"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

abril 10, 2012

RIO + 20 : FANTASIA RASGADA


Dilma Rousseff levou em sua bagagem aos Estados Unidos um objetivo não explicitado: ganhar o envolvimento de Barack Obama para a Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20. O fórum que deveria debater e apontar novos caminhos para o mundo ruma para o fracasso, atolado em improvisação.

No início do mês, soou o alarme na ONU. Ban Ki-Moon, secretário-geral do organismo, teria feito chegar ao governo brasileiro a preocupação de que a Rio+20 não atraia a atenção devida dos principais chefes de Estado do mundo. A julgar pelos atropelos que se notam na preparação do evento, ele está coberto de razão.

Até agora não é possível saber, por exemplo, nada do que irá acontecer entre os dias 13 e 22 de junho no Rio. Simplesmente porque a programação da conferência não existe ainda - e olha que o encontro estava previsto originalmente para maio, e teve de ser remarcado para não ter de concorrer com as comemorações dos 60 anos de coroação da rainha Elizabeth II...

Indicativo de que não há a menor ideia de aonde se quer chegar é o que acontece com o texto da declaração dos chefes de Estado que resultará da Rio+20. Seu "rascunho zero" foi conhecido em janeiro e tinha 19 páginas. Em março, ganhou nova versão e mais 159 páginas! Tão longas quanto o texto, as discussões prosseguem.

Pessoas e organizações sérias envolvidas com o tema já não escondem a frustração com o que deverá resultar da Rio+20, isto é, quase nada. A única certeza é que, numa prévia do que pode acontecer daqui a dois anos na Copa do Mundo, a cidade provavelmente não conseguirá acolher os visitantes, por falta de vagas em hotéis. Reina o improviso.

"É possível que seja tarde demais para evitar que a reunião a realizar-se no Rio de Janeiro dentro de cem dias faça as deliberações ambientais retroceder ao ponto onde se encontravam em Estocolmo em 1972", analisou o ex-ministro Rubens Ricupero na Folha de S.Paulo recentemente.

O governo brasileiro está perdido no tema. Sem uma agenda consistente voltada à sustentabilidade, atém-se a lançar factoides, como o anúncio, feito neste fim de semana, de critérios "verdes" em licitações públicas. Fato é que as chamadas "compras sustentáveis" já são prática corrente em empresas privadas de todo o mundo, mas são apenas uma gota no oceano da busca pelo equilíbrio econômico, social e ambiental que deve orientar a vida no planeta.

A presidente da República, por sua vez, continua dando sinais de sua total desconexão em relação ao meio ambiente. Durante reunião do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas no Palácio do Planalto, chamou algumas bandeiras ambientalistas de "fantasia", ao mesmo tempo em que rechaçou a preferência por novas fontes promissoras de energia de baixo carbono, como a solar e a eólica.

"O vento é melhor, mais constante e necessário no Nordeste, exatamente a região que já não tem potencial hidrelétrico remanescente. Sol também não falta na região, mas ele tem sido tratado com ainda mais desprezo nas políticas públicas da área de energia. Esse descuido com os não convencionais está fazendo com que o Brasil perca a corrida pela ponta do processo", comentou Miriam Leitão n'O Globo, a respeito da declaração de Dilma.

O governo Dilma tem adotado políticas equivocadas, com impacto negativo na área ambiental. Dois exemplos:
o uso ascendente de energia térmica, gerada a partir de queima de carvão e outros combustíveis fósseis, e a prevalência crescente do consumo de gasolina em detrimento do álcool, em razão de uma política enviesada de preços dos derivados pela Petrobras.

Há também os retrocessos no Código Florestal; o descuido com o meio ambiente na construção das hidrelétricas dos rios Madeira e Xingu, na Amazônia; o freio na criação de unidades de conservação federais.

É incrível a capacidade que a gestão petista tem demonstrado de improvisar em temas sérios. O problema, no caso da Rio+20, é que nela pode estar em jogo todo o futuro da humanidade. Não se trata de um mero campeonato de futebol que, ao fim de 30 dias, terá um campeão.

Aqui, o risco é de todos nós sairmos derrotados, e isso não é fantasia.

Fonte: Instituto Teotônio Vilela
Rio + 20 : Fantasia rasgada

Nenhum comentário: