Em um Congresso como o nosso, com políticos comprometidos sabe-se lá com o quê ou quem, o risco dos interesses coorporativos sobrepujarem o coletivo é fato.
José Carlos de Assis, Jornal do Brasil
A emenda diz que as produtoras privadas serão ressarcidas em óleo, retirado do respectivo campo, pelos royalties pagos “em dinheiro” na exploração.
Paga-se com a mão dinheiro e recebe-se (em óleo) com a esquerda. É simplesmente extraordinário.
Muitas gerações de congressistas vão se suceder antes que se extinga a vergonha por terem deixado passar tamanha aberração. Não acredito que seja uma questão de corrupção, embora haja bilhões de dólares em jogo. É distração.
Conheço razoavelmente bem o Congresso brasileiro. Conheço inclusive as condições de estresse em que trabalha a maioria dos parlamentares. Justamente por isso não é impossível que emendas espertas introduzidas em projetos complexos acabem passando em razão de simples distração do plenário. Nesse caso, porém, houve um excesso. O tema é altamente sensível.
O país inteiro acompanhava o debate no Parlamento. Como a emenda Henrique Alves pode ter passado?
Não duvido que a emenda Ibsen tenha servido de biombo para esse processo escabroso.
Obviamente que tirar dos estados produtores uma participação relevante nos royalties era uma forma de criar impacto e atrair atenção para um aspecto até certo ponto secundário da questão.
Afinal, distribuir royalties por uma lei ordinária é menos relevante que cobrar royalties a título de uma compensação prevista na Constituição federal. Só com muito engenho e arte seria possível eliminar a cobrança.
Com isso, não estou subestimando a importância dos royalties para o estado do Rio e outros estados produtores. Mesmo que eles sejam beneficiários da produção do petróleo, independentemente de royalties, é evidente que grandes investimentos de infraestrutura necessários como suporte à indústria petrolífera sobrecarregarão os orçamentos estaduais e, portanto, seus contribuintes. É nesse sentido que os royalties são definidos como compensação, e é justo que assim o seja.
Se a emenda Henrique Alves passar no Senado, será um acinte ao povo brasileiro.
O senador Pedro Simon, creio que com assessoria da Aepet (Associação dos Engenheiros da Petrobras), preparou uma emenda que resolve inteligentemente o problema.Primeiro, aprova-se a emenda Ibsen. Depois, derruba-se a emenda Henrique Alves.
Pega-se o dinheiro que essa emenda pretende devolver às petroleiras destinando-o à União, que usará esses recursos para pagar os devidos royalties aos estados produtores de petróleo no pré-sal. Com isso, todos ficarão satisfeitos, e o Senado limpa a barra da Câmara perante a opinião pública.
J. Carlos de Assis é economista e professor, autor de "A Crise da globalização".
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