"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

março 11, 2015

A 'ELITE' QUE VAIA DILMA


A presidente pôde ver de perto que 'elite' é esta que tanto reclama dela: pedreiros, pintores, faxineiras, marceneiros, modelos e empresários. Ou seja, uma amostra do povo brasileiro

Sempre que é questionado, o PT tenta desqualificar a crítica e circunscrevê-la a grupos isolados que, segundo o discurso oficial, "não representam a sociedade". Foi assim nas manifestações de 2013, foi assim na Copa do Mundo e novamente agora após o panelaço de domingo. Como sempre, a fábula não resiste a um sopro da realidade.

Os defensores do governo sustentam que os protestos são de uma elite que reclama "de barriga cheia". Coisa de dondoca que não tem mais o que fazer ou de playboy mimado. (Os termos aqui empregados parecem conversa de adolescente, mas o linguajar dos petistas é assim mesmo: pueril, básica, primária.)

Ontem, em São Paulo, a presidente da República pôde ver de perto que "elite" é esta que tanto reclama do governo dela. Lá estavam - segundo registros da imprensa - pedreiros, pintores, faxineiras, montadores de estandes, marceneiros, modelos, comerciários e empresários. Ou seja, lá estava uma amostra do povo brasileiro.

A Dilma Rousseff, os manifestantes ("dezenas", segundo os jornais) dedicaram palavras carinhosas como "vagabunda", "bruxa" e "ladra". Foi uma resposta ao desgoverno a que estamos assistindo e foi, especialmente, uma réplica indignada ao escárnio travestido de pronunciamento à nação que a presidente levou à TV na noite de domingo.

Os sinais do constrangimento ficaram visíveis. Enquanto Dilma mostrava-se abatida por mais um apupo sofrido, o cerimonial do Palácio do Planalto tentava apartar a imprensa do protesto. Não funcionou. A presidente preferiu abortar a caminhada que fazia pela feira e correu para o conforto do auditório onde faria sua palestra. Lá encontrou vazios metade dos 799 lugares.

Os limites da narrativa enganadora do PT também foram expressos no depoimento dado ontem por Pedro Barusco, ex-gerente da Petrobras, à CPI que investiga a estatal. Mais uma vez ele deixou claro: o esquema criminoso foi instalado na empresa de forma "institucionalizada" com a chegada do PT ao governo. O que houve antes foram "atitudes isoladas" do engenheiro.

Barusco é o mesmo que revelou que mais de meio bilhão de reais podem ter sido desviados da Petrobras para o PT. Ontem, ele agregou que US$ 300 mil de propina foram repassados à campanha que elegeu Dilma em 2010 pela firma holandesa SBM. Não há qualquer registro de doação desta empresa na Justiça Eleitoral.

Dilma deve estar percebendo, da pior maneira possível, os limites de um governo cuja existência sempre se ancorou em marketing. Se acha que o que viu e ouviu até agora nas ruas é exagero, é melhor a presidente esperar pelo que vem por aí. Se as promessas não viram realidade, se a vida torna-se cada dia mais difícil, se o quadro geral é cada vez mais desalentador, a resposta do povo vem a galope. Motivos para protestar não faltam.

Este e outros textos analíticos sobre a conjuntura política e econômica estão disponíveis na página do Instituto Teotônio Vilela

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