"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

novembro 29, 2013

Em vez de “fazer o diabo” para ganhar a eleição, melhor seria fazer as contas de quanto isso vai custar ao país.



O Banco Central (BC) fez seu papel.
Demorou, mas fez.

Ao aplicar mais um aperto de 0,5 ponto percentual na taxa básica de juros (Selic), na reunião de quarta-feira do Comitê de Política Monetária (Copom), a autoridade completou a delicada tarefa a que se impôs de devolver as taxas ao nível de janeiro de 2012, ou o mais perto possível disso. Aparentemente forçado a participar da condução heterodoxa de uma política econômica que o governo Dilma Rousseff e alguns de seus conselheiros costumam chamar de desenvolvimentista, o BC afrouxou a política monetária.

Desde então, promoveu uma sequência de cortes na taxa até chegar a 7,25% acumulados em 12 meses, sob aplausos de parte da plateia governista, dos míopes de certas academias e de empresários saudosos dos tempos em que podiam remarcar preços sem medo da concorrência.

A ideia é tão velha quanto infeliz: mais importante que um pouco de inflação é o espetáculo do crescimento. E, para apimentar ainda mais o apetitoso banquete da felicidade geral, nada como abrir os cofres do gasto público, como se esse fosse o melhor combustível para a economia, movida a consumo a qualquer custo. Deu errado.

A ilusão da inflação controlada durou pouco. Pelo acumulado em 12 meses, ela havia baixado no primeiro semestre de 2012, caindo de 6,22% para 4,92% entre janeiro e junho, muito perto da meta de 4,5% estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) para aquele ano. Foi tentador esquecer que as rédeas curtas da política monetária servem para inibir saltos do dragão para fora da jaula, motivados por fatores nem sempre controláveis, como a sazonalidade dos alimentos e as piruetas do câmbio.

Junho de 2013 (um ano depois) não foi mês de surpresas e tensões apenas nas ruas. Nas gôndolas do supermercado e nas vitrines das lojas, o consumidor percebeu que o salário tinha perdido poder de compra. A inflação acumulada em 12 meses bateu em 6,7%, rompendo o teto de tolerância (6,5%)


Quatro meses antes, o BC, que havia segurado a Selic desde outubro de 2012 em 7,25%, já tinha percebido que a missão de cumprir as metas de inflação corria risco. Convenceu o governo a retomar o caminho de volta, na expectativa de que teria algum apoio da política fiscal. Ledo engano. Ele pagaria sozinho o preço de ter afrouxado a política monetária tão rápido e de ter demorado tanto para inverter a curva, enquanto o governo continuou gastando e golpeando a credibilidade do país.

É por isso que o Brasil vai fechar o ano com taxa básica de juros de 10%, na contramão dos latino-americanos mais bem-sucedidos, como Colômbia (3,25%),
México (3,5%),
Peru (4%)
e Chile (4,5%),
em troca de inflação de 5,8% e crescimento anêmico de no máximo 2,5%.

Só resta esperar que, em 2014, o BC se mantenha alheio ao calendário eleitoral, olhos fixos no centro da meta de inflação de 4,5% e aguente o tranco dos abalos cambiais. Pois, além da pressão das urnas sobre o gasto público no Brasil, a previsão é de alta do dólar e taxas de juros internacionais com o fim da política de irrigação da economia dos EUA. 

Em vez de “fazer o diabo” para ganhar a eleição, melhor seria fazer as contas de quanto isso vai custar ao país.

Correio Braziliense 
 Gastança e retrocesso nos juros

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