Incapaz de manter a taxa básica de juros (Selic) em níveis civilizados por tempo que mereça comemoração, já que o Banco Central vem sendo obrigado pela ameaça da inflação a devolvê-la aos dois dígitos, o governo acaba de fazer mais uma vítima de sua necessidade de repor os prejuízos do dever de casa não cumprido.
Não faltaram avisos, nos últimos anos, de que a não realização de reformas estruturais nos tempos das vacas gordas cobraria, mais tarde, o preço político do controle mais severo dos gastos públicos, sob pena de o governo passar o vexame de não cumprir as metas de superavit primário, único remédio viável para reduzir a dívida pública e evitar que ela crescesse.
Os tempos de aperto vieram com a crise financeira mundial de 2008, que tornaram tudo mais difícil e, mesmo com os animadores sinais de retomada na maior economia do planeta (a dos Estados Unidos), ninguém de juízo se arrisca a definir a velocidade das melhoras.
Esse cenário já era conhecido no fim de 2012 e aconselhava a adoção de política fiscal mais apertada em 2013, para chegar ao fim do exercício demandando criatividade para fechar as contas e, mais grave, para não pressionar a demanda e, com ela, os preços internos.
O resultado da não obediência a esse caderno primário da política econômica foram os arranhões na credibilidade do país por causa dos arranjos contábeis para fechar o ano fiscal e a retomada dos aumentos da taxa de juros, para impedir que a inflação escapasse para muito longe da meta de 4,5%.
Como não fez o dever de casa do controle do gasto em 2013, o governo terminou o ano e inaugurou 2014 em desabalada carreira para não começar tão mal o ano das eleições. Nessa corrida para produzir dinheiro, o risco de fazer cortes imperfeitos e a vítimas injustificáveis aumenta.
O primeiro a ser atingido foi o turista brasileiro, surpreendido com as malas prontas pelo aumento de R$ 0,38 para R$ 6,38 no imposto sobre os cartões de débito pré-pagos. Agora, a punição de inocentes pela má administração fiscal pegou o mais indefeso e sacrificado dos consumidores: o aposentado ou pensionista que ainda ganha acima de um salário mínimo.
Impossibilitados de fazer greve e sem quem os defenda sem demagogia e sonhos irrealizáveis, esses 9,5 milhões de brasileiros acabam de sofrer mais um golpe do governo. Terão o poder de compra de suas aposentadorias um pouco mais diminuído, já que, em vez da inflação oficial de 2013, de 5,91%, terão reajuste de 5,56%.
Este ano, alguém pode pensar que foi menos ruim do que dar apenas os 4,5% do centro da meta de inflação. Mas esse é o falso alívio da ida e da volta do chicote. Serve apenas para acelerar a chegada do dia em que todas essas pessoas receberão apenas um salário mínimo. Aos que argumentam que a diferença no índice de correção foi de “apenas” 0,35 ponto percentual, pergunta-se: se é tão pequena, por que negá-la?
A questão é que, para o governo, o futuro só virá depois das eleições.
Correio Braziliense
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