"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

agosto 12, 2013

EM REPÚBLICA TORPE... O RESULTADO É OUTRO



O termo sugere um tratamento especial, VIP, para a casta de políticos e autoridades. É provável que, por isso mesmo, a revogação do chamado "foro privilegiado" tenha entrado em alguma das "agendas positivas" que o Congresso formulou às pressas, para atender à onda de manifestações de rua em que o combate à corrupção e, em sentido amplo, a privilégios na vida pública foi uma das bandeiras.
Infelizmente, como quase sempre, o senso comum erra ao considerar o foro privilegiado um instrumento a serviço da impunidade, um dos graves males do país. Pois é o oposto.
Inevitável lembrar, neste debate, que o primeiro movimento feito pela defesa de mensaleiros no julgamento do Supremo foi pedir a transferência para a primeira instância dos processos de seus clientes não enquadrados formalmente no foro privilegiado.
A intenção era evidente: 
apostar na prescrição dos crimes. 
Uma aposta com cem por cento de possibilidade de acerto, dada a conhecida e resistente característica de lentidão e burocracia do Judiciário - apesar da atuação do Conselho Nacional de Justiça contra o atravancamento da máquina dos tribunais, um mal a ser combatido não apenas com aperfeiçoamentos legais, mas também aprimoramentos administrativos.
A lerdeza da Justiça tanto é uma salvação para políticos e autoridades que já houve quem renunciasse no Congresso para escapar do STF e poder se beneficiar do longo, tortuoso e infindável trajeto entre a primeira instância e a última.
Por este motivo, a Lei da Ficha Limpa estabeleceu como parâmetro para a não concessão de registro a candidatos uma condenação por colegiado, na Justiça e na esfera administrativa. A lei acabou com a boia salva-vidas do "transitado em julgado", ou seja, da última sentença. A que demora tanto que poucas vezes é lavrada.

Também beneficiados pela lentidão com que os processos tramitam, donos de prontuários policiais e/ou volumosos e ricos registros no Judiciário costumavam buscar proteção nas imunidades concedidas aos parlamentares. E tinham sucesso - até a Ficha Limpa.

Acabar com o foro privilegiado é colocar à disposição de políticos e autoridades acusados de delitos este escudo poderoso da impunidade, por meio da prescrição forçada pela demora na tramitação dos processos. É certo que a Justiça precisa ser menos lenta, ganhar velocidade em suas decisões, sem, óbvio, precarizar direitos. Mas, mesmo num Judiciário eficiente, faz sentido o tratamento especial a representantes do poder público.
Não só por ser impossível protegê-los de vendetas políticas engendradas na Justiça e no Ministério Público, mas também porque a rapidez nos julgamentos - claro, garantido o direito pleno de defesa - de qualquer agente público, dos três poderes, é básica para impedir o corrosivo sentimento de impunidade, incentivo infalível à criminalidade continuada.
O Globo

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