"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

outubro 09, 2012

BRASIL DO BEM - PARA OS ANAIS ! JOSE DIRCEU(ZÉ CASSADO) de líder estudantil a réu condenado por corrupção POR DOIS PODERES DA REPÚBLICA.


Condenado no Supremo Tribunal Federal (STF) pelo crime de corrupção ativa, acusado de comandar uma sofisticada organização criminosa no esquema do mensalão, o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu foi líder estudantil, participou da luta armada, foi preso político, exilado e viveu dupla identidade na clandestinidade, antes de assumir a presidência do Partido dos Trabalhadores e levar a legenda à conquista da Presidência da república, com Lula, em 2002.

Ainda menino, em Passa Quatro, Minas Gerais, Dirceu já sonhava com um futuro que iria além dos horizontes da pacata cidade na serra mineira:.
Sozinho, olhando para o céu, vi uma estrela caindo e descobri o que queria: sair dali para conhecer o mundo.

A descoberta da política

Ao sair da cidade natal, Dirceu, recomendado por um tio, prefeito de uma cidade do interior de São Paulo, foi trabalhar no escritório político do então deputado Havolene Júnior. O jovem José Dirceu assistiu ao golpe militar de 1964 na Praça da República. Não participava do movimento secundarista, embora já fosse politizado.

Quando vi aqueles filhinhos de papai, pó-de-arroz, filhos de paulistas quatrocentões, menininhos do Mackenzie, apoiando o golpe, disse logo: tô contra.
Amigos de Dirceu daquela época contam que ele era terrível: compatibilizava a vida de contínuo bem remunerado, pois trabalhava muito, com a de organizador estudantil e freqüentador da noite paulista.

Parece mentira, mas o Zé entrava numa fila de banco para pagar as contas do patrão e já saía com uma namorada. Andava dez metros e já era assediado - conta um amigo.

A faculdade mudou minha vida. confesa Dirceu. Participei de uma revolução dos costumes, contra os padrões morais daquela época. Usava cabelos compridos.
O movimento estudantil, na época, impulsionava todos os acontecimentos culturais: estava presente na música popular, no cinema, no teatro.

Apesar de sua liderança no meio estudantil, Dirceu sempre era do tipo "eu sou eu". Entrou para o PCB e saiu com a dissidência:
Minha geração sempre foi anti-stalinista. Todo o meu grupo optou pela luta armada, menos eu. Mas só fui descobrir isso ao ser preso no Congresso de Ibiúna.
Um dos presos políticos trocados pelo embaixador americano, Dirceu acabou se envolvendo diretamente com a luta armada no treinamento em Cuba.

Recebeu a missão de vir para o Brasil.
Durante um ano e meio treinou sua nova identidade em Cuba: escolheu uma cidade, Guaratinguetá, estudou tudo sobre ela e decorou o script de sua família fictícia. Aprovado no curso, assumiu a identidade de Carlos Henrique.
Parentes, amigos e companheiros pensavam que Dirceu tinha vivido sete anos no exílio.

Mas ele escondeu que passou parte desse tempo no país, na clandestinidade, precisamente em Cruzeiro do Oeste, no Paraná, como o pacato pecuarista e depois empresário Carlos Henrique Gouveia de Melo. Essa história, por si só insólita, se tornaria ainda mais inusitada quando ele contou que, nesse período, namorou e se casou com uma linda jovem da cidade, com quem teve um filho, e que só soube quem ele era seis anos depois do casamento.

Anistia para Pedro Caroço

Já estabelecido na cidade, casou-se com Clara Becker, uma jovem empresária. Dirceu ficou feliz quando recebeu o apelido de Pedro Caroço, em alusão ao personagem da música de Genival Lacerda que estava de olho "é na butique dela". Com a anistia de 1979, certo dia, Pedro Caroço parou o carro em frente a uma das butiques da mulher, pediu que ela entrasse e começou:

Tenho que contar uma coisa que vai mudar nossas vidas.
Clara ficou estarrecida e preconizou:
Estou perdendo você.

Carlos Henrique voltou para Cuba para poder entrar no Brasil como retornado:
Fiz isso para não revelar que passei esse tempo todo no Brasil, o que poderia parecer uma bravata. Segundo, para não colocar em risco vidas de pessoas e, terceiro, porque ninguém tinha certeza de que a democracia estava vindo para valer.

Em Cuba, Dirceu, que havia feito uma operação plástica para poder transformar-se em Carlos Henrique, a desfez para reassumir a identidade verdadeira. Por segurança, de 1979 até 86 só Clara ficou sabendo que Dirceu havia sido Carlos Henrique.

Como Carlos Henrique, Dirceu conviveu com parentes do locutor esportivo Osmar Santos. Na campanha das diretas, em 84, trabalhando com Osmar, Dirceu ficava horas falando da vida do locutor, que ficava intrigado.

Dois anos depois é que Osmar soube que o petista havia sido o famoso Pedro Caroço. E se vingava todas as vezes que o time de Dirceu, o Corinthians, estava perdendo:
Olha aí, Pedro Caroço, o seu time está perdendo. Em que lugar do Brasil você deve estar agora?

Hoje, Dirceu está no quarto casamento. Entre a separação de Clara, em 81, e a atual união com Evanise Santos, ele se casou com a portuguesa Ângela Saragossa, com quem teve uma filha, Joana e com Maria Rita. Dirceu também tem outra filha, Camila, de outro relacionamento.

De sua identidade de Carlos Henrique ficou uma das mais gratas recordações de vida: o filho Zeca, que já exerce atividade política e administrativa na cidade. Zeca tem uma filha, Camila.

Do Planalto à planície

Já no PT, construiu com Lula, que vinha do movimento sindical, uma parceria com base mais na complementaridade do que nas afinidades pessoais. Segundo ex-companheiros, um tinha o carisma popular, outro a capacidade de planejamento e disciplina.

Enquanto suas consultorias privadas pós-governo renderam denúncias de tráfico de influência, a forma como saiu da Câmara sem renunciar, como outros acusados de participar do mensalão, foi cassado e perdeu o direito de concorrer até 2015 e seus discursos para a militância lhe renderam a imagem de um mártir para muitos no partido.

Até Lula pediu que ele renunciasse (ao mandato), mas pesou para ele a visão de que, enfrentando o processo de cassação até o fim, faria o que a militância esperava dele disse um amigo.

Sete anos depois de deixar o Planalto, Dirceu mantém influência no governo, no partido e a adoração de militantes sentimento que parece só ter crescido após a crise do mensalão, que o tirou do poder.

Afastado oficialmente dos palcos da política desde 2005, quando deixou a Casa Civil e teve seu mandato de deputado cassado em meio à crise do escândalo da compra de votos, Dirceu nunca se distanciou da articulação política, nem deixou de exercer seu papel de liderança no PT.

As razões da manutenção do seu poder e influência enquanto outros nomes históricos do partido se afastaram, está, segundo pessoas próximas e até mesmo desafetos, na obstinação e disciplina do ex-guerrilheiro.

O trabalho, a competência, a liderança de Dirceu foram a base da aliança que elegeu Lula. No governo, sua capacidade de trabalho e visão política fizeram dele um 'primeiro-ministro de fato'... Era o candidato natural à sucessão de Lula, daí esta denúncia contra ele afirma o amigo e advogado Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, para quem nada se apurou contra Dirceu ao longo do processo.

Se tem amigos fiéis e admiradores no PT e na esquerda, Dirceu também acumulou ao longo dos anos inimigos no partido e entre siglas aliadas. Um deles, o ex-deputado petebista Roberto Jefferson, delatou o mensalão e foi o responsável por colocar Dirceu no centro das denúncias, que começaram a ser julgadas em agosto em um julgamento sem previsão de acabar.

Na ação penal do mensalão, o maior processo da história do STF, Dirceu voltou aos holofotes como principal dos 37 réus do julgamento segundo o Ministério Público Federal, o ex-ministro foi quem montou o esquema de compra de apoio político ao governo Lula no Congresso.

Por ironia, foi o Dirceu, na Casa Civil, quem teve a tarefa de procurar os dois primeiros indicados de Lula ao STF, Ayres Britto e Joaquim Barbosa lembra outra pessoa que conviveu com o petista no governo.
 Em meio ao turbilhão que pode levá-lo à prisão, Dirceu não deixou de se dedicar aos problemas políticos de seu partido.

 Em um artigo em seu blog no início de setembro, enquanto o PT atacava o líder nas pesquisas em São Paulo, Celso Russomanno (PRB), Dirceu afirmou que Russomanno era tarefa apenas para o segundo turno e o foco naquele momento para o PT precisava ser atacar o tucano José Serra para garantir a vaga na segunda fase da corrida eleitoral.

Esta capacidade de análise, de ver a política tanto de cima quanto com lente de aumento, sempre fez de Dirceu uma liderança essencial disse outro aliado que integrou o primeiro escalão na mesma época em que Dirceu ocupou a Casa Civil.

Mesmo longe do Planalto, não deixou de lado as atividades políticas. "Nunca saí daqui", disse ele ao final de 2010 em um evento no Planalto, ao ser perguntado por jornalistas como era estar de volta ao local.

Uma prova disso foram as articulações, entre 2009 e 2010, para costurar as alianças regionais que ajudariam na vitória de sua substituta na Casa Civil, Dilma Rousseff, na eleição presidencial. Em poucos meses, viajou por quase todos os Estados do país, foi recebido por governadores e lideranças aliadas e de oposição.

Continuou a utilizar o conhecimento de quem, entre 1995 e 2002, dirigiu o PT com o único foco de levar o partido ao Planalto.

Ele dizimou as esquerdas mais radicais do partido, escolheu novas lideranças, reforçou tendências moderadas para unificar um partido que até então era um ajuntamento de forças individuais afirma um integrante de um partido aliado.

O Globo 

MINISTRA CARMÉM LÚCIA : "A ilegalidade não é normal, senhor presidente. No estado de direito, o ilícito há de ser processado e, se comprovado, punido”,

 
A ministra Cármen Lúcia deu o sexto voto pela condenação por corrupção ativa do ex-tesoureiro do PT, Delúbio Soares, e do empresário de publicidade Marcos Valério no processo do mensalão. Com isso, já há maioria para condená-los, assim como os ex-sócios de Valério, Ramon Hollerbach e Cristiano Paz, e a ex-diretora da SMP&B Simone Vasconcelos. 

Cármen Lúcia aproveitou para fazer severas críticas à defesa de Delúbio, em especial ao advogado Arnaldo Malheiros Filho. Ela destacou que da tribuna do Supremo Tribunal Federal (STF) o advogado admitiu a prática de ilícito, ainda que tenha tentando resumir o esquema a caixa dois de campanha.
 
A ministra disse que a admissão do ilícito lhe causou “desconforto”.
 “A própria defesa assume isso e tenta dizer: 
‘Ora, brasileiros, o ilícito é normal’. 
A ilegalidade não é normal, senhor presidente. 
No estado de direito, o ilícito há de ser processado e, se comprovado, punido”, disse.

“Portanto, me causou um profundo desconforto mas, principalmente, significou que, se houve ilícito,e se esse ilícito dizia respeito a um partido, a um grupo, essa afirmativa significou que havia outros envolvidos, entrelaçamento,” complementou a ministra.

Segundo a magistrada, que também ocupa a presidência do Tribunal Superior Eleitoral, disse que é “grave” a confissão do caixa 2 para campanha. “Acho estranho e muito, muito grave, que alguém diga, ‘houve caixa 2’. Caixa 2 é crime, é agressão contra sociedade brasileira. Mesmo que tivesse sido isso, não é pouco. Me parece grave, porque parece que ilícito no Brasil pode ser realizado e tudo bem", disse.

Em relação ao núcleo publicitário, a ministra afirmou que há provas contra Valério, Ramon, Cristiano e Simone e destacou a unanimidade do tribunal até agora. Ela condenou ainda Rogério Tolentino. No caso deste ex-advogado está quatro votos a dois pela condenação. 

Cármen Lúcia absolveu apenas a ex-funcionária da agência Geiza Dias e o ex-ministro dos Transportes Anderson Adauto. Nestes casos, todos, até agora, votaram pela absolvição.

O bode expiatório


De onde menos se espera... é que não vem nada mesmo.

Sim, estou falando dos votos de Lewandowski. Por seu conhecimento especializado, um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) tem o direito de votar como bem entender no julgamento do Mensalão.

Mas nós, cidadãos, desprovidos desse conhecimento, temos também o direito a nossa interpretação quanto ao que está fazendo o ministro.

Lewandowski absolveu toda a cúpula dirigente do PT envolvida no escândalo de corrupção: o ex-presidente da Câmara dos Deputados, João Paulo Cunha, o ex-presidente do partido, José Genoino, e o ex-ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu.

Confirmaram-se as piores suspeitas levantadas pelo arguto observador político Merval Pereira, ainda no início do histórico julgamento:
"De minha parte, espero ter me precipitado ao afirmar que Lewandowski agia de modo a ajudar os réus políticos, especialmente os petistas. Vamos aguardar para ver como distribuirá sua justiça."

Não, meu caro Merval, você não se precipitou. Apenas avaliou corretamente os primeiros indícios da atuação do ministro.

Temos os mais legítimos interesses no aperfeiçoamento de nossas instituições democráticas. O julgamento do Mensalão é um momento decisivo nesse processo. Com a condenação de representantes do Executivo pela compra de apoio parlamentar, os ministros do STF demarcam agora a independência do Poder Judiciário.

É um passo importante para a erradicação de degeneradas práticas políticas.

Lewandowski admitiu que "houve crimes graves, e quem os cometeu vai ter de pagar". Condenou publicitários, banqueiros e políticos dos demais partidos como corruptos e corruptores. Mas, no Mensalão, o que nos interessa é o julgamento de um atentado contra a independência dos poderes de um regime democrático.

Aqui reside a questão fundamental de interesse público:
a condenação da compra de apoio parlamentar pelo antigo núcleo político do governo.
Os votos de Lewandowski transformam-se, portanto, numa brutal, expiatória e inverossímil acusação ao tesoureiro Delúbio Soares, tornando-o inteiramente responsável por toda a condenável manobra de articulação suprapartidária ora em julgamento. Prevalece a forma sobre o conteúdo.

Mas quem vai julgar Lewandowski é a História de uma Grande Sociedade Aberta em construção.

 O Globo