O ministro Teori Zavascki, que assume cargo amanhã no STF, considera que a Corte ficou muito exposta com a transmissão ao vivo do julgamento do mensalão. Para ele, o excesso de exposição às vezes não colabora para um julgamento tranquilo.
"Para o meu gosto, acho que se poderia repensar isso", disse. O ministro Joaquim Barbosa presidiu sua primeira sessão no CNJ e disse ser a favor de investigações sobre o patrimônio de magistrados. Ele também criticou a Justiça Militar.
Novo ministro defende "meio caminho" entre transmissão pela TV e publicação de decisões e diz que juiz, às vezes, toma medida impopular
Às vésperas de tomar posse, aos 64 anos, como ministro do Supremo Tribunal Federal, Teori Zavascki disse ontem que a Corte ficou muito exposta com a transmissão ao vivo do julgamento do mensalão. Sem fazer avaliações sobre as votações do caso em si, Zavascki disse que no passado redigiu artigo no qual sustentou que a discussão sobre perda de mandato de parlamentares condenados cabe ao Legislativo, e não ao Judiciário.
Três deputados - João Paulo Cunha (PT-SP), Pedro Henry (PP-MT) e Valdemar Costa Neto (PR-SP) - foram condenados pelo Supremo no processo do mensalão. Teori descartou sua participação no atual julgamento, mas disse que deve participar da apreciação dos prováveis recursos dos réus condenados.
O ministro abordou outros temas do Judiciário, em entrevista coletiva no Superior Tribunal de Justiça (STJ), como a defesa do direito de parentes de magistrados advogarem até em tribunais onde seus familiares são juízes. A seguir, os principais tópicos.
Participação no julgamento do mensalão
A regra de participação do juiz em um julgamento que está em andamento é a do regimento interno (do tribunal). Minha interpretação é que não cabe mais minha participação. Nessa fase de fixação de penas, participam só os ministros que proferiram juízo condenatório. Eu não vou participar do julgamento do mensalão. (...) Eu vou participar provavelmente se houver recurso futuro.
Perda de mandato dos deputados condenados
Na década de 90, quando atuava como juiz do TRE, escrevi artigo doutrinário, como doutrinador. Entendi que a perda do mandato parlamentar - no caso de deputado e senador - depende da respectiva casa legislativa. É diferente a posição do doutrinador e a do juiz. A formação da decisão judicial tem de ter o argumento das duas partes. Lá atrás eu defendi isso.
Repercussão do julgamento
Não acredito que a relação do Judiciário com a sociedade vá mudar profundamente. A visibilidade do STF se deu em função principalmente da exposição que as transmissões por TV propiciam. As relações entre Judiciário e sociedade hoje são de uma visibilidade que às vezes vai além da publicidade.
Transmissão de julgamentos
Tem pontos positivos e negativos. Um ponto negativo é o excesso de exposição que às vezes não colabora para um julgamento tranquilo, sereno. Para o meu gosto, acho que se poderia repensar isso. Não sou contra a publicidade dos atos, que são públicos por imposição constitucional. Mas entre publicidade e transmissão ao vivo tem um meio caminho. Mas é uma situação de fato que temos hoje e que dificilmente será revertida.
Justiça e clamor popular
O juiz tem de levar em conta as normas. Se fôssemos hoje, em determinadas circunstâncias, julgar não conforme a lei, mas segundo a vontade popular, não teríamos condição de aplicar muitas leis, por exemplo, em matéria penal. Aplicaríamos penas mais severas. Eu diria até que, se fôssemos levar em conta a vontade popular, teríamos implantado a pena de morte no Brasil há muito tempo. O juiz tem um papel difícil na sociedade que é, às vezes, tomar decisões impopulares. Às vezes, para aplicar a lei, não se escapa da impopularidade. Quem tem de aferir a vontade do povo são os Poderes eleitos pelo povo, com essa missão de fazer leis. O juiz tem de aplicar as leis legítimas.
Foro privilegiado
É uma questão polêmica. A prerrogativa de foro existe desde a Constituição do Império. A ideia é (garantir) um julgamento justo e imparcial. Talvez se devesse reduzir a quantidade de autoridades com prerrogativa de foro. Em muitos casos, não é nenhum privilégio. As pessoas que são julgadas originariamente por juiz de primeiro grau acabam tendo acesso ao STF. Em tese, do ponto de vista de demora de julgamento, o caminho a ser percorrido no caso de julgamento originariamente em primeira instância é muito mais comprido do que os julgados diretamente por um tribunal. Temos visto muita gente querendo não ter a prerrogativa de foro. O fato de pessoas não quererem ter esse privilégio é um sinal de que não é bem assim.
PEC da Bengala, que prevê aumento da idade para aposentadoria compulsória
Deve ser vista em um conjunto, não só em relação aos tribunais superiores. Seria casuístico aprovar uma emenda que fosse contemplar só ministros de tribunais superiores. Talvez devesse repensar a conveniência para o Estado de pagar aposentadorias a servidores não só do Judiciário, mas a servidores públicos de modo geral, quando completam 70 anos.
Judicialização da política
A diferença entre a atividade do juiz e a atividade do legislador é que o juiz atua sobre situações concretas. O legislador atua para situações futuras, por intuição. Quando um problema novo vem para o juiz e a respeito dele não há uma prévia atuação legislativa, o juiz não pode se eximir de julgar. O sistema dá orientação para o juiz. Ele vai trabalhar com analogia, com princípios e com costumes.
Parente de magistrado advogar no tribunal do familiar
As regras existem. Evidentemente que, nem no próprio tribunal nem em outro tribunal, é possível que um juiz atue em processo que tenha atuado determinado advogado ou pessoa com grau de parentesco. O inverso também é verdadeiro. Se um processo está com um juiz, o parente não pode atuar (como advogado). Mas não se pode proibir um parente de advogar porque é parente de juiz.
Novo ministro defende "meio caminho" entre transmissão pela TV e publicação de decisões e diz que juiz, às vezes, toma medida impopular
Às vésperas de tomar posse, aos 64 anos, como ministro do Supremo Tribunal Federal, Teori Zavascki disse ontem que a Corte ficou muito exposta com a transmissão ao vivo do julgamento do mensalão. Sem fazer avaliações sobre as votações do caso em si, Zavascki disse que no passado redigiu artigo no qual sustentou que a discussão sobre perda de mandato de parlamentares condenados cabe ao Legislativo, e não ao Judiciário.
Três deputados - João Paulo Cunha (PT-SP), Pedro Henry (PP-MT) e Valdemar Costa Neto (PR-SP) - foram condenados pelo Supremo no processo do mensalão. Teori descartou sua participação no atual julgamento, mas disse que deve participar da apreciação dos prováveis recursos dos réus condenados.
O ministro abordou outros temas do Judiciário, em entrevista coletiva no Superior Tribunal de Justiça (STJ), como a defesa do direito de parentes de magistrados advogarem até em tribunais onde seus familiares são juízes. A seguir, os principais tópicos.
Participação no julgamento do mensalão
A regra de participação do juiz em um julgamento que está em andamento é a do regimento interno (do tribunal). Minha interpretação é que não cabe mais minha participação. Nessa fase de fixação de penas, participam só os ministros que proferiram juízo condenatório. Eu não vou participar do julgamento do mensalão. (...) Eu vou participar provavelmente se houver recurso futuro.
Perda de mandato dos deputados condenados
Na década de 90, quando atuava como juiz do TRE, escrevi artigo doutrinário, como doutrinador. Entendi que a perda do mandato parlamentar - no caso de deputado e senador - depende da respectiva casa legislativa. É diferente a posição do doutrinador e a do juiz. A formação da decisão judicial tem de ter o argumento das duas partes. Lá atrás eu defendi isso.
Repercussão do julgamento
Não acredito que a relação do Judiciário com a sociedade vá mudar profundamente. A visibilidade do STF se deu em função principalmente da exposição que as transmissões por TV propiciam. As relações entre Judiciário e sociedade hoje são de uma visibilidade que às vezes vai além da publicidade.
Transmissão de julgamentos
Tem pontos positivos e negativos. Um ponto negativo é o excesso de exposição que às vezes não colabora para um julgamento tranquilo, sereno. Para o meu gosto, acho que se poderia repensar isso. Não sou contra a publicidade dos atos, que são públicos por imposição constitucional. Mas entre publicidade e transmissão ao vivo tem um meio caminho. Mas é uma situação de fato que temos hoje e que dificilmente será revertida.
Justiça e clamor popular
O juiz tem de levar em conta as normas. Se fôssemos hoje, em determinadas circunstâncias, julgar não conforme a lei, mas segundo a vontade popular, não teríamos condição de aplicar muitas leis, por exemplo, em matéria penal. Aplicaríamos penas mais severas. Eu diria até que, se fôssemos levar em conta a vontade popular, teríamos implantado a pena de morte no Brasil há muito tempo. O juiz tem um papel difícil na sociedade que é, às vezes, tomar decisões impopulares. Às vezes, para aplicar a lei, não se escapa da impopularidade. Quem tem de aferir a vontade do povo são os Poderes eleitos pelo povo, com essa missão de fazer leis. O juiz tem de aplicar as leis legítimas.
Foro privilegiado
É uma questão polêmica. A prerrogativa de foro existe desde a Constituição do Império. A ideia é (garantir) um julgamento justo e imparcial. Talvez se devesse reduzir a quantidade de autoridades com prerrogativa de foro. Em muitos casos, não é nenhum privilégio. As pessoas que são julgadas originariamente por juiz de primeiro grau acabam tendo acesso ao STF. Em tese, do ponto de vista de demora de julgamento, o caminho a ser percorrido no caso de julgamento originariamente em primeira instância é muito mais comprido do que os julgados diretamente por um tribunal. Temos visto muita gente querendo não ter a prerrogativa de foro. O fato de pessoas não quererem ter esse privilégio é um sinal de que não é bem assim.
PEC da Bengala, que prevê aumento da idade para aposentadoria compulsória
Deve ser vista em um conjunto, não só em relação aos tribunais superiores. Seria casuístico aprovar uma emenda que fosse contemplar só ministros de tribunais superiores. Talvez devesse repensar a conveniência para o Estado de pagar aposentadorias a servidores não só do Judiciário, mas a servidores públicos de modo geral, quando completam 70 anos.
Judicialização da política
A diferença entre a atividade do juiz e a atividade do legislador é que o juiz atua sobre situações concretas. O legislador atua para situações futuras, por intuição. Quando um problema novo vem para o juiz e a respeito dele não há uma prévia atuação legislativa, o juiz não pode se eximir de julgar. O sistema dá orientação para o juiz. Ele vai trabalhar com analogia, com princípios e com costumes.
Parente de magistrado advogar no tribunal do familiar
As regras existem. Evidentemente que, nem no próprio tribunal nem em outro tribunal, é possível que um juiz atue em processo que tenha atuado determinado advogado ou pessoa com grau de parentesco. O inverso também é verdadeiro. Se um processo está com um juiz, o parente não pode atuar (como advogado). Mas não se pode proibir um parente de advogar porque é parente de juiz.
MARIÂNGELA GALLUCCI
O Estado de S. Paulo
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