"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

abril 18, 2010

CLASSES ALTA/MÉDIA/BAIXA - IGNORÂNCIA É FORÇA

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Desde que a história começou a ser escrita, e provavelmente desde o fim do
Período Neolítico, tem havido três classes no mundo: Alta, Média e Baixa.

Têm-se subdividido de muitas maneiras, receberam inúmeros nomes
diferentes, e sua relação quantitativa, assim como sua atitude em relação às
outras, variaram segundo as épocas; mas nunca se alterou a estrutura
essencial da sociedade.

Mesmo depois de enormes comoções e
transformações aparentemente irrevogáveis, o mesmo diagrama sempre se
restabeleceu, da mesma forma que um giroscópio em movimento sempre
volta ao equilíbrio, por mais que seja empurrado deste ou daquele lado.

- Júlia, está acordada? - indagou Winston.
- Estou, meu amor. Estou ouvindo. Vai lendo. É maravilhoso.
Ele continuou a ler:

Os objetivos desses três grupos são inteiramente irreconciliáveis. O objetivo
da Alta é ficar onde está. O da Média é trocar de lugar com a Alta. E o objetivo
da Baixa, quando tem objetivo - pois é característica constante da Baixa viver
tão esmagada pela monotonia do trabalho cotidiano que só
intermitentemente tem consciência do que existe fora de sua vida - é abolir
todas as distinções e criar uma sociedade em que todos sejam iguais.

Assim, por toda a história, trava-se repetidamente uma luta que é a mesma
em seus traços gerais. Por longos períodos a Alta parece firme no poder,
porém mais cedo ou mais tarde chega um momento em que, ou perde a fé em si própria ou sua capacidade de governar com eficiência, ou ambas.

É então derrubada pela Média, que atrai a Baixa ao seu lado, fingindo lutar pela
liberdade e a justiça. Assim que alcança sua meta, a Média joga a Baixa na
sua velha posição servil e transforma-se em Alta
. Dentro em breve, uma nova
classe Média se separa dos outros grupos, de um deles ou de ambos, e a luta
recomeça.

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Das três classes, só a Baixa nunca consegue nem êxito temporário na
obtenção dos seus ideais.

Seria exagero dizer que não se registra na história
progresso material. Mesmo hoje, neste período de declínio, o ser humano
comum é fisicamente melhor do que há alguns séculos.

Mas nenhum
progresso em riqueza, nenhuma suavização de maneiras, nenhuma reforma
ou revolução jamais aproximou um milímetro a igualdade humana.

Do ponto
de vista da Baixa, nenhuma modificação histórica significou mais do que uma
mudança do nome dos amos.

Por volta dos fins do século dezenove, a recorrência do ciclo se tornara óbvia
a muitos observadores.

Surgiram então escolas filosóficas que interpretavam
a história como um processo cíclico e protestavam que a desigualdade era a
lei inalterável da vida humana.

Essa doutrina, naturalmente, sempre teve
seus adeptos, mas na maneira pela qual foi então exposta havia uma
transformação significativa.

No passado, fora uma doutrina especificamente da Alta a necessidade de uma
forma hierárquica de sociedade.

Fora pregada por reis, aristocratas e
sacerdotes, advogados, etc., que a parasitavam, e fora geralmente amaciada
por promessas de recompensa num mundo imaginário de além-túmulo.

A Média, enquanto lutou pelo poder, sempre fez uso de termos tais como
liberdade, justiça e fraternidade.

Agora, todavia, o conceito de fraternidade
humana começou a ser atacado pelos que não se encontravam em posição de
mando, porém esperavam conquistá-las dentro em breve.

No passado a Média
fizera revoluções sob a bandeira da igualdade, estabelecendo nova tirania
assim que derrubava a antiga.

Com efeito, os novos grupos Médios
proclamavam antecipadamente sua tirania.

O socialismo, teoria aparecida no
ínício do século dezenove é o último elo de uma corrente de pensamento que
se iniciava nas rebeliões dos escravos antigos, ainda estava profundamente
infeccionado pelo Utopismo do passado.

Mas em cada variante de Socialismo
que apareceu de 1900 para cá, o propósito de estabelecer a liberdade e a
igualdade ia sendo abandonado cada vez mais abertamente…

1984 - George Orwell

.MB

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