"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

julho 19, 2012

Vítima denunciou colegas de PF



O agente da Polícia Federal Wilton Tapajós Macêdo, assassinado com dois tiros no Cemitério Campo da Esperança, figura nos relatórios de interceptação telefônica da Operação Monte Carlo como um dos principais responsáveis pelo monitoramento de dois policiais federais acusados de dar suporte à organização criminosa comandada por Carlinhos Cachoeira.

Conversas gravadas na operação comprometeram o ex-chefe da Divisão de Serviços Gerais da Coordenação de Administração da Diretoria de Logística da PF Anderson Aguiar Drumond e o delegado da corporação Deuselino Valadares.

O monitoramento das conversas do sargento reformado da Aeronáutica Idalberto Matias de Araújo, conhecido como Dadá, levou a polícia a descobrir o envolvimento de Anderson com a quadrilha — Dadá era um dos principais arapongas de Cachoeira. A partir daí, os passos do chefe da garagem da Polícia Federal também foram acompanhados de perto e grande parte dos relatórios sobre a atuação de Anderson na organização criminosa de Cachoeira ficou sob a responsabilidade do agente Tapajós.

Em uma das interceptações destacadas pelo policial, integrante do conteúdo da Operação Monte Carlo, Dadá combina com Anderson a propina como pagamento pelas informações privilegiadas repassadas pelo servidor da instituição à quadrilha.

Durante a investigação, a Polícia Federal descobriu que Cachoeira tinha controle da entrada e da saída de todos os carros da corporação por intermédio de Anderson, que passava relatórios de logística que indicavam o número de veículos que seriam empregados nas ações, estimativa de agentes destacados e o possível destino das equipes.

A interferência de Cachoeira na garagem da própria PF foi tratada com cautela pelos investigadores. Em uma das escutas relacionadas a Anderson, até mesmo o delegado que comandou a Monte Carlo, Matheus Mela Rodrigues, abriu a consulta dos áudios ao lado de Tapajós para analisar os diálogos contidos no grampo.

Anderson acabou exonerado em 28 de fevereiro, na véspera da prisão de Cachoeira.

O agente morto também foi responsável pelo tratamento de escutas relacionadas a Deuselino. Nas conversas, o delegado da PF é citado como um dos informantes da quadrilha, que obtinha informações das operações em curso para se antecipar em caso de suposto recolhimento de máquinas caça-níqueis, além de prisões.


"Ato perverso"

Documentos da Operação Monte Carlo apontam que Tapajós atuou em pelo menos 136 monitoramentos telefônicos.
Os alvos investigados pelo agente foram, além dos dois policiais federais,
Gleyb Ferreira da Cruz, operador do bicheiro;

Sônia Regina, ex-servidora da prefeitura de Luziânia;
Lenine Araújo de Souza, gerente e contador da organização;
Rosalvo Simprini Cruz, operador do esquema;
José Olímpio Queiroga, um dos principais auxiliares de Cachoeira;
Geovani Pereira da Silva, contador;
Valmir José da Rocha, laranja da área financeira; e Dadá.

Entre as escutas que estavam sob a responsabilidade de Tapajós também foram registrados diálogos apontando atuação de policiais de Valparaíso (GO) com o esquema e um "comandante" da Polícia Militar não identificado.

O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, afirmou que somente após a polícia concluir a investigação sobre a morte de Tapajós será possível associar ou descartar uma ligação entre o assassinato do agente e o trabalho dele na Monte Carlo.

"É muito cedo para se fazer qualquer afirmação sobre esse caso. A Polícia Federal está investigando as circunstâncias da morte. Toda a equipe de peritos está fazendo a investigação. Então, portanto, nesse momento, é precipitado tirar qualquer conclusão sobre esse fato. Mas a Polícia Federal está se empenhando e, seguramente, nós vamos encontrar as causas desse ato perverso que acabou vitimando um dos nossos agentes", ponderou Cardozo.


No Congresso

Na divulgação do balanço dos trabalhos da CPI do Cachoeira, no Congresso, o presidente da comissão, senador Vital do Rego (PMDB-PB), afirmou que a morte do agente não levará clima de intimidação ao grupo. Segundo ele, cabe à polícia investigar o assassinato.

"Nesse momento, é precipitado tirar qualquer conclusão sobre esse fato. Mas a Polícia Federal está se empenhando e, seguramente, nós vamos encontrar as causas desse ato perverso que acabou vitimando um dos nossos agentes" José Eduardo Cardozo, ministro da Justiça


Memória

Conversas reveladoras

As interceptações de diálogos entre integrantes da organização criminosa chefiada por Carlinhos Cachoeira fizeram com que a Polícia Federal destacasse pelo menos duas conversas em que comparsas do bicheiro discutiam acerto de crime de pistolagem. Os grampos foram feitos em 6 de abril e 25 de junho de 2011.

Em um dos áudios, divulgado pelo Correio em maio, um homem identificado como Jefferson telefona para outro identificado como Marco e afirma que se ele indicasse um pistoleiro para um serviço ganharia R$ 1 mil.

Investigações da Polícia Federal também apontam para suposta ligação entre policiais corruptos que apoiavam as atividades de Cachoeira e acusados de compor grupo de extermínio em Goiás. Cachoeira foi flagrado, em interceptação telefônica, questionando interlocutor sobre a possibilidade de influir na transferência de policiais militares acusados de pertencer a grupo de extermínio de instituição federal em Mato Grosso do Sul para presídio em Goiás.

O delegado federal Raul Alexandre Souza revelou, em depoimento à CPI do Cachoeira no Congresso, que a investigação também registrou ligações em que integrantes da organização criminosa combinam sequestro de um explorador de casa de bingo que estaria desafiando o poder da quadrilha.

JOSIE JERONIMO Correio Braziliense


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