"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

novembro 01, 2011

"U$" QUATRO PATA$, O CÂNCER "DELE$" E DOS OUTROS.



O ataque de ontem contra a repórter da TV Globo, mesmo isolado, deve ser entendido num contexto. Um certo ambiente de glamurização da agressividade e da violência, gratuitas ou não. Pouco a pouco, tenta-se legitimar o ato de coagir, para impor fatos consumados


Uma jornalista da TV Globo foi vítima de violência física e impedida de continuar a entrada ao vivo no telejornal, quando reportava em rede nacional sobre o tratamento médico do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, diagnosticado no sábado com câncer de laringe.

Foi um fato isolado?
Produto apenas da estupidez individual? Talvez.
Se foi ou não, tanto faz, trata-se de matar o problema na origem.


O Brasil é uma democracia, e jornalistas — como outros profissionais — devem ter garantido o direito de trabalhar em segurança.

Independentemente da área de atuação, do veículo que os emprega ou da linha editorial do material jornalístico que produzem.

Há certos limites na vida em civilização.
A proteção absoluta à segurança física dos jornalistas no exercício profissional é um limite. Quando se cede à tentação de relativizar esse princípio, as coisas estão a caminho de piorar, e muito.


Pouco a pouco, tenta-se legitimar o ato de coagir pela força, para impor fatos consumados. Na política ou fora dela. É mais rápido e mais fácil. E mais truculento.

E dá bem menos trabalho do que usar a inteligência ou a capacidade de persuasão.
Em vez de gastar tempo tentando convencer de que você está certo, criar por meio da mobilização violenta de grupos constrangimentos insuperáveis, a não ser que o constrangido reaja na mesma moeda.


No âmbito da política, é até possível discutir a legitimidade dessa forma de expressão, quando se vive sob uma ditadura.

Mas numa democracia?
Qual é o sentido disso?
Qual é a mensagem do manifestante que no Estado democrático de direito esconde o rosto com um pano e vai entrincheirar-se?
Ou sai lançando pedras e coquetéis molotov?


Pois a raiz dos fenômenos é a mesma.

O Estado democrático de direito é uma conquista a preservar. Nas relações político-sociais e também nas individuais. E ele garante a liberdade até o ponto em que alguém não usa essa liberdade para suprimir o mesmo direito de outro.
Simples assim.


Aliás, nunca houve época em que o trabalho jornalístico estivesse tão exposto à crítica, à fiscalização. E tudo em tempo real. O que é ótimo. Especialmente para os jornalistas, submetidos hoje a um eficientíssimo controle de qualidade.

Não gostou da matéria?
Não gosta do veículo?
Ataque nas redes sociais, na web 2.0, promova campanhas de boicote, faça o que bem entender.

Mas não atravesse a linha vermelha da liberdade de expressão e do respeito à integridade alheia.


A democracia garante também o direito de ir e vir, de participar ou não de movimentos políticos e sociais, entre outras prerrogativas. Infelizmente, parece que vamos desenvolvendo certa tolerância a reconhecer como democráticas as tentativas violentas de suprimir esses e outros direitos.

Está na hora de acordar. Ou já passou da hora.

Opção
Não escrevo às segundas no Correio, então vai aqui a mensagem, com atraso. Boa e rápida recuperação ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Que derrote o câncer e volte à vida normal.

Cânceres podem ser enfrentados com sucesso. Um bom exemplo foi o vice-presidente José Alencar, cuja dignidade e valentia na doença recolheram respeito e admiração maciços.

A ponto de nunca, jamais, os possíveis cenários decorrentes dos diferentes desdobramentos clínicos do câncer de Alencar terem sido objeto do trabalho jornalístico.

Ou da especulação jornalística.

É um modus operandi de que gosto.
E que pretendo seguir. Espero que você, leitor ou leitora, compreenda e também respeite essa minha opção.


Intolerável :
Alon Feuerwerker/Correio Braziliense

NADA E COISA NENHUMA, JEITO NO JEITINHO E JOGO DE CENA PARA QUEM NÃO TE CONHECE QUE TE COMPRE : Faltam fiscais e sobram processos

A determinação expressa da presidente Dilma Rousseff de devassar convênios com organizações não governamentais (ONGs) esbarra numa carência crônica do governo que o decreto assinado por ela, sozinho, não resolve: a estrutura de fiscalização dos ministérios para análise das prestações de contas é raquítica, gerando pilhas de casos acumulados.

Uma auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) mostra que, conforme a pasta, cada servidor tem de dar conta de mais de 300 processos com prazo vencido.

O TCU levantou o número de funcionários disponíveis para avaliar a regularidade da aplicação das chamadas transferências voluntárias, celebradas pelo governo por meio de convênios e termos de parceria, não só com ONGs, mas com prefeituras, estados e outros entes públicos.

Aprovada em novembro de 2011, a auditoria mostrou que havia 1.061 servidores para a função, mal distribuídos.

Só o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), autarquia ligada ao Ministério da Educação (MEC), acumulava 15,4 mil prestações de contas, cujos repasses somavam R$4 bilhões, sem parecer sobre a regularidade.

Havia, pendentes, 173 casos por fiscal.
O Fundo Nacional de Assistência Social, de responsabilidade do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, estava em situação pior:
347 casos para cada servidor analisar.

No ranking, surgem em seguida o Fundo Nacional de Segurança Pública, do Ministério da Justiça (126 processos por funcionário); o Ministério do Turismo (92); a Fundação Capes, do MEC (74); e a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), do Ministério da Ciência e Tecnologia (43).

O levantamento contemplou os 13 órgãos com os maiores passivos do governo, que armazenam 89% dos convênios e parcerias sem análise. Juntos, tinham 44,4 mil processos na prateleira, cujos valores alcançavam R$16 bilhões.

O relatório frisa que, devido a falhas do Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal (Siafi), o acúmulo pode ser maior. E aponta disparidades. Se em alguns órgãos a pilha de processos por servidor chega às centenas, em outros não passa de cinco, caso do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).

A Presidência da República informou que a devassa caberá a cada ministério. Mas eles podem pedir reforço à Controladoria Geral da União (CGU). Questionado, a CGU explicou que está avaliando como poderá ajudar as demais pastas, se acionado. Hoje, as equipes atuam no limite.

- O orçamento da CGU demonstra que o governo não tem capacidade de fazer esse tipo de devassa. Mas compreendo a presidente Dilma. O que ela quer é se antecipar ao surgimento de novas denúncias - diz o sociólogo e cientista político da Universidade de Brasília (UnB), Leonardo Barreto, acrescentando que o controle de convênios e parcerias nunca foi prioridade.

O decreto determina que os ministérios avaliem a regularidade da execução dos convênios, contratos de repasse e termos de parceria celebrados até 16 de setembro com entidades sem fins lucrativos. Eles têm 30 dias para fazê-lo, período em que, com exceções, estão suspensos os pagamentos a essas entidades.

Na prática, a análise já é obrigatória em 60 dias após a entrega das prestações de contas, determina o Tesouro Nacional.

A devassa exclui estados, prefeituras e órgãos públicos, cujos convênios são maioria e responsáveis pelos maiores desvios.
Neste primeiro semestre, o dinheiro cobrado pela União desses entes chega a R$690 milhões, contra R$266 milhões das ONGs.

Fábio Fabrini O Globo