A passagem do 100º dia de governo costuma ser carregada de simbolismo. Menos pelo que efetivamente se fez no período, que é curto, e mais pelos rumos que o novo administrador costuma imprimir à condução da gestão iniciante.
Os cem primeiros dias de Dilma Rousseff à frente do Palácio do Planalto, completados ontem, foram recebidos com certo entusiasmo por parte da opinião pública.
Mas é um erro imaginar que essa exibição de boa vontade signifique que ela faça um grande governo.
Ao contrário.
Assombra a falta de ímpeto demonstrada por Dilma até agora, as contradições em relação ao mundo cor-de-rosa que vendeu aos eleitores no ano passado, as indecisões em relação ao enfrentamento de problemas que se agigantam.
Uma análise mais detida mostra que o enaltecimento a Dilma se deve, principalmente, a correções de rumo de excessos do governo Lula. Abandonou-se o caráter estridente e espalhafatoso em nome da acertada austeridade pessoal. Isso é bom. Também deixaram de existir o alinhamento automático a ditadores fratricidas e o antiamericanismo da nossa política externa. É alguma coisa, mas muito pouco.
A louvação ao governo atual acaba servindo para turvar a visibilidade de seus muitos equívocos. O pior deles é a tibieza com que a inflação tem sido combatida. A equipe econômica de Dilma não tem sabido enfrentar com eficácia o crescimento de um monstro com potencial de arruinar nossas formidáveis conquistas sociais das últimas décadas.
Outro problema sério, a apreciação excessiva do real junto ao dólar não tem sido atacada de maneira apropriada. Medidas como o aumento de impostos para empréstimos feitos no exterior se mostraram inúteis - embora tenham, convenientemente, servido para engordar o caixa do governo federal. Resta claro que governo não sabe se ataca a inflação ou a valorização cambial, que corrói a indústria nacional, mas serve para segurar os preços.
Bate-se cabeça.
Com conveniente discrição, promessas anunciadas durante a campanha de 2010 vão sendo, uma a uma, deixadas de lado. Para começar, a pretensão de acabar definitivamente com a miséria no país já foi colocada na geladeira pela presidente, de maneira trivial, como quem não quer nada...
Sobriamente, muitos outros compromissos parecem ter ido para o arquivo morto, como a ideia de incluir eletrodomésticos no Minha Casa Minha Vida. Na realidade, o governo fez o contrário: paralisou o programa para famílias mais carentes.
A política habitacional é apenas um entre os muitos casos de descarte de compromissos firmados com o eleitor no período de busca aos votos. Logo após a eleição, O Globo listou 190 deles. Boa parte ainda não passa de palavras vãs.
Está na relação, por exemplo, a promessa de "não fazer o ajuste fiscal". O compromisso, como se sabe, foi quebrado com o anúncio de uma tesourada de R$ 50 bilhões no Orçamento, feito em fevereiro.
Sabe-se que a necessidade de adequação das finanças deve-se aos excessos de gastos praticados no governo anterior com intuito quase exclusivo de garantir a cadeira presidencial para Dilma.
Outra palavra empenhada em campanha, "trabalhar fortemente para diminuir os juros", já foi quebrada duas vezes neste ano e nossa taxa continua sendo a mais alta do mundo. Já a promessa de "privilegiar critérios técnicos para definir as nomeações" ficou de lado frente à fúria fisiologista de alguns aliados: quase um terço dos ministros escolhidos por Dilma deve alguma explicação por envolvimento em escândalos.
Os cem primeiros dias do atual governo também se notabilizaram pela tentativa de fazer o Estado controlar a iniciativa privada, da qual o caso da troca de comando na Vale pode ser apenas a ponta do iceberg.
Concomitantemente, dentro da nova filosofia, bilhões de reais dos brasileiros correm o risco de virar pó em aventuras sem lastro, como a construção do trem-bala (outra promessa eleitoral que não para em pé).
Do PAC já nem se fala mais.
Seja por causa da lentidão e da inoperância que marcam o programa, seja até por constrangimento. Vai se conhecendo, aos poucos, as condições degradantes que vigoram nos canteiros de obras das ações do programa, como ficou patente tanto nos movimentos reivindicatórios nascidos nas usinas de Rondônia, quanto no centro desenvolvido do país, como mostra a edição de hoje da Folha de S.Paulo.
É certo que cem dias pode ser cedo para cobrar o cumprimento de promessas firmadas em uma campanha eleitoral. Mas é tempo suficiente para perceber que, em muitas ações fundamentais, o Brasil corre na contramão do que se anunciava e se exige.
Fonte: ITV
Os cem primeiros dias de Dilma Rousseff à frente do Palácio do Planalto, completados ontem, foram recebidos com certo entusiasmo por parte da opinião pública.
Mas é um erro imaginar que essa exibição de boa vontade signifique que ela faça um grande governo.
Ao contrário.
Assombra a falta de ímpeto demonstrada por Dilma até agora, as contradições em relação ao mundo cor-de-rosa que vendeu aos eleitores no ano passado, as indecisões em relação ao enfrentamento de problemas que se agigantam.
Uma análise mais detida mostra que o enaltecimento a Dilma se deve, principalmente, a correções de rumo de excessos do governo Lula. Abandonou-se o caráter estridente e espalhafatoso em nome da acertada austeridade pessoal. Isso é bom. Também deixaram de existir o alinhamento automático a ditadores fratricidas e o antiamericanismo da nossa política externa. É alguma coisa, mas muito pouco.
A louvação ao governo atual acaba servindo para turvar a visibilidade de seus muitos equívocos. O pior deles é a tibieza com que a inflação tem sido combatida. A equipe econômica de Dilma não tem sabido enfrentar com eficácia o crescimento de um monstro com potencial de arruinar nossas formidáveis conquistas sociais das últimas décadas.
Outro problema sério, a apreciação excessiva do real junto ao dólar não tem sido atacada de maneira apropriada. Medidas como o aumento de impostos para empréstimos feitos no exterior se mostraram inúteis - embora tenham, convenientemente, servido para engordar o caixa do governo federal. Resta claro que governo não sabe se ataca a inflação ou a valorização cambial, que corrói a indústria nacional, mas serve para segurar os preços.
Bate-se cabeça.
Com conveniente discrição, promessas anunciadas durante a campanha de 2010 vão sendo, uma a uma, deixadas de lado. Para começar, a pretensão de acabar definitivamente com a miséria no país já foi colocada na geladeira pela presidente, de maneira trivial, como quem não quer nada...
Sobriamente, muitos outros compromissos parecem ter ido para o arquivo morto, como a ideia de incluir eletrodomésticos no Minha Casa Minha Vida. Na realidade, o governo fez o contrário: paralisou o programa para famílias mais carentes.
A política habitacional é apenas um entre os muitos casos de descarte de compromissos firmados com o eleitor no período de busca aos votos. Logo após a eleição, O Globo listou 190 deles. Boa parte ainda não passa de palavras vãs.
Está na relação, por exemplo, a promessa de "não fazer o ajuste fiscal". O compromisso, como se sabe, foi quebrado com o anúncio de uma tesourada de R$ 50 bilhões no Orçamento, feito em fevereiro.
Sabe-se que a necessidade de adequação das finanças deve-se aos excessos de gastos praticados no governo anterior com intuito quase exclusivo de garantir a cadeira presidencial para Dilma.
Outra palavra empenhada em campanha, "trabalhar fortemente para diminuir os juros", já foi quebrada duas vezes neste ano e nossa taxa continua sendo a mais alta do mundo. Já a promessa de "privilegiar critérios técnicos para definir as nomeações" ficou de lado frente à fúria fisiologista de alguns aliados: quase um terço dos ministros escolhidos por Dilma deve alguma explicação por envolvimento em escândalos.
Os cem primeiros dias do atual governo também se notabilizaram pela tentativa de fazer o Estado controlar a iniciativa privada, da qual o caso da troca de comando na Vale pode ser apenas a ponta do iceberg.
Concomitantemente, dentro da nova filosofia, bilhões de reais dos brasileiros correm o risco de virar pó em aventuras sem lastro, como a construção do trem-bala (outra promessa eleitoral que não para em pé).
Do PAC já nem se fala mais.
Seja por causa da lentidão e da inoperância que marcam o programa, seja até por constrangimento. Vai se conhecendo, aos poucos, as condições degradantes que vigoram nos canteiros de obras das ações do programa, como ficou patente tanto nos movimentos reivindicatórios nascidos nas usinas de Rondônia, quanto no centro desenvolvido do país, como mostra a edição de hoje da Folha de S.Paulo.
É certo que cem dias pode ser cedo para cobrar o cumprimento de promessas firmadas em uma campanha eleitoral. Mas é tempo suficiente para perceber que, em muitas ações fundamentais, o Brasil corre na contramão do que se anunciava e se exige.
Fonte: ITV
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