"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

dezembro 15, 2012

Rose e Paulo Vieira tentaram tumultuar julgamento do mensalão, diz revista

Documentos obtidos com exclusividade pela revista Época mostram que a ex-chefe do escritório da Presidência da República em São Paulo, Rosemary Noronha, a Rose, e o diretor da Agência Nacional de Águas (ANA), Paulo Vieira, tentaram tumultuar o processo do julgamento do mensalão.

Em telefonema interceptado pela PF no dia 12 de novembro, ambos tinham por objetivo, ainda, impedir que os condenados pelo Supremo Tribunal Federal (STF) cumprissem suas penas. Na gravação, Vieira pede a Rose apoio do ex-ministro José Dirceu para articulações dele em Brasília e fala sobre uma possível participação de Deus (no caso, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva) na tentativa de melar o julgamento.

Na sexta-feira, o Ministério Público Federal (MPF) denunciou 24 pessoas, entre elas Rose e Vieira, por envolvimento no esquema de elaboração de pareceres fraudulentos de órgãos públicos para beneficiar interesses privados. Formação de quadrilha, corrupção ativa e passiva, falsidade ideológica e tráfico de influência estão entre os crimes que teriam sido cometidos pelo grupo, integrado por 14 funcionários públicos.

A conversa telefônica foi interceptada no dia em que ministros do STF definiam penas dos petistas José Dirceu, José Genoino e Delúbio Soares, principais integrantes do núcleo político do mensalão.

Segundo investigações da Polícia Federal (PF), naquele momento, Vieira; o deputado Valdemar Costa Neto, condenado pelo mensalão; e o empresário e ex-senador Gilberto Miranda movimentavam-se para pressionar os ministros do STF a mudar votos, aliviar penas ou acatar futuros recursos dos réus.

Num dos trechos, Vieira diz que iria protocolar outra questão que eu queria que você (Rose) mostrasse para o JD (José Dirceu). Em um outro momento da conversa, após dizer que não sabia que Dirceu estava dando esse peso todo para o Giba (Gilberto Miranda), Vieira diz que, para tumultuar o julgamento, o melhor peso que tem é o...Deus.

Após ouvir de Rose que Deus não irá fazer absolutamente nada, Vieira diz: as vezes ele tem medo de arrumar confusão, né, Rose?.

Sobre uma possível articulação de Dirceu com o grupo, o diretor da ANA fala: não sei se o JD está com cabeça para mexer com essas coisas. Em seguida, Rose tranquiliza Vieira, dizendo: Vou viajar com ele (José Dirceu) no feriado. Nós vamos para a Bahia. Eu converso bastante com ele.

Na gravação, Vieira chega a dizer que elas não podiam falar essas coisas por telefone, mas continua citando os nomes acima.

O grupo, segundo a PF, também queria nomear um amigo para o STF na vaga aberta pela aposentadoria do ministro Carlos Ayres Britto. Investigações mostram que os irmãos Paulo e Rubens Vieira já se preocupavam com o mensalão em 10 de junho, antes mesmo de o julgamento começar. Na gravação obtida naquele dia, Paulo fala ao irmão que o julgamento é político e que eles (ministros do STF) não vão sair de lá ilesos.

E acrescenta:
Então, o negócio agora é tumultuar o processo. Duas horas depois, o diretor da ANA ligou para Rose, que disse ter almoçado com Dirceu três dias antes e que o ex-ministro fizera uma previsão que seria condenado a quatro anos de prisão.

Um relatório da PF entregue ao STF na quarta-feira passada, no qual a revista Época teve acesso, mostra o trânsito privilegiado do grupo em Brasília. São, ao todo, 18 autoridades que conversavam com integrantes da chamada quadrilha dos pareceres.

Entre os nomes estão o do ministro Luís Inácio Adams, da Advocacia-Geral da União (AGU), o do ministro do STF Dias Toffoli, o deputado Valdemar Costa Neto e o presidente do Senado, José Sarney, e o prefeito de São Paulo Gilberto Kassab, que, segundo a PF, pede a Gilberto Miranda ajuda para uma indicação do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

O esquema de elaboração de pareceres fraudulentos de órgãos públicos foi descoberto em dois anos de investigação da PF em conjunto com o MPF, que resultou na operação Porto Seguro, deflagrada no mês passado.

O Globo