"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

setembro 03, 2012

Uma geração de crianças sem escola


Números são frios. Nem sempre conseguem transmitir a carga emotiva que carregam. A assertiva vale para dados divulgados pelo Unicef na semana passada.

Segundo levantamento do Fundo das Nações Unidas para a Infância realizado em 25 países (incluído o Brasil), 139 milhões de crianças com idade para cursar o ensino fundamental estavam fora da escola em 2009. A cifra, abstrata, não traduz a dramaticidade do fato.

Concretizadas, as estatísticas mostram a carga de horror que escondem.
Trata-se de sete Austrálias.
Ou 3,5 Argentinas.
Ou 1,5 Alemanha.

É uma multidão de infantes condenados à ignorância, à pobreza, à perpetuação da miséria.
São os excluídos da escola, que se mostra incapaz não só de lhes garantir o acesso e a aprendizagem, mas também de retê-los no sistema.

O Brasil, embora tenha melhorado consideravelmente os indicadores, não está bem na foto. Apesar do esforço de mais de três décadas que assegurou a matrícula de 97% dos meninos e meninas com idade entre 7 e 14 anos, tem contingente de 3,7 milhões de crianças e adolescentes entre 4 e 17 anos longe de cadernos e livros.

Os dados são da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) de 2009, confirmados pelo Censo de 2010.

Vem, pois, em boa hora, o relatório Todas as Crianças na Escola em 2015.
Elaborado pelo Unicef em parceria com a Campanha pelo Direito à Educação, o estudo levanta as causas da exclusão, analisa políticas existentes e apresenta estratégias aptas a responder ao desafio.

O ficar à margem do sistema não se deve a um fator, mas à combinação de vários.

Entre eles, a necessidade de a criança trabalhar para ajudar a família, o despreparo do professor, a má qualidade do material didático, a inadequação dos currículos, a falta de atração da escola. Impõe-se, para superá-los, esforço conjunto de sociedade e governo nos três níveis de poder.

Municípios, estados e União precisam se aliar — independentemente de partido ou coloração política — para pôr fim à vergonha que afasta o país do sonho sempre adiado de apagar o analfabetismo (total e funcional) do território nacional.

Os 5.564 municípios brasileiros escolhem prefeitos em outubro. Alguns se candidatam à reeleição. Outros, ao primeiro mandato. É importante que a sociedade organizada participe ativamente do processo, examine a plataforma dos postulantes, promova debates sobre o assunto e, posteriormente, cobre resultados.

Parafraseando Clemenceau, a educação é importante demais para ser deixada nas mãos dos governantes — sem a implacável fiscalização dos cidadãos.

Correio Braziliense

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