"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

junho 18, 2012

Rio+20: Empurrando com a barriga

EM TERMOS DE SUSTENTAÇÃO AMBIENTAL NOS ÚLTIMOS 20 ANOS COSMÓPOLIS SÓ INVOLUIU.
O Brasil assumiu na semana passada a condução das negociações da Rio+20 e foi logo causando frisson. Apresentou no sábado uma versão desidratada do documento destinado a ser a síntese da conferência.

Nela, as ambições são reduzidas e os prazos, postergados.
É o velho estilo petista de enfrentar problemas:
empurrando com a barriga.


Depois de meses de negociações, os 193 países envolvidos na Rio+20 ainda estão longe de se aproximar de um consenso. Há mais conflito do que acordo, mais controvérsias do que convergências. Apenas questões paralelas obtêm a aprovação unânime exigida pela ONU em seu processo decisório.

Foi neste ambiente que o Brasil, como país-sede da conferência, assumiu a condução do processo negociador na semana passada. A expectativa era de que a diplomacia brasileira desempenhasse uma postura de liderança e conseguisse destravar alguns impasses. Mas bastaram algumas horas para que a frustração prevalecesse.

A proposta apresentada neste fim de semana pelo Itamaraty mostra-se tímida demais para a urgência que a falta de perspectivas de desenvolvimento sustentável para o mundo tal como hoje estão os padrões de produção e consumo exige.

Foram retirados do texto menções à criação de fundos para financiar práticas mais sustentáveis, que desagradavam o grupo de nações mais ricas e atualmente mergulhadas em crise econômica.

Vale lembrar que a Rio+20 começara com estardalhaço trazendo a perspectiva de adoção imediata de um fundo de US$ 30 bilhões, que agora virou fumaça.


A definição de metas e objetivos de desenvolvimento sustentável também foi jogada para frente, mais precisamente para 2015. Questões cruciais como o fim de subsídios a combustíveis fósseis foram igualmente excluídas da nova versão apresentada pelos diplomatas brasileiros.

A reação veio imediata, tanto de parte dos negociadores quanto de entidades da sociedade civil. A proposta brasileira mereceu ampla desaprovação. Com ela, a diplomacia de Dilma Rousseff ganhou até prêmio das entidades ambientalistas: o de "fóssil do dia".

A Climate Action, rede internacional que congrega mais de 700 organizações não governamentais que lutam pela sustentabilidade, considerou que "o Brasil está perdendo a chance de ser uma força frente às ambições crescentes, à esperança e à confiança que o mundo depositou em seus ombros".

O Greenpeace foi mais longe e colocou os negociadores brasileiros na posição de arautos do apocalipse. "Se adotado por completo, o texto (...) condenaria o mundo a um futuro de poluição, destruição e fraude". Vai mal a liderança brasileira...

O descontentamento não foi apenas de radicais ambientalistas. Está também na comitiva europeia, por exemplo. Mesmo o continente atualmente mais prejudicado pela debacle econômica gostaria de ver mais ousadia no Brasil.

"O texto não tem a ambição necessária, sobretudo no que diz respeito ao desenvolvimento sustentável e à economia verde", avaliou Janez Potocnik, comissário da União Europeia para o Meio Ambiente.


Palavras e verbos polêmicos foram substituídos por termos mais amenos pelos negociadores brasileiros. A estratégia poderia ser ferramenta útil para transpor impasses, mas de tão exacerbada acabou por transformar a proposta alternativa apresentada pelo Itamaraty numa saída anódina e, pior, num mau caminho rumo a um necessário mundo mais sustentável.

Na realidade, a comunidade diplomática internacional está sendo apresentada a uma velha prática das gestões do PT: a de sempre deixar para amanhã decisões cruciais para o destino do país, apostando que a maré pode virar por conta própria. Trata-se de uma onipresente e prejudicial lei do menor esforço vigente entre os petistas.

Não é preciso procurar muito para ver paralelos entre a diplomacia protelatória que o Itamaraty pôs em marcha na Rio+20 e as delongas que marcam as decisões - ou melhor, a falta delas - no governo Dilma, assim como já ocorria na era Lula.

Aqui, jogar a solução de um problema para frente tornou-se o esporte preferido da administração federal. Agora, contudo, o que está sendo colocado em xeque não é apenas o futuro do Brasil, e sim o de todo o planeta.


Fonte: Instituto Teotônio Vilela
Rio+20: Empurrando com a barriga

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