"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

setembro 25, 2011

Queijo terá de deixar apartamento funcional em Brasília, decide juiz

A Justiça Federal determinou ontem a reintegração de posse do apartamento na 203 Sul utilizado como depósito e centro de distribuição de queijos da empresa CF Comércio de Alimentos Ltda., da família França, distribuidora da marca Tirolez em Brasília.

Uma liminar foi expedida pela 13ª Vara Federal do DF depois de a Advocacia-Geral da União (AGU) ter protocolado pedido para que o imóvel ocupado irregularmente por um ex-servidor do Ministério do Trabalho fosse devolvido à União.

O ex-funcionário Clineo Monteiro França Netto vale-se de recursos jurídicos desde 1992 para continuar morando no apartamento 303 do Bloco H, apesar de o processo que determina a reintegração já ter transitado em julgado no Supremo Tribunal Federal (STF).
Flagrante da movimentação no Bloco H: queijo para "consumo próprio".
Foto: Luiz Roberto Magalhães/CB.

A movimentação diária de queijos incomoda muitos vizinhos, que se sentem indignados com o fato de o imóvel ter se transformado em um depósito de laticínios. Morador do apartamento 402, Pedro Paulo Menezes, 19 anos, estava revoltado com o que leu ontem no Correio.

“Eles terem dito que todo esse queijo é para consumo pessoal é cômico”, declarou. Pedro contou que, em junho, procurou a Agência de Fiscalização do Distrito Federal (Agefis) para comunicar o problema.

“Fiz uma denúncia à Agefis sobre o fato de um apartamento no meu bloco ser utilizado como ponto comercial. Mas até hoje não tive resposta. Já liguei para saber mais informações sobre a denúncia e eles disseram que não tinham fiscais para averiguar.”

Outro inquilino do edifício, que não quis se identificar, disse que o caso tem um único responsável: “Acho que tudo isso é culpa da União, que não tem pulso para acabar com essa vergonha”, declarou. “Além do comércio, tem o lado do descaso com o patrimônio.

A pior prumada do prédio é a do meio (onde está o apartamento 303). As paredes ficam todas batidas, os elevadores estão riscados. Eles (a família França) não têm comprometimento em preservar, porque o patrimônio não é deles”, ressaltou.

Resposta
O diretor de Fiscalização de Atividades Econômicas da Agefis, Cláudio Caixeta, informou que irá “estudar o caso” e prometeu uma resposta para a próxima semana.

Em relação ao estado de armazenamento e higiene dos queijos que são estocados no imóvel, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) informou que não fiscaliza a cadeia de produção de origem animal.


A atividade cabe à Secretaria de Agricultura, que deve atuar com a Agefis.

Correio Braziliense/Via Jornal Integração

"É costume secular, é cultura nossa jogar a culpa nos outros" : Apatia é o problema da Justiça no País

O problema da Justiça não é dinheiro, não é falta de juiz nem de servidor, não é reforma processual. O problema, segundo Ali Mazloum, juiz há 20 anos, está na apatia da toga. "O juiz, na primeira chance que tem de adiar, de empurrar a audiência, ele faz. Não muda a rotina dos processos porque não quer.

Está acostumado a postular alterações legislativas, pedir mais orçamento, mais pessoal e instalação de mais varas. Grande equívoco."

Ali Mazloum é titular da 7.ª Vara Criminal Federal em São Paulo. Sua rotina são ações sobre crimes tributários, fraudes no INSS, tráfico internacional, descaminho, moeda falsa, roubo contra prédios federais.

Sua pregação vai na contramão da velha cantilena da classe à qual pertence - 10 entre 10 magistrados, quando questionados da lentidão do Judiciário, protestam por mais verbas, retoques profundos dos códigos, novas comarcas.

"É costume secular, é cultura nossa jogar a culpa nos outros", reconhece. "Grandes reformas legislativas? Nada disso é preciso. Mais recursos, mais funcionários? Tudo desnecessário. Quando o Judiciário diz que precisa de mais dinheiro e mais leis ele está jogando a culpa no Executivo. É uma estratégia equivocada."

Em sua repartição, Mazloum implantou o processo cidadão. Muitos colegas repudiaram. Faz três anos. Ele tinha em suas mãos 1 mil ações penais. Hoje são 270. "Os resultados são excepcionais, grande economia para o Judiciário e redução notável do volume de processos. Basta vontade para mudar a máquina do Judiciário.

Bastam pequenas alterações, não precisa de grandes milagres e reformas." A principal conquista do processo que idealizou é que nenhuma demanda supera o prazo de 10 meses. "A ação tem que acabar em 10 meses, nenhum dia a mais."

O rito moroso deu lugar a uma via mais curta. "Quando o réu é citado, no início da ação, ele já fica ciente do dia em que será julgado. Adotamos uma pauta inteligente, concentração de atos processuais sem causar danos ao contraditório e à ampla defesa. É trabalho em equipe, todos os funcionários da vara empenhados.

A audiência é improrrogável. Um dia antes, nosso pessoal faz contato com o acusado, as testemunhas e a vítima, por telefone, e-mail ou MSN para que não faltem. Redesignar data apenas em último caso, excepcionalmente. Evita os intermináveis deslocamentos de oficiais de Justiça."

Mazloum sustenta que "o processo é feito para inocentes, não para culpados". "O Estado deve causar o menor prejuízo possível ao réu, reduzir ao máximo a presença do processo na vida dele. O processo é um instrumento de interlocução entre o acusado e o Estado, não é instrumento de punição, espada na cabeça do réu. Acusado e Estado, acusação e defesa, devem estar em pé de igualdade. Obrigações, direitos e deveres para ambos os lados."

Paradigmas.
"O gasto que o contribuinte tem com o sistema de Justiça é excessivo e por um serviço ineficaz, porque depois de muitos anos de espera não pode ser um bom serviço. Estou falando de quebra de paradigmas, de ruptura com uma cultura arcaica que permeia o processo."

Na ponta do lápis, anota o juiz, a 7.ª Vara Federal Criminal, em 2007, tinha um acervo de 1 mil ações penais, com duração média de 4 anos. O custo de cada processo era de R$ 2.150, o que gerava despesa mensal de R$ 44,79 por processo, "sendo 70% em salários e 30% em insumos".

"Dinheiro gasto em papel, diligências, horas/trabalho, equipamentos", aponta. "O maior custo é com salários dos funcionários. A média salarial da Justiça Federal é muito alta. O valor mínimo de remuneração é R$ 6 mil. Juiz, procurador, diretor de secretaria e oficial de Justiça ganham bem mais."

O total da despesa era de R$ 2,15 milhões ao longo dos quatro anos, ou custo/mês de R$ 44.791,67 por processo, "pagos pela sociedade por um péssimo serviço público em razão das prescrições, demora, injustiças". Com o processo cidadão, ele ressalta, verificou-se redução de 40% do custo. O preço unitário do processo passou para R$ 1.892.

Custo mensal, ao longo dos quatro anos, de R$ 39,41.Com as novas práticas, houve redução do número total de ações - 270 feitos atuais. "A economia é de 82%", estima. "Falar em mudanças no Judiciário é algo quase proibido", adverte Ali Mazloum. "Salvo se estiver embutida a ideia de que qualquer mudança deve partir de grandes alterações."

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo