"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

abril 19, 2012

HORA DE DAR NOMES AOS BOIS

A CPI do Cachoeira finalmente ganha corpo, com a reunião das assinaturas necessárias para o ato de instalação. Em boa hora.

Falando em homenagem que recebeu na Câmara dos Deputados, disse o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso:
"Acho que o país cansou. Então, talvez seja o momento de o Congresso crescer, e fazer uma CPI que vá à raiz das questões."


Na raiz das questões estão fenômenos como o contraventor Cachoeira, instalado nas dobras do governo de Goiás, manipulando políticos como o senador Demóstenes, ou a empreiteira Delta, cujo proprietário, grande executor de obras do PAC, se gaba de dobrar políticos pondo 30 milhões nas mãos deles.

Já há tempos que o país anda com a corrupção entalada na garganta. De repente, parece que um limite é ultrapassado. E acontece o inédito:
todos a favor da CPI, governistas e opositores igualmente sorridentes, mostrando listas de assinaturas.

Supõe-se que houve erro de cálculo, a começar pelo ex-presidente Lula, que tocou a ferro e fogo a ideia, porque achava que apanhava políticos da oposição - em especial o governador de Goiás, seu desafeto.

Mas a euforia petista já refluiu, porque, como se sabe, ninguém sabe como termina uma CPI.


Outra expectativa do PT era de que a CPI do Cachoeira atrapalharia o ritmo do julgamento, pelo Supremo, da questão do Mensalão. Mas já se sabe que não vai ser assim. As duas coisas podem perfeitamente caminhar pari passu.

Quem afirma é o novo presidente do STF, ministro Ayres Britto, que foi explícito ao dizer que é preciso andar rápido, porque há o risco de prescrição de alguns delitos.


Também há o risco de esse andamento conflitar com o calendário eleitoral, porque, a partir de julho, ministros do Supremo serão também ministros do Superior Tribunal Eleitoral. Mas isso não impedirá o julgamento.

Cobra-se pressa, no STF, do relator, ministro Lewandowski. Como já foi dito, ninguém quer passar à História como coveiro desse processo.


O julgamento é necessário, entre outros motivos, para extinguir a alegação esdrúxula de que toda a história não passa de uma farsa. Se fosse farsa, a Procuradoria Geral da República, que ofereceu a denúncia em 2006, e o Supremo Tribunal Federal, que no ano seguinte transformou a denúncia em processo, seriam coadjuvantes.

Mas não é assim:
trata-se de um julgamento crucial, porque o que aconteceu em 2005 foi a mais audaciosa tentativa de que se tem notícia de comprar um Parlamento.
"O cruzamento dos dados bancários e a quebra de sigilos possibilitaram a verificação de repasses de verbas a todos os beneficiários", disse o procurador, que usou o termo "sofisticada organização criminosa" para descrever a operação, citando nominalmente, como envolvidos, José Dirceu, Delúbio Soares e José Genoíno.


É tudo isso que passará agora pelo crivo do STF, assim que o ministro Lewandowski entregar o seu relatório. O ministro Ayres Britto explica que colocar para julgar com brevidade não significa prejulgamento, ou predisposição para condenar. Mas o necessário é que, sem perder a objetividade, as coisas sejam chamadas pelos seus próprios nomes.

O Globo

Nenhum comentário: