"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

fevereiro 25, 2013

A COMEMORAÇÃO CACHACEIRA DO "DE(s)CENIO" DOS FARSANTES E FALSÁRIOS ERA PARA A : Corrupção - crime ou esperteza?


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Nestes dias em que os políticos do Partido dos Tra­balhadores passa­ram a lamber uns aos outros, em co­memoração pelos dez anos no poder, é o caso de perguntar: além da farra com dinheiro pú­blico, além do fim da corrupção como crime para se converter em ato de esperteza, o que mais eles estão festejando?

Nesses dez anos eles conse­guiram praticamente quebrar a Petrobrás, que era uma das em­presas mais sólidas do mundo; reduzir o desenvolvimento do País a níveis inferiores aos do Paraguai e da Bolívia; fazer cres­cer a inflação, que fora zerada por Fernando Henrique Cardo­so; e aumentar a carga tributária a praticamente 40% do produto interno bruto (PIB).

Em nenhum outro país do mundo a venda de remédios so­fre carga de impostos tão aítaf como no nosso Os bens durá­veis de consumo, afetados pela mesma carga tributária, custam muito mais do que nos outros países. E os preços são tão absur­dos que os brasileiros ficaram viciados em viagens ao exterior apenas para comprar.

Bilhões de dólares de brasilei­ros engordam a economia ame­ricana todos os anos porque os produtos lá vendidos custam muito menos do que aqui, no Brasil. Isso ocorre exatamente no momento em que os petistas aparecem rindo nas fotos. Rin­do de quê? Com certeza eles es­tão rindo de nós e da farra que fizeram nesses dez anos.


Quando Tancredo Neves, com sua habilidade e seu maneirismo, conseguiu eleger-se pre­sidente, arrebatar a Bandeira brasileira das mãos dos milita­res e devolvê-la a todos nós, fi­cou a impressão de que o País teria mais sorte e melhor rumo. Mas com o seu trágico faleci­mento e a posse do biônico José Samey na Presidência da Repú­blica, ficou desmentida a ideia engartosa de que Deus é brasilei­ro. É nada, deve ser suíço.

O lado pior e mais trágico que surgiu nos últimos dez anos foi deixar transparente que é possí­vel cometer na vida pública os mais graves crimes e nada acon­tecerá. Corrupção, peculato, formação de quadrilha e outros hediondos crimes contra a ad­ministração pública foram pra­ticados em grande escala e até agora não se viu um único infra­tor sendo levado para detrás das grades.

Algumas semanas atrás o mundo teve conhecimento do exemplo invejável da Justiça in­glesa, que condenou e determi­nou a imediata prisão de um fi­gurão da política que cometera infração de trânsito, mas para não ter a imagem afetada publi­camente fez sua mulher assu­mir a responsabilidade pela transgressão. Isso foi descober­to somente dez anos depois, mas, mesmo assim, a Justiça in­glesa não perdoou e ele foi direitinho para atrás das grades.

Qualquer pessoa que tenha sentimento de justiça logo per­ceberá como nós estamos a mi­lhares de anos-luz dessa exemplar conduta.

A ausência de punição tem si­do característica marcante em nosso país. Nós últimos tem­pos, porém, a impunidade assu­miu feição muito mais grave, porque os delitos praticados por altos figurões da República continuam à espera de execu­ção da pena. Realmente, ainda que tenham sido condenados pelo Supremo Tribunal Fede­ral, a condenação permanece destituída de eficácia e isso pro­paga a ideia de que poderosos nunca vão para a cadeia. 

Dá para imaginar o que a Justiça inglesa teria feito com José Dirceu, José Genoino, João Pau­lo Cunha e outros aos quais o linguajar policial atribui terem a "mão cabeluda"? Por incrível que pareça, eles talvez apare­çam perante boa parte da popu­lação brasileira como pessoas dotadas de invejável esperteza, porque, afinal, a despeito da "mão cabeluda", continuam por aí, sempre aparecendo e rin­do nas fotos. Julgados e conde­nados, são verdadeiros exem­plos da ineficácia do nosso siste­ma jurisdicional.

A Justiça brasileira, infeliz­mente prisioneira de entraves processuais que herdamos dos romanos, ainda não conseguiu a eficácia e a praticidade da de in­gleses e norte-americanos. Es­tes sabem de sobra que o exem­plo da punição influi na redução da criminalidade muito mais do que qualquer repressão policial.

Os políticos do Partido dos Trabalhadores que comemo­ram os dez anos de governo com certeza não farão nenhu­ma referência ao fato de o Brasil figurar nos índices internacionais de desenvolvimento huma­no em 84 lugar e que continua­mos a ser um dos campeões mundiais de analfabetismo, além de nossa mortalidade in­fantil persistir como problema a ser resolvido.

Com a entrada em vigor do Plano Real, em 1994, pratica­mente zerada a inflação, o di­nheiro passou a valer mais e isso beneficiou, sobretudo, as pes­soas mais pobres, que foram gradativamente inseridas no pro­cesso capitalista de consumo.

Essa melhora, contudo, não foi suficiente para tirar da pobreza alguns milhões de brasileiros, que continuam na linha da miserabilidade e, portanto, é mesmo necessário que recebam atendi­mento do governo, com a distri­buição de recursos.

Essa doação de dinheiro pú­blico, todavia, não poderia ter a feição - lamentavelmente ad­quirida - de subterfúgio políti­co destinado a angariar votos e prestígio eleitoral. Quem doa di­nheiro público deveria ter no próprio gesto de doar a recom­pensa, e não a esperada respos­ta de apoio e votos.

O poeta de origem árabe Khalil Gibran, com lirismo e profun­didade, ensinou: "Há aqueles que doam e não sentem dor ao doar, nem buscam alegria, nem doam pensando em virtude. Eles doam como no longínquo vale o mirto exala sua fragrân­cia no espaço. É através dessas mãos que Deus fala, e é por detrás de seus olhos que Deus sor­ri sobre a Terra".

Seria um invejável gesto de grandeza a distribuição de re­cursos públicos aos mais sofri­dos se tal conduta não estivesse marcada por interesses pes­soais, por isso mesmo mesqui­nhos, de feição eleitoral. Quem doa buscando o reconhecimen­to talvez não perceba que essas dádivas se tornam corruptas.

Aloísio de Toledo César O Estado de S. Paulo

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