"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

novembro 16, 2011

Significado & contexto : No "puder" e por "cima". Na era Lula-petista, governar é "cuidar" do povo. "No Brasil, governar é roubar!"...


Diz um velho ditado que "pornografia é uma questão de geografia". Mude-se e veja que o imoral em sua terra, é mandamento alhures. Quando cheguei nos Estados Unidos, pelos idos de 1963, um mentor, que conhecia o Brasil melhor do que eu, avisou:
quando você for convidado para um jantar, jamais vá sozinho, como se faz no Brasil.
Vá com sua mulher, como fazemos a aqui.


Tomei a observação como um misto de reproche e aula de etiqueta, mas não perdi de vista a sua dimensão cultural, pois o que estava em pauta eram modos diversos de reunião.

As "turmas" brasileiras - geralmente agrupadas na "rua" (em bares e botequins) - congregavam homens. Em Cambridge, Massachusetts, entretanto, eu - um tanto perturbado - aprendi uma sociabilidade mais caseira, aberta e mais igualitária, da qual minha mulher participava comigo e não por minha causa - ao meu lado, não atrás de mim.

Descobri que o elo matrimonial era compulsório na tal América onde havia divórcio & assédio e não existia a boa e emocionante "cantada"; mas era opcional do meu Brasil de Niterói, então chamada de "cidade sorriso", hoje uma urbe desgovernada.

Como levar a "esposa" (sobretudo se ela era bela e inteligente) a uma festa onde se falava de tudo - principalmente de "política" - e, entrementes, um sujeito queria "comer a mulher do outro" como me ensinou um outro mentor importante, mas obviamente brasileiro?


Altere o contexto, faça a passagem, e os motivos e os papéis mudam de significado.

Governar é administrar a coisa pública com a legitimidade dos votos da maioria. Mas na era Lula-petista, governar é "cuidar" do povo.

Voltamos, com ajuda das ONGs lidas à brasileira, à temporada do "clã político" de Oliveira Vianna e da família patriarcal de Gilberto Freyre, com pitadas ideológicas que racionalizam posições, já que ganhar muito em pouco tempo é bom demais.

Os dirigentes são pais e mães do povo.
Sobretudo dos "pobres" - que têm a sua posição social solidificada por uma carteirinha de plástico.

Que os "pobres" devam ser reparados eu não tenho a menor dúvida.
A questão, como se descobriu na Inglaterra Vitoriana, dos Gladstones e dos Disraelis, é saber quem é efetivamente pobre e, mais complicado que isso, como tirar o assistido da passividade contida no assistencialismo para integrá-lo ativamente no sistema produtivo.


Meu velho pai, que foi um homem soturno, me disse um dia, seco como uma folha de chá:
"No Brasil, governar é roubar!"
Fiquei chocado, mas, entre a sua opinião e a dos meus mentores socialistas e comunistas, pendemos mais para o governar como sinônimo do "cuidar" e do "roubar" do que para o do liberal, competitivo e, dizem, eficiente estilo de governar administrando ou gerenciando.


De um lado, há o personalismo que permeia a centralização nacional que tem uma burocracia e uma legislação sofisticada, mas que opera de modo desigual, confirmando e reafirmando, em vez de desconstruir, a desigualdade.

No Brasil, o aparelho burocrático não funciona sine ira et studio (sem cólera ou parcialidade), como queriam Tácito e Weber.

Antigamente dizia-se "aos amigos tudo aos inimigos a lei"; hoje somos mais eficazes (e cínicos), pois simplesmente "blindamos" quem pratica os "malfeitos".


Malfeitos.
Eis, caros leitores, um eufemismo brutalmente pueril, regressivo emocionalmente, que situa a nossa moralidade pública no nível das fábulas infantis dos pequenos príncipes e filósofos! Ministros, senadores, governadores, deputados, prefeitos e secretários de governo que montam esquemas e repassam para agentes dos seus partidos, mascarados de ONGs, verbas do povo, não estão praticando veniais "malfeitos".

Estão é roubando, como dizia papai.
Roubando recursos que são da sociedade e do Brasil, não do governo.
Dai essa centralização burocrática pervertida porque, diferentemente das originais, ela não opera impessoal e anonimamente, pois o que conta é quem fez e não o que foi feito.


Resumo da ópera:
em outros mundos, a burocracia é a "jaula de ferro" que bloqueia o carisma e reduz a "Política" (com "p" maiúsculo) - lida, entre outros, por Max Weber - como a esfera social da criatividade e da transformação no mundo.
No Brasil, entretanto, esse conflito não existe.

A burocracia está inteiramente sujeita ao político.
Um político que se reduz ao "pequeno poder" das agendas do velho projeto pessoal ibérico de ficar rico (tornando-se ao mesmo tempo - eis o Paraíso - inimputável legalmente) ocupando cargos públicos.

Ficando por cima.
Virando, como disse um vereador de Taubaté, o sr. Rodson Lima do PP, que não me deixa mentir, um "príncipe" e, por isso, está agradecido aos seus eleitores que o aristocratizaram.


Ou seja:
no "puder" e por "cima".
O "poder" entre nós é um elevador que só segue para cima, mas à custa da nossa energia.
Gastando a eletricidade e a dignidade dos cidadãos comuns plantados no chão.

Roberto DaMatta O Globo

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