"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

agosto 17, 2011

A OMISSÃO DA "ELITE PARTIDÁRIA" NO COMBATE À CORRUPÇÃO.

Passados 45 dias do afastamento da cúpula do Ministério dos Transportes, a elite partidária do país pouco ou quase nada disse que efetivamente demonstrasse preocupação com a onda de denúncias da prática de corrupção no quinhão que lhes coube no rateio do governo.

Muito se discute o papel da Polícia Federal, que transforma cada prisão num espetáculo midiático, como se não houvesse uma súmula do Supremo Tribunal Federal (STF) disciplinando o assunto.

Mas são desconhecidas as manifestações dos líderes e dirigentes partidários sobre as causas que levam o Brasil a ser classificado como um dos países mais corruptos do mundo e sobre a necessidade de se desenvolver mecanismos apropriados para conter a sangria do dinheiro público.


A omissão da elite política dirigente ofende o eleitor, tenha ou não votado no partido envolvido no escândalo do dia. Chega a ser inacreditável que os dissidentes de partidos situacionistas se vejam na obrigação de sair em defesa do governo que desencadeou a ofensiva moralizante.

Ofende os contribuintes, obrigados a trafegar por estradas intransitáveis ou a esperar horas sem fim na fila da emergência de hospitais sucateados por falta de investimentos. Ofende a autoestima em recuperação dos brasileiros, após o controle da superinflação, em meados dos 90.

Numa paráfrase do líder negro americano Martin Luther King, assassinado no fim dos agitados anos 60, o que mais preocupa não é o grito dos corruptos, dos desonestos, dos sem-caráter e dos sem-ética - o que mais preocupa é o silêncio dos bons.

Esses parecem reduzidos a uma dezena de senadores que se pronunciaram na tarde de segunda-feira, ainda assim, alguns aproveitando a onda para surfar sobre as direções partidárias que os isolaram e outros tendo em vista um bom pretexto para a adesão ao governo, pura e simplesmente.


A reação dos líderes é a de quem considera normal a ocorrência de corrupção; anormal seria a forma como a roubalheira é exposta. Apesar de as denúncias surgidas até agora serem vagas, não se viu um dirigente questionar o mérito das acusações.

Mas todos correram para responsabilizar a mídia por divulgar e escandalizar o que é um escândalo, ou para dizer que as denúncias (nem se fala mais em supostos desvios de verbas) não atingiam suas respectivas siglas partidárias.

A reação dos dirigentes e líderes dos dois principais partidos da base aliada - PT e PMDB - é sintomática. "Não vi escândalo nenhum. Vi uma manipulação.

Estamos nos solidarizando ao Mário Moysés, porque o que houve foi uma manipulação de órgãos da mídia", disse o presidente do PT, Rui Falcão (SP), sobre a "Operação Voucher", responsável pelas prisões suprapartidárias que a PF fez na cúpula do Ministério do Turismo.


Em vez de discutir a prática de corrupção, o presidente do PT tratou de isentar o companheiro de legenda e de governo no período em que Marta Suplicy foi prefeita da cidade de São Paulo.

Outras autoridades do governo alegaram abusos da imprensa nas recorrentes denúncias de corrupção dos ministérios. Na mesma linha de Rui Falcão, a ministra de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, disse que as acusações ao ministro do Turismo, Pedro Novais Lima (PMDB-MA), eram somente "armações da imprensa".

O presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), usou a experiência adquirida em meio século de política para dizer que não era responsável pela indicação de Pedro Novais Lima (o ministro do Turismo).

"Essa é uma afirmação que não foi bem apurada pela imprensa", disse. Sarney não teve a mesma preocupação quando os jornais colocaram o ministro em sua cota pessoal no ministério. A nomeação era, então, um sinal de prestígio político.


Cita-se dois líderes políticos, dos partidos mais importantes, mas há manifestações parecidas de políticos em todas as siglas partidárias.

Há pelo menos 10 anos o Brasil aparece em posição vergonhosa no índice de percepção da corrupção elaborado pela organização Transparência Internacional.

A nota oscila sempre em torno dos 3,5, numa escala que vai de zero a dez. Como diria Rui Barbosa, o homem chega a desanimar da virtude, "a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto".

Valor Econômico

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