"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

fevereiro 28, 2013

Cadastro da miséria : "Trata-se de assunto revestido da maior gravidade, impondo tratamento correto, sério, respeitoso. "

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Tive o privilégio de receber do deputado Ricardo Berzoine elegante refutação ao meu artigo “Erradicar a miséria”, publicado em 22 de janeiro.

Não pretendo medir forças com o parlamentar petista, cuja trajetória política conheço, e a quem admiro desde que dirigiu o Sindicato dos Bancários de São Paulo. As variações da presidente Dilma Rousseff, em torno do tema miséria, me estimulam, porém, a continuar na análise de problema de extrema relevância, cuja solução desejamos em benefício dos mais pobres.

Miséria é vocábulo com diversos significados. 

Tanto expressa estado de grande sofrimento, como carência absoluta de meios de subsistência, penúria, indigência. Além da material, existe miséria moral, de sensibilidade, de caráter, infelizmente comuns na vida pública.

O discurso presidencial procura criar diferenças formais entre miséria real e miséria cadastrada, aquela para a qual o governo voltou atenção. 
A exigência do cadastro não deixa de ser, por si só, fator excludente para ampla quantidade de miseráveis, sem acesso a informações federais, estaduais e até municipais, que os tornem aptos ao cadastramento.

Não nos iludamos. 

Temos, sobretudo na Região Norte, municípios de exageradas dimensões, em grande parte cobertos por florestas protegidas, onde será quase impossível cadastrar os habitantes necessitados. 
Continuarão ainda, e por muito tempo, fora do alcance do governo. 

Veja-se o caso de Oriximiná, do qual tratou o jornal O Estado, no caderno Planeta (20/2/2013). Sua área é de 107.604,4km2, superior à de diversos estados da Federação. Revela a matéria, cujo título é “Floresta rica, população pobre”, a situação dos quilombolas de Cachoeira Pereira “que passam três meses no extrativismo (de castanha) e o restante do ano no ócio”.

O país possui 5.564 municípios, distribuídos entre 27 estados, além do Distrito Federal. Em Minas Gerais, são 853; no Acre, 22; no Piauí, 224. 

O portal “cidades”, do IBGE, revela nomes como Acauã, 
Alvorada do Gurguéia, 
Aroreira do Itaim, 
Barro Duro, 
Peritoró, 
Sambaíba, 
Zé Doca, 
Gurjão, 
Água Nova, 
Bodó, 
Venha Ver, 
Peixe Boi, 
Xupinguará, 
Riachão do Poço, 
Quixabá, 
Cruzeta, 
Encanto, 
Vilaflor, 
Zabelê, 
Mataraca, 
Malta, 
Abaiara, 
Caapiranga, 
Uricuituba, 
Coqueiro Seco, 
Ererê, 
Pindoba, 
Arataca, 
Barro Preto, 
Tanquinho, 
Veredinha, 
Uiramutã, 
Malhada dos Bois, 
Telhas, 
Acaicá. 
São pequenas comunidades, com reduzida população e atividades econômicas de mera subsistência, sem hospitais, 
médicos, 
boas escolas, 
estradas, 
e pouquíssimas pessoas ocupadas e empregadas. 

O governo dispõe da logística para recensear rapidamente os necessitados, fazendo-lhes chegar a bolsa cadastrada dentro dos prazos anunciados?

O projeto de extinção da miséria se ressente do vício que afeta a bolsa família. Oferece algum dinheiro, não muito, nem o suficiente, sem conseguir a inclusão dos beneficiados no mercado de trabalho. Objetiva saciar a fome de famílias com renda per capita mensal inferior a 70 reais, o que é positivo. 

Nada tem a ver, entretanto, com oferta concreta de postos de trabalho. 

Quem é empregado tem direito a salário mínimo, 13º terceiro, fundo de garantia, previdência, vale-transporte. Como estamos em situação análoga à do pleno emprego, é paradoxal que 10% da população, cerca de 19 milhões, continuem à margem do mercado de trabalho, e 2,9 milhões recebam 70 reais.


Conforme diz Luc Ferry, no livro A tentação do cristianismo (Ed. Objetiva, 2011), é através do trabalho que o homem se valoriza e adquire dignidade. Inteligência, beleza, memória, vigor físico, são insuficientes, eis que podem ser colocados a serviço do bem, ou do mal. 

Bolsa família e bolsa miséria devem ser pagas como benefícios transitórios. 

Ao governo cabe agir de forma enérgica, rápida e competente, mas no sentido de levar o desenvolvimento ao interior distante e colocar trabalho remunerador ao alcance de todos. 
 Entrevistado pelo O Estado (20/2/2013) o economista e professor da Unicamp Cláudio Dedecca lembrou que Lula garantiu que a bolsa família erradicaria a miséria. Errou. Na Presidência, a presidente Dilma ficou ciente de que a miséria resiste em escala superior à imaginada.

Milhões continuam sem saúde, água, educação e trabalho. 
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O problema não é retórico para ser resolvido em palanque, com discursos. Trata-se de assunto revestido da maior gravidade, impondo tratamento correto, sério, respeitoso.

Almir Pazzianotto Pinto Correio Braziliense

Um comentário:

To Fora disse...

44 milhões de desempregados e só 5%???????
Onde? Quando? Como?
Por que este povo tem medo da verdade?
Falo estes "economistas" de platão, tipo Mirian Leitão, por exemplo.
Um amigo meu trabalhou no IBGE na era Delfim, já era Petistas antes do PT.
Mentia todas e manipulava tudo, o IBGE.