"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

junho 28, 2013

Em outro planeta



O Brasil está indo à lona, mas a presidente da República só quer tratar de um assunto: 
impor um plebiscito que cuidará, entre outras coisas, de definir se o país terá voto distrital misto ou puro, em lista fechada ou não. 


Que planeta Dilma Rousseff pensa que está governando?

Chega a ser surreal que, após a bela manifestação de cidadania demonstrada por milhões de brasileiros nas três últimas semanas, a resposta que o mundo oficial tenha a oferecer seja uma discussão extemporânea e alienada dos reais problemas da nação.


 Soa quase como escárnio ao desejo expresso pelos cidadãos.

Fica claro que o governo e o PT insistem no plebiscito - que pode chegar a custar R$ 2 bilhões, segundo O Globo - porque querem ludibriar a opinião pública e tentar manobrar as massas. É puro diversionismo para desviar o foco dos reais problemas do país, como destacou ontem a oposição em nota oficial assinada por PSDB, PPS e DEM.

Pior ainda, o plebiscito é uma mal disfarçada tentativa dos petistas de impor mudanças que fortaleçam o partido que detém o poder e cerceiem ainda mais as chances das correntes oposicionistas. 


Pretendem fazer isso na lei ou na marra, como mostram movimentos recentes de seus líderes.

Anteontem, Dilma disse a sindicalistas que, com seus "pactos" vazios, quer "disputar a voz das ruas". No mesmo dia, Lula avisou que convocará os movimentos sociais aparelhados nos últimos anos pelo petismo a sair do sofá - ontem mesmo, UNE, UJS e assemelhados começaram a cumprir a ordem, sem muito efeito, porém.

O PT também já ameaça com casuísmos como a redução de prazos para que as mudanças eleitorais tenham validade, hoje de no mínimo um ano. Para tanto, propõe uma emenda constitucional, já que para o partido dos mensaleiros a lei maior do país é apenas um mero detalhe.

De prático, após uma frenética rodada de conversas - em poucos dias nesta semana Dilma teve ter falado com mais gente do que em anos de governo - a presidente disse ontem que encaminhará uma proposta ao Congresso na terça-feira com pontos que pretende ver contemplados no plebiscito. Muito mais adequada, a alternativa do referendo foi rechaçada por ela.

A pauta oficial coincide, surpresa!, com o que prega o PT. 
Os famigerados financiamento público (o seu, o meu, o nosso dinheiro paga as campanhas dos políticos) e voto em lista fechada (o eleitor vota, mas é o partido que escolhe quem vai ou não se eleger), por exemplo, provavelmente estarão lá. 

 O fim da reeleição certamente não estará.

O mais deplorável disso tudo é ver a agenda real do país paralisada por uma discussão que pode até ser importante, mas é absolutamente secundária neste momento. Imagine a dona de casa lá do rincão, em pânico com a inflação e com a escola ruim do filho, tendo que escolher entre um "sim" e um "não" a esquisitices como voto proporcional, voto distrital, voto distrital misto e entre voto em lista aberta ou lista fechada...

O país está indo ladeira abaixo, mas disso não se ouve patavina da presidente da República. Ontem mesmo, o Banco Central divulgou seus prognósticos para os próximos meses: 
a inflação de 2013 vai ser maior que a do ano passado e o crescimento, menor que o até agora previsto. Há quem já aposte numa taxa próxima de zero, com possibilidade até de retração do PIB no fim do ano, como mostra Claudia Safatle na edição de hoje do Valor Econômico.

A agenda real do país não inclui apenas a carestia que corrói os salários. Contempla também a melhoria da péssima saúde pública brasileira, para a qual a resposta de Dilma é a importação de médicos. Note-se que, para mostrar que dão conta da complexidade local, os estrangeiros passarão por uma avaliação de três meses - alguém aí falou nos quase dez anos que um médico brasileiro estuda antes de começar a clinicar?

A lista de problemas reais e dificuldades enfrentadas cotidianamente pelos cidadãos é extensa o suficiente para demonstrar que o governo petista está completamente fora de órbita quando impõe ao país, nesta altura do campeonato, um plebiscito sobre reforma política. Isso é coisa de lunáticos ou, mais provavelmente, de gente muito mal intencionada e que não está nem aí para os brasileiros. 


Ou é farsa ou é golpe.

Este e outros textos analíticos sobre a conjuntura política e econômica
estão disponíveis na página do
Instituto Teotônio Vilela

"A gente não quer só comida". 'Inflação dói, machuca o combate à pobreza'


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Economista brasileiro afirma, antes de palestra na ACRJ, que manifestações em curso pelo país são "oportunidade de ouro" para melhorar o gasto público.

O BC elevou a expectativa de inflação para 6% este ano.
 Qual a consequência disso?

A gente aprendeu, e o povo sabe bem disso, que a inflação reduz o poder de compra das pessoas e aumenta a exclusão pela renda. 
A inflação dói, machuca o combate à pobreza.

Os mais pobres têm menos mecanismos à disposição para se defender da alta de preços. Por isso, temos que perseguir o centro da meta de inflação, de 4,5% ao ano. E quanto mais tempo a economia operar com inflação acima do centro da meta, mais custoso será trazê-la de volta ao centro.

Estamos num ciclo de alta dos juros. 
Isso será suficiente?

Faz todo sentido a resposta que o BC passou a dar quando a expectativa de reversão da inflação não se verificou. 
Mas isso demora a ter efeito e não está claro até onde vai o ajuste. 
A eficácia da política monetária depende, em grande medida, de sinais convergentes no lado fiscal também.

Como isso afeta o crescimento?

Sem fortalecer a credibilidade na luta contra a inflação ficará difícil recuperar a confiança dos investimentos privados. E o Brasil precisa desses investimentos para crescer mais, melhorar sua infraestrutura. 
Mesmo nos períodos de maior crescimento, os investimentos nunca superaram 20% do Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos) brasileiro.

Como o Banco Mundial vê as manifestações pelo país?

A despeito de casos de vandalismo, a manifestação massiva mostra que a população tem consciência do que quer: 
melhor qualidade nos gastos e serviços públicos, contra a corrupção. 
É como a música dos Titãs:
"A gente não quer só comida".

É uma oportunidade de ouro para melhorar o gasto público.

bruno.villas@oglobo.com.br

PARA REGISTRO ! UMA REUNIÃO DE EMERGÊNCIA