"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

agosto 31, 2012

PIB tímido confirma semestre abaixo das expectativas; entenda motivos



De abril a junho, o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro registrou alta de 0,4% sobre o trimestre imediatamente anterior e de 0,5% na comparação anual.

O resultado não surpreendeu analistas, que esperavam uma alta entre 0,3% e 0,5% no segundo trimestre, acima da verificada de janeiro a março, quando o PIB subiu 0,1% na mesma base de comparação, segundo a última revisão do IBGE.

Mais uma vez, a indústria, especialmente a de transformação (responsável por transformar a matéria-prima em bens de consumo ou em itens usados por outras indústrias), foi o principal fator de desaceleração da economia brasileira.

No 2º trimestre, o setor recuou 2,5% em relação aos três primeiros meses deste ano.


Na mesma base de comparação, a agropecuária subiu 4,9%. Já os serviços não demonstraram o mesmo vigor que no 1º trimestre e cresceram 0,7% de abril a junho.

Por outro lado, o impacto das medidas de desoneração fiscal - como a redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para carros determinada em maio, por exemplo - não foi integralmente sentido no resultado do 2º trimestre, especialmente pela ótica da produção, disseram especialistas ouvidos pela BBC Brasil.

Previsão

Com o resultado, o governo aposta suas fichas no segundo semestre de 2012, quando espera uma retomada da economia, sobretudo da atividade industrial, como reflexo dos descontos anunciados até agora e que tiveram suas vigências recentemente prorrogadas.

O ciclo de redução da taxa básica de juros, a Selic, que ma última quarta-feira caiu 0,5 ponto percentual, para 7,5% ao ano, também deverá ajudar na recuperação econômica.

No entanto, apesar de os estímulos fiscal e monetário, dificilmente a economia brasileira crescerá em torno de 3%, como prevê oficialmente o governo, estimam os analistas.

Para eles, o PIB deste ano, já apelidado de 'PIBinho' por muitos, não ultrapassará 2%.

A BBC Brasil ouviu especialistas para selecionar o que deu errado na economia brasileira durante o primeiro semestre deste ano.

Veja abaixo:


1) Agravamento da crise

Como todos os outros países do mundo, a economia brasileira também sentiu os efeitos do agravamento da crise internacional, que vem criando um cenário de incertezas nos mercados globais.

"Na Europa, cresceu o risco de um eventual calote da Grécia, que pode abandonar a zona do euro; os Estados Unidos, por sua vez, ainda têm dificuldade de retomar sua economia e, por fim, a China está vendendo menos, frente a uma menor demanda internacional", afirmou à BBC Brasil Samy Dana, professor de economia da FGV-SP.

"Tudo isso impactou a economia brasileira, porque afeta não só as nossas exportações, como a captação de recursos e a confiança do empresário, que tende a postergar decisões de investimento."

No primeiro semestre deste ano, as exportações brasileiras subiram somente 1,7% em comparação ao mesmo período de 2011.

Já a economia da China, o principal parceiro comercial do Brasil, cresceu 7,6% no 2º trimestre deste ano na comparação com igual período de 2011, o pior desempenho desde o auge da crise financeira.


2) Saturação das medidas de estímulo ao consumo

Ainda que o consumo das famílias tenha proporcionado novo alento à economia, compensando em grande parte as perdas na indústria, as medidas de estímulo fiscal do governo já não são surtem o mesmo efeito de 2008, quando foram a principal "arma" anticrise do governo anterior, e já começam a dar sinais de esgotamento.

Segundo um levantamento da Confederação Nacional do Comércio (CNC), 59,8% das famílias brasileiras já admitem estar endividadas, o maior patamar deste ano e a terceira alta consecutiva.

"Apesar da queda dos juros, os bancos estão cada vez mais temerosos de emprestar. A inadimplência cresceu e as classes C e D já começam a sentir no bolso o peso das dívidas", disse à BBC Brasil gela de Souza Menezes, professora de Finanças do Insper.

"Além disso, o governo errou ao eleger setores que seriam beneficiados por tais vantagens, como o automotivo. O mais correto seria pensar em formas de solucionar a alta carga tributária, por exemplo, muito mais importante nesse momento", acrescentou.


3) Custo Brasil

Em meio à crise internacional e à redução dos juros, o conjunto de entraves aos negócios, o chamado 'Custo Brasil', acabou ganhando maior visibilidade, impactando de forma mais acentuada o crescimento da economia brasileira.

Isso porque, com uma infraestrutura precária, salários em alta e uma baixa produtividade, além de um sistema tributário complexo, os produtos brasileiros perdem competitividade tanto no mercado doméstico - perante os importados - quanto no exterior.

"Apesar da recente valorização do dólar frente ao real, o que, em tese, ajudaria a indústria nacional, o setor não reagiu. O custo unitário do trabalhador brasileiro está em alta enquanto sua produtividade cai, encarecendo o produto final", explicou Rafael Bacciotti, economista da Tendências Consultoria.

Segundo um estudo conduzido pelo Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), foram coincidemente os trabalhadores da indústria os que obtiveram o maior aumento de salário de todos as negociações salariais analisadas no primeiro semestre deste ano, muito por causa do déficit de mão de obra especializada.

O índice de reajustes com ganho real (acima da inflação) alcançou 98% das categorias.

Luís Guilherme Barrucho
BBC Brasil

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