"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

junho 04, 2012

Que país é este?


Vou lançar mão como título deste artigo, dessa expressão bem conhecida dos brasileiros, e muito usada quando indignados e perplexos com fatos sucedidos em nossa nação, perguntamo-nos a nós mesmos:
"Que país é este?"

Dias atrás, proferiu uma palestra na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), um dos maiores especialistas internacionais em política industrial, o sul-coreano Ha-Joon Chang, professor de economia da Universidade de Cambridge na Inglaterra. Sendo ele um profundo conhecedor das políticas públicas e dos ambientes de negócio nos mais variados países do mundo, apresentou aos empresários brasileiros uma visão comparativa nas últimas décadas do desempenho econômico e social entre diversas economias desenvolvidas e em desenvolvimento.

Para nossa tristeza, mas sem nenhuma surpresa, verifica-se como o Brasil perdeu e continua perdendo posição em relação a vários outros países emergentes, especialmente asiáticos, que têm praticado a correta política de estimular investimentos e seus empreendedores. Lá não hesitam em publicamente prestigiar os empreendedores, aqueles que se lançam ao risco de criar riqueza, empregos, renda, valor adicionado, inovação tecnológica, em troca do reconhecimento material e institucional para seu empreendimento.

Recentemente em reunião com um seleto grupo de empresários no Palácio do Planalto, a presidente Dilma Rousseff lançou mão de uma outra famosa expressão cunhada nos anos 30 pelo famoso economista inglês John Maynard Keynes sobre a necessidade de "despertar o espírito animal" dos empreendedores brasileiros, para que invistam mais, criem mais empresas e empregos no país, única forma de promover o verdadeiro e sustentável desenvolvimento econômico e social que tanto desejamos.

Pois bem, foi exatamente por meio do estímulo a esse espírito empreendedor que nações como a Coreia do Sul, que até os anos 70 apresentavam uma renda per capita menor que a brasileira, hoje tem mais que o dobro da nossa, e suas empresas multinacionais, seus carros, produtos eletrônicos e equipamentos industriais se encontram espalhados pelos quatro cantos do mundo.

Seremos capazes de mudar o hostil ambiente de negócios e promover um crescimento de forma sustentável?

Sabedor da potencialidade de nossa economia, da qualidade de nossos empreendedores, da abundante disponibilidade dos fatores de produção (recursos naturais, mão de obra, energia, etc.), e da dimensão de nosso mercado interno, pergunta o professor Chang, por que o Brasil continua sendo eternamente o país do futuro?

Diplomático, foi discreto nas críticas aos equívocos de nossa política econômica nos últimos 30 a 40 anos, mas despertou em nós, empresários, o saudável sentimento da autocrítica que nos leva então a perguntar:

Que país é este que pratica já por mais de 15 anos os juros mais altos do mundo mesmo estando sua economia hoje em dia classificada em grau de investimento e com razoável estabilidade política e econômica?

Que país é este no qual a taxa de câmbio apreciada sufoca a competitividade das indústrias, e leva sua economia a um precoce e acelerado processo de desindustrialização?

Que país é este na qual a excessiva carga tributária e a péssima estrutura de tributos e impostos, resultam num ambiente de permanente litígio entre o fisco e os contribuintes, além de um ambiente de insegurança jurídica, por conta das frequentes mudanças de leis, normas, e regras?

Que país é este onde a Justiça demora mais de uma década para concluir o julgamento de um processo, e que em muitas vezes sem o menor critério, determina em primeira instância a desconsideração da pessoa jurídica litigante e permite a penhora de bens de pessoas físicas e jurídicas que remotamente tem a ver com a dívida fiscal, trabalhista, ou financeira em questão?

Que país é este no qual governadores eleitos pelo povo, defendem publicamente incentivos tributários inconstitucionais às importações por meio de seus Estados, mesmo sabendo que, por conta dessa ganância fiscal, estarão levando a eliminação de empresas e empregos industriais nos seus Estados vizinhos?

Que país é este que mais pune do que incentiva as atividades de exportação, inovação tecnológica e de investimento produtivo, pois tributa o investimento na origem, ao invés de estimulá-lo com isenções e facilidades, que reconhece o resíduo tributário nas exportações, mas pouco ou nada faz para ressarcir aos exportadores os créditos tributários acumulados ao longo da cadeia produtiva exportadora?

Que país é este que, apesar de ser hoje em dia uma das maiores economias do planeta, ainda oferece um baixíssimo nível de escolaridade à sua população, e no qual 40% de suas residências ainda não têm acesso aos serviços de saneamento básico de água e esgoto?

Muitas outras perguntas da mesma espécie poderiam ser formuladas caso o espaço permitisse, mas poderíamos responder a todas elas com a mesma decepção:
este país infelizmente é o Brasil. Seremos nós capazes de mudar a curto prazo esse hostil ambiente de negócios e assim promover nosso crescimento econômico de forma saudável e sustentável?

Cabe a cada um de nós, responsáveis pela parte e pelo todo do que fazemos no dia a dia, responder a esta última pergunta. A próxima geração de brasileiros poderia não mais pertencer ao país do futuro, mas sim ao país do presente.

Roberto Giannetti da Fonseca é economista e empresário, presidente da Kaduna Consultoria e diretor-titular de Relações Internacionais e de Comércio Exterior da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).

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