"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

julho 27, 2012

"uma boa notícia ou uma situação de crise moral na vida pública" ?

O Tribunal de Contas do Rio de Janeiro não aprovou as contas de 499 cidadãos que ocuparam cargos públicos em seus municípios - quase todos ex-prefeitos e ex-presidentes de Câmaras de Vereadores - no estado.

E o presidente do Tribunal Regional Eleitoral, Luiz Zveiter, anunciou o óbvio:
nenhum deles poderá ser candidato nas eleições de outubro. Todos estarão inelegíveis por oito anos.

A existência desse prazo é curiosa:
parece indicar a confiança de que, nos oito anos, políticos desonestos ou incompetentes em alto grau aprenderão a governar ou abandonarão o feio costume de meter a mão nas verbas públicas.

Com uma pitada de cinismo, é bom não esquecer que a inelegibilidade sempre castiga - mas raramente conserta.

Nas eleições deste ano, 21 mil cidadãos do Estado do Rio são candidatos a mandatos diversos. Esse número sugere uma de duas conclusões:
ou existe por aqui extraordinário índice de devoção aos interesses da coletividade, ou os cargos a serem preenchidos pelo voto popular são, por assim dizer, apetitosos.

O eleitor saberá qual das duas explicações é verdadeira.

No caso da primeira, estamos todos de parabéns; na outra hipótese restará aos cidadãos a possibilidade - melhor dizendo, o dever - de tomar nota dos nomes daqueles que se dedicam a usar o poder em benefício próprio.
É certo que existem políticos dos dois tipos. Aqui, como em qualquer outro país.

É difícil saber se os 499 que caíram na malha fina do Tribunal de Contas representam uma boa notícia ou uma situação de crise moral na vida pública:
falta-nos a comparação com anos anteriores.

Não parece improvável que a resposta correta às nossas preocupações seja a de que tudo continua com sempre foi:
nem aumento de safadeza, nem o resultado animador de uma operação de enérgica limpeza nos quadros partidários.

Afinal, a turma parece ser a de sempre, numa mistura de cidadãos honestos e dedicados ao bem comum com aqueles que enxergam na carreira pública aquilo que uma gíria antiga batizou de "boca rica". Durante a campanha eleitoral, é difícil saber. Depois da posse dos eleitos, logo se saberá.

O número dos castigados pelo Tribunal de Contas não é animador. Como também não é excesso de pessimismo imaginarmos que os oito anos de inelegibilidade transformarão em varões de Plutarco, como se dizia antigamente, os 499 agora - mas não submetidos a qualquer pena de cadeia ou multa, o que não deixa de ser curioso.

Afinal de contas, ser apanhado numa malha fina deveria ser apenas a prova de mau comportamento, primeiro passo no caminho para uma punição exemplar.

Luiz Garcia O Globo

Nenhum comentário: