"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

março 16, 2012

Barris de petróleo ou de pólvora?


Está, de novo, vazando petróleo no litoral brasileiro.

No país do pré-sal, derrames de óleo e outros materiais poluentes usados na exploração estão se tornando rotina. O Brasil não tem dado mostras de que está preparado para ser um superprodutor petrolífero, apesar do discurso ufanista do governo.

A Chevron - que se envolvera num vazamento de 3,4 mil barris de petróleo em novembro passado - ontem relatou um novo incidente e decidiu interrompeu suas operações no país. Segundo a companhia, teriam escapado 5 (cinco!) litros de óleo, ao longo de uma fissura de 800 metros de extensão.

É difícil crer que, pelo lançamento de óleo equivale a duas garrafas e meia de refrigerante no oceano, uma empresa do porte da norte-americana tenha suspendido um negócio bilionário. No acidente de cinco meses atrás, para ficar na mesma medida, o vazamento somara 272 mil garrafas de guaraná - ou 544 mil litros. Há algo turvo neste mar.

É mais que sabido que a indústria do petróleo é uma das atividades econômicas de maior potencial poluente. Por isso, os cuidados precisam ser multiplicados. No caso brasileiro, em que se ingressa num ambiente nunca antes explorado no mundo (o das águas ultraprofundas), o risco aumenta bastante.

Nossa estrutura de prevenção, inclusive a da Petrobras, não parece, porém, à altura. Só neste ano, a estatal já registrou cinco acidentes em suas plataformas. No total, cerca de 130 mil litros de óleo foram derramados. Em janeiro, 25 mil litros escorreram na Bacia de Santos, marcando o primeiro vazamento do pré-sal - o que rendeu multa de R$ 50 milhões à empresa.

No início da semana, 28 mil litros de fluido de perfuração - um material poluente - vazaram de uma plataforma da estatal em Campos. Quase ninguém soube, porque a Petrobras omitiu. "Tem algo muito errado acontecendo, porque os acidentes estão se repetindo e nem a ANP nem o Ibama estão repensando a estratégia de prevenção de acidentes no país", afirma o oceanógrafo David Zee, da Uerj, a O Globo.

A rotina de acidentes de trabalho nas atividades da Petrobras também é assustadora. Segundo o Sindicato dos Petroleiros do Norte Fluminense, a média é de quatro por dia, e somente na Bacia de Campos. Nos últimos 15 anos, 119 profissionais morreram em atividade por lá; só em 2011, foram 17 - contra cinco nos EUA e nenhum na Noruega ao longo de dois anos.

O Brasil sonha com a riqueza de ser um dos maiores produtores de petróleo do mundo, mas ainda não acordou para os riscos e desafios que isso implica. O pré-sal foi anunciado com pompa pelo então presidente Lula há mais de quatro anos. Até hoje, contudo, suas reservas dormitam a mais de 7 mil metros abaixo da superfície. A exploração segue lenta.

Pelas regras estipuladas pelo governo petista, a Petrobras será, necessariamente, operadora de todos os poços, com participação de pelo menos 30%. Como a empresa tem um megaplano de investimentos (US$ 224,7 bilhões até 2015) para cumprir, toca a empreitada do pré-sal em banho maria, e, com isso, segura os demais interessados.

A estatal também se vê obrigada a honrar outras incumbências que o governo federal lhe impôs, numa sobrecarga que atravanca seu crescimento. Um destes fardos são as contratações de sondas de exploração no país, com exigência de conteúdo mínimo nacional. O problema é que ainda não há aqui quem as construa.

O governo Lula gabou-se de ter ressuscitado a indústria naval no país, mas quase tudo o que se vê no setor ainda é virtual. O Estaleiro Atlântico Sul, em Pernambuco, não conseguiu pôr um equipamento no mar - apesar de Lula ter "lançado" um navio, o João Cândido, na campanha eleitoral de 2010.

O Jurong Aracruz, no Espírito Santo, só tem mato. "Não adianta sonhar, sonho não constrói sonda", admite Graça Foster ao Valor Econômico hoje.

Petróleo é coisa séria.
Seja pelas riquezas e pelo rumo decisivo que pode dar a uma nação, seja pelas gravíssimas ameaças que pode trazer ao meio ambiente.

Na ânsia de ser um novo superprodutor, o Brasil brinca de ser gente grande, enquanto o óleo vaza e espalha sujeira - e não apenas no mar.

Fonte: Instituto Teotônio Vilela
Barris de petróleo ou de pólvora?

Nenhum comentário: