"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

março 25, 2012

GARANTIA DE IMPUNIDADE ! LENTA EM PUNIR, ÁGIL EM PERDOAR : Os próprios réus pedem a antecipação do julgamento.

A Justiça fluminense demorou 15 anos para condenar o inspetor da Polícia Civil Hélcio Augusto de Andrade à perda do cargo público.

A ação de improbidade administrativa contra o policial foi ajuizada pelo Ministério Público em 1995, mas a decisão final só saiu em 2010, quando era tarde demais.

Hélcio já estava aposentado e não precisou cumprir a pena. Acusado de enriquecimento ilícito, ele movimentou mais de US$5 milhões em créditos não identificados em suas contas bancárias entre os anos 1980 e 1990, período em que trabalhou no Detran.


Apesar do desfecho pífio, a ação de improbidade movida contra Hélcio foi uma dos poucas a chegar ao fim no Tribunal de Justiça do Rio.

Vinte anos após o início da vigência da Lei de Improbidade Administrativa, que pune políticos e servidores envolvidos em desvio de dinheiro público, apenas 70 dos 1.209 processos no estado (6% do total) tiveram condenação com trânsito em julgado - quando já não cabe mais recurso à decisão. Outros tribunais do país exibem a mesma dificuldade.

O Tribunal amazonense registra apenas uma ação com condenação definitiva. Em Pernambuco, nove. Na Bahia, 13 casos.


Rio tem 3.285 réus por corrupção

Os números, retirados do Cadastro Nacional de Improbidade Administrativa do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), revelam a dificuldade do Judiciário brasileiro em punir a corrupção e recuperar o dinheiro.

No Estado do Rio, a soma dos valores das 1.209 causas represadas representa R$4,6 bilhões (R$1 bilhão em valores desviados mais a aplicação de multas contra os gestores, que podem chegar a cinco vezes o total do prejuízo).
A quantia corresponde a todos os gastos previstos pelo governo estadual para a área de Saúde este ano.


Entre pessoas físicas e jurídicas, o Rio tem 3.285 processados por corrupção. Há casos de réus respondendo a 20 ações. Na busca de um diagnóstico, o CNJ investiga desde o mês passado a vagarosidade do Estado do Rio.

Uma das hipóteses é a complexidade da lei, que determina a notificação prévia de todos os envolvidos antes da instauração do processo. Esse primeiro passo, dependendo do número de pessoas, pode levar anos.

A outra hipótese investigada é uma demasiada aproximação de magistrados às esferas do poder.


- Não tiro desses dados ilação negativa, mas reconheço que os estados do Sul têm rigor maior com os atos de improbidade administrativa, principalmente a magistratura de primeiro grau, mais beligerante. No Rio, em geral, há um afrouxamento da conduta ética. Certas situações são entendidas como normais. Isso leva a esse tipo de sentença complacente com os erros administrativos - lamenta o desembargador aposentado Marcus Faver, ex-presidente do TJ-RJ e integrante da Comissão de Ética Pública Estadual (Cepe) do governo fluminense.

De acordo com o cadastro do CNJ, 574 casos tiveram condenação definitiva na Justiça gaúcha; 305, em Santa Catarina; e 429, no Paraná. Mas o campeão de condenações é São Paulo, com 1.844 casos.

Para conhecer o outro lado da lei de improbidade, basta cruzar a divisa entre São Paulo e Rio. Em Itatiaia (RJ), a 183 quilômetros da capital, um caso de impunidade tira o sono do Ministério Público.

Em apenas três meses de trabalho (entre junho e agosto do ano passado), logo após assumir o cargo interinamente, o juiz Flávio Pimentel de Lemos Filho, da Vara Única do município, julgou extintas, sem análise do mérito, 17 das 23 ações de improbidade movidas pelo MP contra o ex-prefeito Almir Dumay (1997-2004).


A lista de denúncias contra Dumay é uma espécie de abecedário do mau gestor. Irregularidades em obras públicas, contratação ilegal de serviços de transporte, aquisição suspeita de medicamentos, afastamento de servidores sem justa causa, modificação da data de pagamento da folha e rejeição de contas estão entre os atos de improbidade levados às barras da lei.

Para livrar Dumay, o juiz alegou que decisão tomada pelo Supremo Tribunal Federal em 2007 considerava que os agentes políticos, por estarem regidos por normas especiais de responsabilidade, não responderiam por improbidade administrativa.

A essa altura, porém, a questão já estava pacificada no TJ do Rio:
a decisão só deveria alcançar agentes políticos com foro especial, como ministros de Estado, o que não era o caso do ex-prefeito.


Dumay, contudo, não foi o único político favorecido com decisões de Flávio Pimentel. Em 2010, enquanto respondia interinamente pela Vara Única de Porto Real, cidade vizinha a Itatiaia no Vale do Paraíba, o juiz arquivou ação de improbidade ajuizada contra o prefeito da cidade, Jorge Serfiotis.

Ao tomar a decisão, ele ignorou um pedido do MP para que se declarasse impedido de julgar a causa. Isso porque a mulher do juiz, a advogada Ana Cristina Silva de Lemos, ocupava cargo de confiança na Prefeitura de Porto Real. Na época, era da Controladoria. Hoje, está lotada no núcleo jurídico.

Enquanto é lenta para condenar o mau gestor, a Justiça mostra agilidade na hora de inocentá-lo.

Em 2009, quando ocupava interinamente a 2 ªVara Cível de Itaguaí, o juiz Rafael de Oliveira Fonseca absolveu o prefeito da cidade, Carlos Busato, o Charlinho, na ação de improbidade que o acusava de dispensa ilegal de licitação na contratação de um jornal. No recurso, acolhido pelo Tribunal, o MP manifestou surpresa pela celeridade do magistrado.


Em Búzios, nenhum réu político punido

Na contramão da rotina da comarca, o juiz chegou a mandar um oficial ao MP, após o expediente forense, para entregar os autos aos promotores junto com um aviso de "urgência no julgamento".

Os próprios réus também surpreenderam o MP ao pedir, ao contrário da recorrente estratégia de demora, ao contrário da recorrente estratégia de demora, a antecipação do julgamento.


Outro caso polêmico envolve a Comarca de Búzios.
Levantamento sobre as ações civis e de improbidade na cidade revela que, da caneta do juiz João Carlos de Souza Correa, titular da 1ª Vara Cível, nunca saiu uma única condenação em 14 ações propostas contra políticos locais.

Chico Otavio O Globo

SUJO E MISERÁVEL ! A CASTA DE SOMÍTICOS : No Senado, plano de saúde sem limites para ex e atuais senadores

O Senado é pródigo em benefícios a seus parlamentares. Além da verba indenizatória de R$15 mil e do direito de contratar até 72 servidores, os senadores e seus dependentes têm direito a assistência médica pelo resto da vida.

Levantamento feito pelo GLOBO mostra que reembolsos particulares chegam a ultrapassar R$100 mil por ano e que ex-senadores, mesmo aqueles com privilegiada situação financeira ou no exercício de outros cargos, continuam recorrendo ao Senado para ter suas despesas médicas reembolsadas.


De 2007, a última legislatura, até agora, foram gastos R$17,9 milhões com ressarcimentos por despesas médicas com senadores no exercício do mandato. Com os ex-parlamentares, a conta chegou a R$7,2 milhões. E o detalhe é que ninguém precisa pagar nada pelo benefício.

Ex-parlamentares também pediram reembolsos

Os parlamentares no exercício do mandato não têm um teto para o gasto, bastando apenas apresentar notas, caso optem por médicos e clínicas não conveniadas.

Para aqueles que não têm mais cargo, mas permaneceram pelo menos 180 dias corridos como senador - caso dos suplentes - o teto anual é de R$32.958,12. Mas o valor nem sempre é respeitado.

Ainda há vários casos de deputados e prefeitos que, depois de assumirem essas funções públicas, continuaram apresentando a fatura ao Senado. É o caso do ex-prefeito de Porto Alegre José Fogaça.

Ele foi senador entre 1995 e 2002 e esteve à frente da prefeitura entre 2005 e 2010.

Nesse período, porém, pediu ressarcimentos. Apresentou notas que somam R$12.976 e recebeu as restituições. O GLOBO telefonou para a casa dele, mas sua filha informou que ele não estava.


O limite de R$32.958,12 é um parâmetro que não é levado a sério pelo Senado. O ex-senador Moisés Abrão Neto (PDC-TO) foi reembolsado em 2008 em R$109.267 por despesas médicas - o triplo permitido. Divaldo Suruagy (PMDB-AL), que exerceu o mandato entre 1987 e 1994, recebeu, em 2007, R$41.500 por despesas odontológicas.

A esse mesmo tipo de tratamento submeteu-se a esposa do ex-senador Levy Dias (DEM-MS). Ela gastou, de uma só vez, em 2008, R$67 mil com tratamento dentário. A assessoria de imprensa do Senado informou que a Mesa Diretora é responsável por autorizar gastos acima dos fixados quando acha necessário.

Alguns ex-senadores parecem seguir à risca o valor fixado em R$32.958,12 e apresentam faturas no valor exato, incluindo os centavos.
Agiram dessa maneira os ex-senadores Lúdio Coelho, em julho de 2009,
Levy Dias, em julho de 2010,
Carlos Magno Duque Barcelar, em setembro de 2011,
e Antonio Lomanto Júnior, também em setembro do ano passado.


Embora milionários, outros ex-senadores não se intimidam em apresentar faturas para o Senado pagar. João Evangelista da Costa Tenório (PSDB-AL), que em 2007 assumiu a vaga de Teotônio Vilela, eleito governador de Alagoas, é usineiro naquele estado e dono de emissora de TV. No ano passado foi ressarcido em R$25.859.

Roberto Cavalcanti (PMDB-PB), que sucedeu a José Maranhão quando este assumiu o cargo de governador da Paraíba em 2008, é dono do Sistema Correio de Comunicação. Mas em novembro do ano passado recebeu R$1.460 de restituição do Senado.

Na semana passada, o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), durante discurso sobre o tema da Campanha da Fraternidade deste ano, que trata da saúde pública, disse que a universalização da saúde ainda é um desafio para o país.

No Senado, ela é universal e irrestrita para os seus.


Chico de Gois O Globo