um flagrante da Política Federal e da Justiça Eleitoral.

O vídeo com as imagens chocantes de grãos de comida espalhados em meio à sujeira está disponível na internet.

Outro caso revelado nesta semana por Veja mostra que, como presidente da federal Codesp, Rossi quitou, com dinheiro público, uma dívida de R$ 126 milhões que empresas contratadas pelo porto de Santos tinham com a Previdência.

Em razão disso, o ministro hoje figura como réu numa ação popular na Justiça Federal de Santos, denunciado por "administração temerária, conduta suspeita e má-fé".


Nas duas últimas semanas, Wagner Rossi teve de ir duas vezes ao Congresso para tentar explicar as falcatruas que grassam no Ministério da Agricultura e na Conab. Seus depoimentos, porém, sempre contaram com a operosa blindagem da base aliada do governo, disposta a manter qualquer esfregão longe do feudo pemedebista.

O PMDB parece ter tanta convicção de que a faxina da presidente Dilma Rousseff é de mentirinha que até ato de desagravo a Rossi protagonizou na semana passada em São Paulo, com a presença de todas as suas principais lideranças nacionais, tendo o vice-presidente da República, Michel Temer, à frente.

Assim como aconteceu nos ministérios dos Transportes e do Turismo, o mais chocante no caso da Agricultura é que pouco se vê a pasta empenhada em impulsionar este setor da economia brasileira.

Os esforços são concentrados em sangrar os cofres públicos e não em tornar o campo mais produtivo ou, no caso dos Transportes, em melhorar nossa infraestrutura viária e, no do Turismo, em atrair mais visitantes para o país.

O que interessa aos condôminos do poder petista é praticar um assalto continuado ao dinheiro do contribuinte.


Fonte: ITV

"Quanto mais botequim, mais pinguço - ou seja, a afluência de processos aumenta.". JUSTIÇA DO TRABALHO CUSTA CR$61,24 A CADA BRASILEIRO.

Se o Estado resolvesse pagar todas as reclamações trabalhistas, sairia mais barato do que manter a estrutura da Justiça do Trabalho em funcionamento.

Em 2010, a despesa foi de R$ 61,24 para cada brasileiro, 8,64% a mais do que no ano anterior (R$ 56,37), totalizando R$ 11,680 bilhões.


Em igual período, foram pagos aos reclamantes R$ 11,287 bilhões, ou 10,3% mais que em 2009.

Os dados são do Tribunal Superior do Trabalho (TST) e indicam que, mesmo com a arrecadação de R$ 3,137 bilhões decorrentes das decisões, o custo é alto.

O contribuinte sustenta uma enorme estrutura, com 1.377 varas e pelo menos um tribunal em cada Estado (exceto Acre, Roraima e Tocantins), além do TST.

E os números vão crescer. A presidente Dilma Rousseff autorizou 68 novas varas do trabalho em São Paulo e 2 no Maranhão.

"Não será criando novas varas que se vai resolver o problema", diz o advogado Almir Pazzianotto Pinto. "Quanto mais botequim, mais pinguço - ou seja, a afluência de processos aumenta."

Para Artur Henrique, da CUT, a atual quantidade de processos reflete a falta negociação no local de trabalho.

Segundo ele, as empresas que têm comissão ou representação sindical enfrentam menos ações, já que boa parte dos conflitos é resolvida sem intervenção judicial.


REAJUSTES CONCEDIDO POR "CACHAÇA" ELEVAM CUSTOS SALARIAIS.

As reestruturações de carreiras dos servidores públicos, realizadas pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva nos três últimos anos do seu segundo mandato, continuam repercutindo sobre as contas públicas.

Este ano, os aumentos de remuneração dos servidores decorrentes dessas reestruturações elevarão as despesas da União com o pagamento de pessoal em R$ 6,9 bilhões, de acordo com o Anexo V das leis orçamentárias de 2010 e 2011.

No próximo ano, ainda haverá uma conta superior a R$ 800 milhões para ser paga.


Devido a essas reestruturações, os gastos com o pagamento de servidores de janeiro a junho deste ano cresceram 11,3% em comparação com o igual período de 2010, mesmo com a decisão da presidente Dilma Rousseff de não conceder novos reajustes e de suspender os concursos públicos e as contratações de mais funcionários.

A despesa passou de R$ 78,2 bilhões no primeiro semestre de 2010 para R$ 87 bilhões no primeiro semestre deste ano - R$ 8,8 bilhões a mais, de acordo com a Secretaria do Tesouro Nacional (STN).

O aumento real desses gastos no primeiro semestre foi de 4,3%, considerada a inflação do período medida pelo IPCA.


Os aumentos salariais, decorrentes das reestruturações de numerosas carreiras de servidores, foram concedidos em até quatro parcelas anuais, de acordo com as leis 11.784/2008, 11.907/2009 e 12.277/2010.

No ano passado, os reajustes a funcionários de nível superior variaram de 19,4% a 31,4%, enquanto os funcionários de nível médio obtiveram aumentos entre 3,1% e 15,2%.


O impacto dessa parcela sobre a folha de pagamento em 2010 foi de R$ 7,2 bilhões, pois o reajuste não repercutiu sobre todos os meses do ano (as diversas categorias receberam os aumentos em meses diferentes).

O custo anualizado dessa parcela foi de R$ 13,3 bilhões. Assim, uma parte da despesas do aumento dado em 2010 só foi paga este ano - a conta que ficou para 2011 foi de R$ 6 bilhões.


Ainda houve este ano um "resíduo" dos aumentos concedidos por Lula - a última parcela, que incidiu sobre os salários de julho, pagos em agosto. O custo dessa parcela será de R$ 868,2 milhões em 2011.

O custo anualizado é de R$ 1,686 bilhão. Assim, ficará para ser pago no próximo ano uma conta de R$ 818 milhões (R$ 1,686 bilhão menos R$ 868,2 milhões).


Dos R$ 8,8 bilhões de aumento da despesa com pessoal no primeiro semestre, em comparação com igual período de 2010, R$ 1,6 bilhão deve-se a reajustes salariais dos servidores do Legislativo e do Judiciário em anos anteriores, com repercussão em 2011.

Os parlamentares aprovaram este ano, pelo Decreto Legislativo 805, a revisão do subsídio dos membros do Legislativo.

O custo foi de R$ 144,4 milhões este ano e de R$ 155,7 milhões, anualizado. O DL 805 promoveu também a revisão do subsídio do presidente e vice-presidente da República e dos ministros de Estado.

Mas essa conta não ultrapassa R$ 8,5 milhões este ano e é de R$ 9,2 milhões anualizada.


Do gasto adicional com pessoal de R$ 8,8 bilhões no primeiro semestre deste ano, R$ 7,2 bilhões refere-se ao Executivo. Do total, R$ 1 bilhão decorreu do ingresso de novos servidores na administração pública federal no último semestre do ano passado e nos primeiros meses deste ano, segundo informação do Planejamento.

A decisão da presidente Dilma de suspender as contratações de mais servidores não atingiram aqueles que estavam em processo de contratação.


Houve ainda um aumento de R$ 800 milhões no pagamento de precatórios e sentenças judiciais de pessoal, que passou de R$ 3,7 bilhões no primeiro semestre de 2010 para R$ 4,5 bilhões em igual período deste ano.

A Secretaria do Tesouro Nacional não informou como esse gasto adicional foi dividido entre os três Poderes.

Ribamar Oliveira Valor Econômico

CASO "LALAU" FAZ 20 ANOS SEM SOLUÇÃO.


Em janeiro de 1992, o então presidente do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de São Paulo, o juiz Nicolau dos Santos Neto, abriu uma licitação para a aquisição ou construção de um imóvel destinado a abrigar o fórum trabalhista da capital paulista.

Passados quase 20 anos, apenas dois dos inúmeros procedimentos abertos para recuperar o dinheiro desviado e punir os responsáveis por um dos maiores esquemas de desvio de verbas públicas da história do Brasil foram concluídos.

Coincidentemente, nenhum desses dependia do aval do Poder Judiciário nacional. Na esfera judicial, outras dezenas de medidas foram adotadas com o mesmo objetivo a partir de 1998.

Essas, no entanto, ainda aguardam um desfecho em diferentes instâncias da Justiça brasileira.


Juntos, os processos judiciais que envolvem o "caso TRT", como ficou conhecido, somam pelo menos 226 volumes de, em média, 300 folhas cada um.

Ao todo são quase 68 mil páginas anexadas aos 26 tipos de ações judiciais e recursos utilizados pelos acusadores (o Ministério Público Federal) e pelos réus.

Os processos foram abertos em três diferentes tribunais do país e na primeira instância da Justiça Federal - somente os habeas corpus impetrados pela defesa dos réus somaram 43.


Os números foram obtidos pela pesquisadora Maíra Rocha Machado, da Direito GV, e compõem um estudo sobre os desafios da legislação internacional anticorrupção realizado em conjunto com a Universidad San Andres, da Argentina, e a New York University.

De acordo com a pesquisa, feita com base em dois estudos de caso - entre eles o do TRT - estão em tramitação pelo menos 52 processos e recursos relacionados ao episódio e que têm como parte o juiz Nicolau dos Santos Neto. Segundo a pesquisa, ainda estão em andamento, à espera de julgamento, 14 processos e recursos na primeira instância da Justiça Federal; 18 no Tribunal Regional Federal (TRF) da 3ª Região; 12 no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e 8 no Supremo Tribunal Federal (STF).

Outras 124 medidas judiciais - a maior parte delas recursos - já foram arquivadas no Poder Judiciário.


A pesquisa aponta que os principais procedimentos judiciais adotados no Brasil para punir os responsáveis pela fraude e recuperar os R$ 169 milhões desviados da construção do fórum trabalhista de São Paulo ainda não foram concluídos.

Um dos mais importantes é a ação civil pública aberta pelo Ministério Público Federal para ressarcir o erário.

Com 112 volumes, o processo ainda não foi julgado nem na primeira instância da Justiça Federal. No entanto, desde 1998, quando começou a tramitar, os bens dos réus estão bloqueados por decisão judicial.


Um pouco mais avançadas estão as ações penais abertas pelo Ministério Público Federal no ano 2000 contra o juiz Nicolau dos Santos Neto, os empresários Fábio Monteiro de Barros Filho e José Eduardo Correa Teixeira Ferraz, sócios da empresa Incal Incorporações, que assinou o contrato para a construção do prédio, e o ex-senador Luiz Estevão de Oliveira Neto, dono do Grupo OK.

Na primeira instância, apenas o "juiz Lalau", como ficou conhecido, foi condenado. Em 2002, a sentença estabeleceu uma pena de oito anos de prisão por lavagem de dinheiro ao juiz, que foi absolvido do crime de corrupção.

Todos os demais réus foram absolvidos.


O Ministério Público Federal recorreu da decisão e, em 2006, o TRF da 3ª Região reformou a sentença para condenar todos os réus a penas que vão de 26 a 31 anos de prisão, além do pagamento de multas de R$ 900 mil a R$ 3 milhões.

Todos recorreram ao STJ e ao Supremo e até hoje aguardam o julgamento de seus recursos em liberdade, com exceção de Nicolau dos Santos Neto, preso em dezembro de 2000 e hoje em prisão domiciliar.


O advogado criminalista Francisco de Assis Pereira, que defende o juiz, afirma que desde 2000, quando seu cliente foi preso, já ingressou com diversos recursos pedindo o desbloqueio de seus bens e também que o réu responda aos processos em liberdade.

"A única coisa que consegui foi um habeas corpus no STJ para que ele fosse mantido em prisão domiciliar, pois tem 70% das coronárias entupidas", diz.

Além disso, segundo ele, uma mudança na lei penal que entrou em vigor neste ano permite que qualquer réu com mais de 70 anos possa pedir o benefício, independentemente de sua condição de saúde.


Nicolau dos Santos Neto, segundo seu advogado, tem hoje 83 anos e mora na mesma casa em que vivia antes de assumir o cargo de juiz do TRT, do qual se aposentou em 1998.

Com exceção dela, não tem nenhum bem que não esteja bloqueado. "Ele vive com a ajuda das filhas e vendendo objetos que tinha em sua residência", afirma.

Assis Pereira diz não se surpreender com a lentidão da Justiça em julgar os processos relacionados ao caso TRT.
"O caso do doutor Nicolau corre até mais rápido do que vários outros", afirma.

"Hoje há 13 milhões de processos represados na primeira e na segunda instância da Justiça, o que dá 6 mil para cada juiz do país julgar, fora as ações que ingressam no Judiciário todo dia", diz. "É um ciclo vicioso que não tem mais jeito de quebrar, a Justiça está numa situação de falência."


Mais sorte tiveram os demais réus das ações penais.
Luiz Estevão de Oliveira Neto, Fábio Monteiro de Barros e José Eduardo Ferraz foram presos preventivamente no decorrer dos processos, mas apenas por poucos dias. Eles aguardam em liberdade o julgamento de seus recursos contra as condenações impostas pelo TRF no STJ e no Supremo.

O criminalista Eugênio Malavasi, que defende Fábio Monteiro de Barros, afirma que a demora no julgamento de seu cliente, assim como dos demais, deve-se ao tamanho e à complexidade dos recursos.

"São mais de 80 volumes e várias teses a serem analisadas", diz. Malavasi conta que seu cliente vive hoje de consultorias que presta no ramo imobiliário em São Paulo, já que seus bens também estão bloqueados, e que as empresas das quais era sócio estão inativas.


Procurados pelo Valor, os advogados de José Eduardo Ferraz e de Luiz Estevão de Oliveira Neto - que entre outros é defendido pelo ex-ministro do Supremo, Carlos Velloso - não retornaram as ligações até o fechamento desta edição.

Atual presidente do Brasiliense Futebol Clube, Luiz Estevão foi localizado pela reportagem, mas afirmou que estava ocupado e que por isso não poderia conceder entrevista.


Luiz Estevão foi o primeiro senador da República a ser cassado na história do Brasil. Após a conclusão da CPI do Judiciário no Senado, que trouxe à tona as diversas irregularidades na construção do fórum trabalhista - algumas delas identificadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU) poucos meses após a realização da licitação, ainda em 1992 -, vários partidos apresentaram uma representação contra o então senador por quebra de decoro parlamentar.

Em junho de 2000, Luiz Estevão foi cassado e considerado inelegível por dez anos - prazo concluído em meados do ano passado.


A decisão do Senado em relação a Luiz Estevão foi uma das duas únicas medidas tomadas no caso TRT já concluídas e efetivadas. A outra medida que já produziu efeitos - e que também não ficou à mercê da morosidade do Judiciário brasileiro - foi a transferência da propriedade de um apartamento de Nicolau dos Santos Neto em Miami.

Nesse caso, o Ministério da Justiça brasileiro contratou advogados nos Estados Unidos para pedir à Justiça do país a decretação da perda de propriedade em favor da União, uma vez que ficou comprovado que o imóvel foi adquirido com recursos públicos.

O pedido à Justiça americana foi feito em setembro de 2000 e, pouco menos de um ano depois, a decisão favorável ao governo brasileiro já havia sido dada.
O apartamento foi leiloado no fim de 2002 e US$ 690,11 mil foram depositados na conta do Tesouro Nacional.

Cristine Prestes Valor Econômico

O BRASIL FICOU MUITO CARO.

Por todo lugar onde passo, ouço histórias de indústrias brasileiras que perdem mercado para concorrentes chineses. Trata-se de uma dupla perda. De um lado, há companhias locais que não resistem à entrada dos produtos importados.

Na outra ponta - e talvez seja o caso mais dramático -, empresas exportadoras são deslocadas pelos chineses de mercados na América Latina, nos Estados Unidos e na Europa.


São situações bem diferentes, a exigir respostas diferentes. No caso da concorrência dos importados, é até mais fácil. No limite, e sem discutir, por ora, o mérito dessa política, o governo brasileiro pode impor severas restrições à importação, combinando-as com medidas de favorecimento ao produto nacional.

Como, aliás, já começa a fazer.


Mas como fazer para equilibrar a concorrência com os chineses no mercado de ônibus urbanos no Peru? Pode-se até conseguir alguma coisa por meio da diplomacia - Hugo Chávez, por exemplo, a um dado momento, deu preferência a produtos e serviços brasileiros, como na construção de obras públicas. Mas está claro que isso é episódico.

Governos estrangeiros, em regra, não vão conceder proteção às mercadorias brasileiras.


Que fazer? Executivos envolvidos nessas histórias têm suas explicações e propostas.

O real valorizado e o yuan, moeda chinesa, desvalorizado são, claro, parte importante do problema. Mas tenho ouvido cada vez mais outras interpretações, que colocam a questão da competitividade geral das duas economias.

Os salários chineses, por exemplo. Já não são baixos, pelo menos não nos setores mais avançados, como eletrônicos, informática e tecnologia da comunicação - contam executivos que lidam com essa concorrência.

Dizem que os salários têm subido de maneira expressiva nos últimos anos e, mesmo assim, os produtos deles preservam preços competitivos no mundo todo.


Mas os impostos sobre a folha de salários fazem muita diferença. Ou seja, em diversos setores econômicos, o dinheiro que o trabalhador brasileiro leva para casa não é mais do que o obtido pelo chinês.

A diferença efetiva está no imposto cobrado sobre a folha de salários: aqui, algo como 35%; lá, quase nada.


Na verdade, o peso dos impostos brasileiros fica cada vez mais evidente. Ouço frequentes relatos de executivos brasileiros que têm na ponta da língua a sequência infinita de impostos, taxas e contribuições que pagam desde o início da produção até colocar a mercadoria no navio.

Todo mundo sabe disso, a começar pelo governo. Tanto que todas as políticas industriais incluem como peça essencial a desoneração de impostos para setores e empresas. Mas não funciona, porque só podem ser beneficiados alguns poucos escolhidos, uma vez que o governo continua precisando de arrecadação para financiar gastos crescentes.

Este ou aquele setor ganha uma competitividade extra, e dependente das autoridades de plantão, mas o geral da economia continua pagando caro.


O outro problema cada vez mais evidente é o custo de capital - a taxa de juros.

A empresa brasileira se financia a juros muito, mas muito maiores que a chinesa. De novo, a política industrial concede financiamentos a juros baixinhos via Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

Mas poucos têm acesso a esse dinheiro barato. Quer dizer, barato para o tomador, mas caro para o governo, que o subsidia.


Acrescente o custo da infraestrutura - a gente não faz um aeroporto novo há décadas, os chineses fizeram uma rede - e se tem a história toda.

Nada disso é novo. O que me parece novo é o aparecimento frequente desse tema na bronca dos executivos. Antes, quase só se reclamava da taxa de câmbio. Hoje se fala mais do custo Brasil, antes do câmbio.

Essa é a abordagem correta. Claro que um real bem desvalorizado - a R$ 3 por dólar, digamos - tornaria mais competitivos os produtos brasileiros lá fora. Mas provocaria uma forte inflação local, ao encarecer os importados e os produtos locais comercializáveis internacionalmente. Seria um novo tipo de custo Brasil.

Por outro lado, a proteção ao produto brasileiro no mercado brasileiro também vai encarecer o preço, sem representar ajuda para a exportação.

Eis o ponto: produzir no Brasil ficou muito caro - pelos impostos e juros e pelo ambiente de negócios (custos burocráticos, de licenciamento, etc.) - e não há mais real desvalorizado que resolva.

Bobeamos nisso. Há anos que a carga tributária aumenta todos os anos - e isso tem passado quase sem oposição. Não digo que devemos importar os republicanos americanos, mas vamos reparar: a gente paga mais imposto que os americanos.

Há anos pagamos juros elevadíssimos e parece que está tudo bem. Até acreditamos quando nos dizem que sai em seis vezes no cartão sem juros. Ora, pessoal, essa autoenganação está passando do limite.

O que atrapalha o Brasil, o que impede o crescimento mais rápido, o que nos derrota na concorrência com os chineses é o governo - que arrecada demais, gasta demais, e mal, e ainda por cima deve muito, toma muito dinheiro emprestado, forçando os juros para a Lua.

Carlos Alberto Sardenberg O Estado de S. Paulo