"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

outubro 19, 2012

Documento revela BC 'inconsistente'

Inconsistente.
Esse é o adjetivo que o ex-diretor do Banco Central Alexandre Schwartsman utiliza para classificar a ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), na qual o Banco Central cortou a Selic em 0,25 ponto percentual, para 7,25% ao ano.  

Para ele, não parece plausível o BC falar em convergência não linear da inflação para a meta, ter cortado novamente o juro, trabalhar com o cumprimento da meta de superávit primário e dizer que a política fiscal está se movendo de neutra para expansionista.  

Na avaliação do sócio-diretor da Schwartsman & Associados, o que ficou claro é que a Selic será mantida em 7,25% ao ano por muito tempo e que a meta de inflação não é mais 4,5%, e sim 6,5%.  

A seguir, os principais trechos da entrevista concedida ao Valor. Valor: Por quanto tempo a Selic ficará estável em 7,25% ao ano? 

  Alexandre Schwartsman:  
Por muito tempo.  Eles [o BC] não têm o menor interesse em subir a taxa. O que poderia mudar a cabeça do BC?  Um sinal de que a inflação esteja perto de 6,5%, hipótese ainda não testada. Imagina-se que, obviamente, a meta não é 4,5%.  Se fosse, não teriam cortado o juro. Qual a meta? Ninguém sabe, mas imagina-se que seja o teto da banda, 6,5%. Se você me perguntar se há riscos de a inflação superar os 6,5% no ano que vem, respondo que não, por conta da queda nas tarifas de energia.  Mas a projeção do BC de [IPCA em] 4,9% no ano que vem é muito otimista. Provavelmente vai ficar acima disso. A discussão sobre uma alta do juro deve ficar para as últimas reuniões do próximo ano, quando começarão a ficar mais claras as pressões inflacionárias. Até lá, Selic estável.  

Valor: 
O Brasil corre o risco de voltar a ter um juro básico de dois dígitos? O BC tem condições de consolidar esse novo ambiente de um dígito?  

Schwartsman:  
Vamos ter que voltar a ter em algum momento. Estamos empurrando com a barriga o problema inflacionário. Com toda a mudança de peso do IBGE no IPCA, com as desonerações no setor automotivo, nos combustíveis e com a economia crescendo 1,5%, o país vai ter uma inflação 1 ponto percentual acima da meta.  

Valor:  
O BC afirma na ata que continua trabalhando com a hipótese de cumprimento da meta de superávit primário de 3,1% do PIB em 2012, 2013 e 2014, mas há dúvidas de que isso será concretizado. De que modo o BC teria de calibrar a Selic no caso de descumprimento da meta? Ou essa necessidade não seria tão imediata? 

  Schwartsman: 
Ele diz num momento que trabalha com o cumprimento, mas em outro afirma que a política fiscal está se movendo de neutra para expansionista. Me parece, no mínimo, confuso. A questão é que ele [BC] teria de subir a Selic se estivesse de fato perseguindo o centro da meta de inflação. Não é o que me parece. O texto é muito inconsistente.  

Valor:  
Os três membros que votaram a favor da manutenção da Selic em 7,50% na semana passada avaliaram que o cenário prospectivo para a inflação não recomendava um novo alívio monetário. Faz tanta diferença assim um corte de 0,25 ponto percentual agora?

  Schwartsman:  
Definitivamente não faz. Acho genuína a discordância, mas acho curioso todos eles terem até então partilhado das justificativas dadas nas reuniões anteriores para derrubar o juro e agora não mais. É como se o não corte da Selic agora pudesse de fato mudar o curso e as expectativas de inflação. Não pode.  

Valor:   
Como você avalia o peso do câmbio nas próximas decisões de política monetária? 

 Schwartsman:  
Vai depender muito da pressão das commodities, e acho que ela vai continuar. Os preços aqui poderiam estar de 15% a 20% mais baratos se deixassem o dólar flutuar. Se permitiram um impacto agora, acho que vão segurar mais um pouco, mas, se a inflação bater os 6,5%, o BC deve rever essa postura no câmbio.

José de Castro Valor Econômico 

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