"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

dezembro 20, 2012

CADEIA NELES


O pedido de prisão imediata dos réus condenados no processo do mensalão, feito ontem pelo procurador-geral da República, espelha sentimento dominante na sociedade brasileira: 
se foram julgados, exerceram amplo direito de defesa e foram considerados culpados por uma penca de crimes, por que esperar o decorrer de medidas meramente protelatórias para serem levados à cadeia?

Caso o pedido protocolado na noite de ontem por Roberto Gurgel venha a ser aceito pelo ministro Joaquim Barbosa, que, na condição de presidente do Supremo, promete apreciá-lo até amanhã, 11 dos 25 condenados no mensalão irão, desde já, cumprir penas em regime fechado, entre eles José Dirceu. Outros 11 ficarão em regime semiaberto, ou seja, terão de se apresentar para dormir na cadeia, e três receberão penas alternativas.

"Esse esforço magnífico que foi feito pelo Supremo no sentido de prestigiar de forma importantíssima os valores republicanos não pode agora ser relegado aos porões da ineficiência. Não podemos ficar aguardando a sucessão de embargos declaratórios. Haverá certamente a tentativa dos incabíveis embargos infringentes. E o certo é que o tempo irá passando sem que a decisão tenha a necessária efetividade", resumiu Gurgel.

Parece claro o que o procurador tem em vista: buscar evitar que possíveis delongas acabem por produzir um sentimento de frustração na população, que espera ver punidos os crimes exaustivamente analisados pelo Supremo Tribunal Federal ao longo de mais de cinco anos de apuração e mais de quatro meses de julgamento. Fez-se justiça, cumpra-se a lei.

O que mais se questiona hoje é: será que gente como José Dirceu, Marcos Valério, Delúbio Soares e os banqueiros do Banco Rural vai mesmo para a cadeia? Se depender dos caros advogados contratados pelos criminosos, este dia vai demorar a chegar, ou pode até não chegar nunca, tamanha a sorte de desvios e protelações que a Justiça possibilita.

Até que o acórdão com a sentença seja finalmente publicado, é possível que todo o ano de 2013 tenha transcorrido ou tenhamos até mesmo adentrado 2014. Neste ínterim, como ficará, por exemplo, a situação dos deputados condenados, como o petista João Paulo Cunha? Deixarão as sessões de votação na Câmara às pressas para se recolher à prisão?

A atitude de Gurgel talvez não fosse necessária, ou mesmo se mostrasse excessiva, se os partidários dos mensaleiros estivessem tendo comportamento à altura de quem preza o Estado Democrático de Direito. Mas não é o caso aqui: petistas e assemelhados perseveram na afronta às instituições, contestando tudo o que contraria seu projeto de poder.

Dia sim, dia também, o PT escala alguém para vociferar contra a legítima decisão do Supremo, para pedir o enquadramento da imprensa, para protestar contra as "elites". Sempre dizem agir assim "em nome do povo". Claro está que não aceitam a regra do jogo: se erraram, que paguem por isso.

O pior é que a incitação à desobediência tem inspiração em seu líder máximo. Luiz Inácio Lula da Silva tem aproveitado suas aparições públicas para instigar a militância petista a mostrar os dentes. Coloca-se ele mesmo também à disposição para o embate, como fez ontem num evento com sindicalistas no ABC. Estimula, assim, o confronto e o enfrentamento.

Lula pode até ter suas razões partidárias para agir desta maneira. Mas sua atitude contrasta com a postura que se esperaria de um ex-presidente da República ou de quem um dia se pretendeu um estadista - coisa, claro, que o petista jamais conseguiu ser.

O mais grave é o sinal que a liderança petista emite para seu séquito: 
Vão fundo, porque o crime compensa; basta dizer que tudo é feito "em nome do povo". É o velho "rouba, mas faz" com a roupagem de um governo dito popular, como analisa Carlos Alberto Sardenberg em lúcido artigo n'Globo.

Deve ser com base nesta crença que gente como Gilberto Carvalho, por exemplo, não se importe em usar instalações públicas para fazer proselitismo partidário. O secretário-geral da Presidência utilizou seu gabinete no Palácio do Planalto para gravar mensagem em que conclama a militância petista a botar para quebrar no ano que vem para defender o partido nas ruas, como mostra o 'Painel' da Folha de S.Paulo.

Toda esta recente escalada petista teve origem não só na condenação dos mensaleiros, mas também na descoberta do mais novo escândalo desenrolado em gabinetes presidenciais, o Rosegate, envolvendo uma assessora de toda hora de Lula. Trata-se de um esquema espúrio em que até advogado de suspeito foi nomeado para postos-chave de agências reguladoras para facilitar negócios escusos.

"Um advogado do ex-senador Gilberto Miranda conseguiu ser nomeado ouvidor da Antaq (Agência Nacional de Transportes Aquáticos) e, dentro do governo, foi acionado para defender um projeto de interesse de Miranda - o complexo portuário da ilha de Bagres, em Santos", informa hoje a
Folha. A nomeação foi assinada por Lula em junho de 2010 e o advogado trabalhara para Miranda até janeiro daquele ano.

Se os petistas se sentem tão à vontade para fazer o que bem entendem com os bens públicos, nada mais acertado que o pedido preventivo feito por Roberto Gurgel em relação aos mensaleiros condenados pela mais alta corte de Justiça do país. 

Se nem com a vexaminosa condenação os petistas se convencem de que chegou a hora de parar de parasitar o Estado, o jeito é pô-los logo na cadeia. Talvez assim seus seguidores passem a pensar duas vezes antes de continuar a roubar.

Fonte: Instituto Teotônio Vilela
Cadeia neles 

Roubar pelo povo

 
Intelectuais ligados ao PT estão flertando com uma nova tese para lidar com o mensalão e outros episódios do tipo: seria inevitável, e até mesmo necessário, roubar para fazer um bom governo popular.

Trata-se de uma clara resposta ao peso dos fatos. Tirante os condenados, seus amigos dedicados e os xiitas, ninguém com um mínimo de tirocínio sente-se confortável com aquela história da "farsa da mídia e do Judiciário".

Se, ao contrário, está provado que o dinheiro público foi roubado e que apoios políticos foram comprados, com dinheiro público, restam duas opções: ou desembarcar de um projeto heroico que virou bandidagem ou, bem, aderir à tese de que todo governo rouba, mas os de esquerda roubam menos e o fazem para incluir os pobres.

Vimos duas manifestações recentes dessa suposta nova teoria. Na "Folha", Fernanda Torres, em defesa de José Dirceu, buscou inspiração em Shakespeare para especular: talvez seja impossível governar sem violar a lei.

No "Valor", Renato Janine Ribeiro escreveu duas colunas para concluir: comunistas revolucionários não roubam; esquerdistas reformistas roubam quando chegam ao governo, mas "talvez" tenham de fazer isso para garantir as políticas de inclusão social.

Tirante a falsa sofisticação teórica, trata-se da atualização de coisa muito velha. Sim, o leitor adivinhou: o pessoal está recuperando o "rouba mas faz", criado pelos ademaristas nos anos 50. Agora é o "rouba mas distribui".

Nem é tão surpreendente assim. Ainda no período eleitoral recente, Marilena Chauí havia colocado Maluf no rol dos prefeitos paulistanos realizadores de obras, no grupo de Faria Lima, e fora da turma dos ladrões.

Fica assim, pois: José Dirceu não é corrupto, nem quadrilheiro - mas participou da corrupção e da quadrilha porque, se não o fizesse, não haveria como aplicar o programa popular do PT.

Como se chega a esse incrível quebra-galho teórico? Fernanda Torres oferece uma pista quando comenta que o PT se toma como o partido do povo brasileiro. Ora, segue-se, se as elites são um bando de ladrões agindo contra o povo, qual o problema de roubar "a favor do povo"?

Renato Janine Ribeiro trabalha na mesma tese, acrescentando casos de governos de esquerda bem-sucedidos, e corruptos. Não fica claro se são bem-sucedidos "apesar" de corruptos ou, ao contrário, por serem corruptos. Mas é para esta ultima tese que o autor se inclina.

Não faz sentido, claro. Começa que não é verdade que todo governo conservador é contra o povo e corrupto. Thatcher e Reagan, exemplos máximos da direita, não roubavam e trouxeram grande prosperidade e bem-estar a seus povos. Aqui entre nós, e para ir fundo, Castello Branco e Médici também não roubavam e suas administrações trouxeram crescimento e renda.

Por outro lado, o PT não é o povo. Representa parte do povo, a majoritária nas últimas três eleições presidenciais. Mas, atenção, nunca ganhou no primeiro turno e os adversários sempre fizeram ao menos 40%. E no primeiro turno de 2010, Serra e Marina fizeram 53% dos votos.

Por isso, nas democracias o governo não pode tudo, tem que respeitar a minoria e isso se faz pelo respeito às leis, que incluem a proibição de roubar. E pelo respeito à opinião pública, expressa, entre outros meios, pela imprensa livre.

Por não tolerar essas limitações, os partidos autoritários, à direita e à esquerda, impõem ou tentam impor ditaduras, explícitas ou disfarçadas. Acham que, por serem a expressão legítima do povo, podem tudo.

Assim, caímos de novo em velha tese: os fins justificam os meios, roubar e assassinar.

Renato Janine Ribeiro diz que os regimes comunistas cometeram o pecado da extrema violência física, eliminando milhões de pessoas. Mas eram eticamente puros, sustenta: gostavam de limusines e dachas, mas não colocavam dinheiro público no bolso. (A propósito, anotem aí: isto é uma prévia para uma eventual defesa de Lula, quando começam a aparecer sinais de que o ex-presidente e sua família abusaram de mordomias mais do que se sabe).

Quanto aos comunistas, dizemos nós, não eram "puros" por virtude, mas por impossibilidade. Não havia propriedade privada, de maneira que os corruptos não tinham como construir patrimônios pessoais. Roubavam dinheiro de bolso e se reservavam parte do aparelho do estado, enquanto o povo que representavam passava fome. Puros?

Reparem: na China, misto de comunismo e capitalismo, os líderes e suas famílias amealharam, sim, grandes fortunas pessoais.

Voltando ao nosso caso brasileiro, vamos falar francamente: ninguém precisa ser ladrão de dinheiro público para distribuir Bolsa Família e aumentar o salário mínimo.

Querem tudo?

Dilma consegue aprovar a MP que garante uma queda na conta de luz. O Operador Nacional do Sistema Elétrico diz que haverá mais apagões porque não há como evitá-los sem investimentos que exigiriam tarifas mais caras.

Ou seja, a conta será mais barata, em compensação vai faltar luz. 
Carlos Alberto Sardenberg O Globo 

brasil maravilha dos FARSANTES : Inflação dispara e assusta governo

Prévia do indicador oficial de preços, o IPCA-15 tem elevação de 0,69% em dezembro e de 5,78% em 2012, longe da meta oficial de 4,5%

O governo recebeu com preocupação o resultado do IPCA-15 de dezembro, de 0,69%, que confirmou reajustes disseminados de preços por toda a economia. A taxa, divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), ficou acima tanto do 0,54% de novembro, quanto do 0,56% do mesmo período do ano passado.

No acumulado do ano, a prévia do índice oficial de inflação ficou em 5,78%, abaixo dos 6,56% de 2011, mas muito longe dos 4,5% definidos como meta pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). Foi o terceiro ano seguido em que o indicador ficou distante do objetivo perseguido pelo Banco Central (BC).

Alimentos, com alta de 0,97% e serviços pessoais, que tiveram elevação de 1,10%, foram os dois grupos de produtos que mais contribuíram para o índice. No entanto, Luiz Otávio de Souza Leal, do Banco ABC Brasil chamou a atenção para o fato de que itens importantes como habitação (0,74% de alta) e transportes (0,71%) também deram forte contribuição para acelerar a carestia.

Ou seja, a inflação está presente em todos os elementos que compõem o IPCA-15 e já não há mais a desculpa para o BC dizer que o país está tendo que acomodar choques de preços dos alimentos, movimento que começou com a forte seca deste ano nos Estados Unidos.

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, procurou minimizar a importância da aceleração do indicador em dezembro. “Todo fim de ano a inflação sobe. Mas a de 2012 será menor que a de 2011”, afirmou. Já os consumidores se assustam com o preço dos alimentos expostos nas gôndolas dos supermercados.


A aposentada Ivete Santana, 67 anos, disse que os gastos semanais com a alimentação da família dobraram, passando de R$ 80 para R$ 160 nos últimos meses. “Apesar das promoções, tudo continua muito caro”, afirmou.

Acostumada a pagar R$ 2,80 pelo quilo do maracujá, Ivete conta que hoje a mesma quantidade não sei por menos de R$ 6,70. “As frutas só tem preço. A qualidade passa longe”, lamentou. O preço das frutas foi um dos destaques de alta em dezembro, com reajuste médio de 1,27%, ao lado da carne de frango (4,16%) e do leite (2,03%). A aposentada se queixou também da alta do preço do arroz. “Antes eu pagava R$ 7, às vezes R$ 8, pelo saco de cinco quilos. Agora, custa R$ 12”, disse.

Tendência
No caso das despesas pessoais, as maiores elevações foram a dos cigarros (2,66%) e de empregados domésticos (0,82%). Do lado dos transportes, o item passagens aéreas foi o destaque, com variação de 17,08%. No entender de Leal, a trajetória da inflação parece ser de alta, seja qual for o ângulo utilizado para análise.

“O resultado de dezembro está contaminado pelo impacto das passagens aéreas, mas, considerando que o IPCA-15 fechou o ano em 5,78%, não dá para ficar aliviado com o fato desse número ser menor do que os 6,56% de 2011”, disse.

Já o economista Rafael Leão, da Austin Rating, é mais otimista. “Teremos uma inflação mais baixa no ano que vem, mesmo com atividade econômica maior. A alta no setor de alimentos não deve se repetir, já que o salário mínimo não terá reajuste tão forte”, disse.

» Vilões do ano
Veja os maiores reajustes
(Em %)
Feijão mulatinho 66,18
Batata inglesa 50,78
Alho 49,67
Feijão preto 44,38
Mandioca 43,72
Arroz 37,00
Passagem aérea 25,92
Óleo de soja 23,47
Ovo de galinha 19,08
Cerveja 13,78
Café moído 12,88
Empregado doméstico 12,75
Pão francês 12,00
Médico 10,49
Plano de saúde 7,99

Fonte: IBGE

Correio Braziliense

E NO brasil marvilha dos FARSANTES DA POLÍTICA ECONÔMICA E OUTRAS DE MUITO GERUNDIO E POUCO VERBO : BC reduz projeção de crescimento da economia de 1,6% para 1%


O Banco Central reduziu sua previsão para o crescimento da economia brasileira neste ano a 1%, ante 1,6%. O BC também piorou sua perspectiva para inflação em 2012, embora tenha melhorado ligeiramente para o ano que vem.

Segundo o Relatório Trimestral de Inflação da autoridade monetária, divulgado nesta quinta-feira, a inflação oficial, medida pelo IPCA, ficará em 5,7% neste ano pelo cenário de referência, ante previsão anterior de 5,2%, e em 4,8% em 2013, abaixo das contas anteriores, de 4,9%.

A meta de inflação no Brasil é de 4,5%, com dois pontos percentuais de margem, para mais e para menos.

EM REPÚBLICA TORPE, GOTAS DE SINCERIDADE?


Como rachaduras em um gigantesco reservatório de cinismo, começaram a pingar gotas de sinceridade em áreas distintas do governo. O mais recente surto de realismo de uma autoridade, verbalizando o que a sociedade já sabia, mas o discurso oficial não reconhecia, também deverá se confirmar como contribuição para o país enfrentar seus problemas na dimensão que eles têm.

Depois de o Planalto repreender várias vezes os que confirmavam a existência de apagões ou apaguinhos, o diretor-geral do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), Hermes Chipp, acabou indo além da inútil batalha semântica e atestou que a malha de transmissão requer, sim, investimentos bilionários para ser robusta de fato. 
E mais: 
o caixa federal não suporta a tarefa de dar fornecimento seguro de eletricidade para todos.

Isso requer, na avaliação do responsável pela estabilidade da distribuição das cargas, custos adicionais à conta de luz. A declaração veio no mesmo momento que a própria presidente Dilma Rousseff faz tudo pela modicidade tarifária e depois de transcorrer ao longo do ano quase 90 “perturbações do sistema”, um dos vários eufemismos adotados no lugar de blecautes.

Outros corações sinceros se abriram no poder. O ministro da Educação, Aloizio Mercadante, tem declarado que a dinheirama do pré-sal precisa ter bom uso para não engordar a máquina pública, afirmação memorável para um líder petista. 
Ele também tem discursado em favor de mais qualidade no ensino, sobretudo o fundamental, ressaltando que a maior concessão de canudos universitários não significa necessariamente um país mais instruído. Nota 10. 
A mesma vale para a presidente quando diz que o ensino médio tem “números estarrecedores” e falta mais português e matemática na sala de aula.

Muito antes de o espírito natalino bater às portas da Esplanada dos Ministérios, a onda de declarações verdadeiras começou com o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, ao se referir ao complexo prisional brasileiro. “Prefiro morrer a ir preso”, declarou. O debate em torno da falência de décadas das cadeias ganhou o reforço de que precisava.

Falta ouvirmos “revelações” no que se refere à independência do Banco Central, às obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) etc. etc. etc.

Sílvio Ribas Correio Braziliense

O STF FAZ HISTÓRIA

 
O julgamento da Ação Penal 470 pelo Supremo Tribunal Federal (STF) constitui-se, desde já, num marco histórico que abre para o Brasil a perspectiva de um significativo avanço institucional, representado pela consolidação do estado de direito, muito particularmente no que diz respeito ao princípio de que todos são iguais perante a lei.

Esta é a pedra de toque, a razão principal da impressionante mobilização da opinião pública em torno do STF nesses quatro meses e meio em que, com absoluta transparência e respeito à lei penal e aos preceitos constitucionais, os ministros se dedicaram ao exaustivo escrutínio disso que se confirmou como o maior escândalo político da história do País.

Ao final, mesmo levando em conta que do ponto de vista processual há ainda um caminho a percorrer antes da publicação do acórdão que produzirá os efeitos penais do julgamento, todos nós brasileiros podemos nos sentir orgulhosos: foi dado um passo importante para resgatar o Brasil do histórico atraso institucional representado pelo estigma da impunidade dos poderosos.

A construção da democracia é um processo permanente, complexo e tortuoso porque deve perseguir a unidade do bem comum na diversidade dos interesses conflitantes que caracterizam qualquer corpo social. A evolução desse processo, no modelo preconizado por Montesquieu e adotado pela maioria dos Estados ocidentais modernos, está condicionada à observância de fundamentos como o da separação dos poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário) e o de que todos são iguais perante a lei.

No Brasil, é triste mas necessário convir, tais fundamentos nunca foram levados muito a sério. E as consequências disso são particularmente graves no que diz respeito à igualdade perante a lei – o que tem tudo a ver com o desempenho do Judiciário, mas também, quando se trata de investigação criminal, de instituições subordinadas ao Executivo, como a polícia e o Ministério Público.

O fato de a investigação criminal do mensalão merecer elogios gerais pela eficiência indica que essa qualidade nunca foi exatamente a regra. Por outro lado, o próprio julgamento da Ação Penal 470 demonstra que a legislação brasileira, em particular a processual penal, abre brechas que permitem a procrastinação indefinida dos feitos.

Tudo isso tem contribuído para que a opinião que a sociedade brasileira tem da Justiça seja impregnada por alta dose de desconfiança: a Justiça tenderia a proteger os interesses dos poderosos, aqueles que se colocam no topo da pirâmide social, deixando a dura lex para ser aplicada aos cidadãos comuns.

Em certa medida, é uma verdade que não se explica necessariamente pela eventual má-fé de legisladores, investigadores e juízes, mas pela complexidade do ordenamento jurídico penal, cujos meandros são geralmente acessíveis apenas a bancas advocatícias muito bem remuneradas.

Foi, portanto, o compreensível sentimento de desconfiança na ação da Justiça que o já histórico julgamento do mensalão conseguiu abalar, provocando o despertar de uma consciência cívica que nos últimos anos vinha sendo mantida em estado ciclotímico graças a uma hábil e deliberada manipulação do sentimento popular – ora excitado com as conquistas econômicas, ora passivo ante as transgressões aos princípios republicanos -, tudo ao sabor dos interesses dos detentores do poder político.

Desprezando o sentimento nacional de regozijo com a condenação dos mensaleiros, Lula, o Grande Manipulador, revelou com muita clareza exatamente o que pensa sobre consciência cívica ao declarar sobre o julgamento, então a meio caminho, que “o povo não está preocupado com isso, mas em saber se o Palmeiras vai cair para a segunda divisão e se o Haddad vai ganhar a eleição”.

O Palmeiras caiu e Haddad ganhou, mas Lula não percebeu quais eram as preocupações do povo.
 
 Hoje, diante das evidências que o contrariam, Lula mantém as barbas de molho, certamente por saber que a sociedade brasileira já tem posição formada em relação ao destino que merecem os poderosos que se julgam “mais iguais” perante a lei.

Esse é o primeiro passo a ser comemorado no sentido da moralização dos costumes políticos que os ministros do STF balizaram com o julgamento da Ação Penal 470.


Estadão

UM DELINQUENTE CACHACEIRO INIMPUTÁVEL ? EM REPÚBLICA DE TORPES TEM "GUARIDA"


Eis a palavra de ordem:
Luiz Inácio Lula da Silva paira acima da Justiça, e o seu detrator, o publicitário Marcos Valério, é um desqualificado.

Desde que, na semana passada, este jornal revelou que o operador do mensalão, em depoimento à Procuradoria-Geral da República, em setembro último, acusou o ex-presidente de ter aprovado o esquema de compra de votos de deputados e de tirar uma casquinha da dinheirama que correu solta à época do escândalo, o apparat petista e os políticos governistas apressaram-se a fazer expressão corporal de santa ira:

“Onde já se viu?!”.

Apanhado em Paris pela notícia da denúncia, Lula limitou-se a dizer que era tudo mentira, alegou indisposição para não comparecer a um jantar de gala oferecido pelo presidente François Hollande à colega brasileira Dilma Rousseff e, no dia seguinte, fugiu da imprensa, entrando e saindo dos recintos pela porta dos fundos – algo não propriamente honroso para um ex-chefe de Estado que se tem em altíssima conta.

Em seguida, usando como porta-voz o secretário geral da Presidência, Gilberto Carvalho, declarou-se “indignado”. Outros ministros também se manifestaram. Como nem por isso as acusações de Valério se desmancharam no ar, nem o PT ocupou as praças para fulminá-las, os políticos tomaram para si a defesa do acusado.

Na terça-feira, um dia depois do término do julgamento do mensalão, oito governadores se abalaram a São Paulo em romaria de “solidariedade” a Lula, na sede do instituto que leva o seu nome.

De seu lado, a bancada petista na Câmara dos Deputados promoveu na sala do café da Casa um ato pró-Lula.

Foi um fracasso de bilheteria:

poucos parlamentares da base aliada (e nenhum senador) atenderam ao chamado do líder do PT, Jilmar Tatto, para ouvir do líder do governo Dilma, Arlindo Chinaglia, que Lula “é (sic) o maior presidente do Brasil”, além de “patrimônio do País”, na emenda do peemedebista Henrique Eduardo Alves, que deve assumir o comando da Câmara em fevereiro.

Não faltaram, naturalmente, os gritos de “Lula, guerreiro do povo brasileiro”.

Já a reverência dos governadores – aparentemente, uma iniciativa do cearense Cid Gomes – transcorreu a portas fechadas. Havia três petistas, dois pessebistas (mas não Eduardo Campos, que se prepara para ser “o cara” em 2014 ou 2018), dois peemedebistas e um tucano, Teotônio Vilela Filho, de Alagoas, autodeclarado amigo de Lula.

Seja lá o que tenham dito e ouvido no encontro, os seus comentários públicos seguiram estritamente a cartilha da intocabilidade de Lula, com as devidas variações pessoais. Agnelo Queiroz, do PT do Distrito Federal, beirou a apoplexia ao proclamar que Valério fez um “ataque vil, covarde, irresponsável e criminoso” a Lula. “Só quem confia em vigarista dessa ordem quer dar voz a isso.”

Não se trata, obviamente, de confiar em vigaristas, mas de respeitar os fatos. Valério procurou o Ministério Público – não vem ao caso por que – para fazer acusações graves a um ex-presidente e ainda figura central da política brasileira. Não divulgá-las seria compactuar com uma das partes, em detrimento do direito da sociedade à informação.

Tudo mais é com a instituição que tomou o depoimento do gestor do mensalão, condenado a 40 anos. Ainda ontem, por sinal, o procurador-geral Roberto Gurgel, embora tenha mencionado o contraste entre as frequentes declarações “bombásticas” de Valério e os fatos apurados, prometeu examinar “em profundidade” e “rapidamente” as alegações envolvendo Lula.

Não poderia ser de outra forma. “Preservar” o ex-presidente, como prega o alagoano Teotônio Vilela Filho, porque ele tem “um grande serviço prestado ao Brasil”, é incompatível com o Estado Democrático de Direito. O que Lula fez pelo País pode ser aplaudido, criticado ou as duas coisas, nas proporções que se queiram.

O que não pode é torná-lo literalmente inimputável. 
Dizer, por outro lado, como fez o cearense Cid Gomes, que Valério não foi “respeitoso com a figura do ex-presidente e com a memória do Brasil” põe a nu a renitente mentalidade que evoca a máxima atribuída ao ditador Getúlio Vargas: “Aos amigos, tudo; aos inimigos, a lei”.

Estadão 
O inimputável