"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

outubro 23, 2011

"Causa" comunista vale R$ 25 bilhões


A mobilização do PCdoB para não perder o Ministério do Esporte — ao longo da semana o partido acionou as redes sociais, se articulou no Congresso Nacional e até promoveu um ato de desagravo ao ministro Orlando Silva na noite de sexta-feira, no Rio — embute muito mais do que uma disposição republicana de colaborar com o desenvolvimento do setor no país.

O partido não quer abdicar de um orçamento de quase R$ 25 bilhões a serem administrados pelo coordenador da Copa do Mundo de 2014, figura centrada no titular da pasta.


Com dados atualizados até 14 de outubro, essa é a cifra estimada dos investimentos previstos no PAC Mobilidade Urbana nas obras em portos e aeroportos e no empréstimo do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para a construção das arenas em que serão disputadas as partidas de futebol.

Comparado aos R$ 239 milhões destinados ao longo do primeiro semestre deste ano ao programa Segundo Tempo, principal vitrine do ministério e alvo de investigações na Controladoria-Geral da União (CGU), na Procuradoria-Geral da República (PGR) e na Polícia Federal, o valor destinado ao Mundial é quase 11 vezes maior.


Esse orçamento bilionário, entretanto, não leva em conta outras medidas como as ações de turismo, de marketing e o preço final das concessões dos aeroportos de Brasília, Guarulhos e Viracopos.

Além disso, as arenas contam com dinheiro da iniciativa privada e boa parte dos estádios terão preços finais ultrapassando a casa de R$ 1 bilhão, como é o caso do Itaquerão e do Maracanã, onde acontecerão, respectivamente, os jogos de abertura e de encerramento da Copa de 2014.


Prover a infraestrutura para a organização do Mundial demanda um trabalho coordenado do governo, envolvendo diversas pastas.
Apenas na chamada Gecopa, grupo interministerial formado para acompanhar as obras, há 11 ministérios coordenados pela Casa Civil.

A presença da ministra Gleisi Hoffmann é institucional, pois toda vez que existem dois ou mais ministérios envolvidos em um planejamento, obrigatoriamente a Casa Civil tem de assumir o papel de mediadora.

Mas a nota emitida pela pasta de Gleisi ao longo da semana foi clara ao afirmar que "cabe ao Ministério do Esporte a tarefa de cuidar dos assuntos relativos ao Mundial de 2014".


As articulações do PCdoB para se manter no Ministério do Esporte começaram ainda durante o governo de transição. Outros partidos, especialmente o PT, estavam de olho na pasta.

A presidente Dilma Rousseff estava inclinada a tirar Orlando Silva do comando, passando o bastão para a deputada comunista Luciana Santos (PE), ex-prefeita de Olinda. Naquele instante, cresceram os interesses políticos do presidente do PCdoB, Renato Rabelo.

Apesar de baiano, Orlando tem domicílio eleitoral em São Paulo, estado onde o partido sempre teve papel secundário. A visibilidade daria musculatura eleitoral a alguém que, até o momento, era peça sem expressão no xadrez político paulista.


Rabelo defendeu enfaticamente a manutenção de Orlando. "Ele está a par de todos os processos relativos à Copa.

Poucas pessoas no mundo estão tão capacitadas no tema quanto ele", afirmou Rabelo, após a cerimônia de diplomação da presidente Dilma Rousseff, em dezembro do ano passado.

Mas uma proposta feita por Dilma durante o governo de transição avivou a ambição do PCdoB.

Em reunião com a cúpula partidária, a então presidente eleita propôs que Luciana ficasse no Ministério do Esporte e Orlando Silva fosse remanejado para a Autoridade Pública Olímpica (APO), com status de ministro.


A equação interessou aos militantes comunistas. O orçamento previsto para os Jogos Olímpicos no Rio de Janeiro, em 2016, até o momento, beira os R$ 23 bilhões.

O PCdoB, um partido com apenas 13 deputados e dois senadores, passaria a administrar quase R$ 50 bilhões.

Orlando interessou-se pela troca. Desde quando a APO foi criada, em 2010, o ministro do Esporte passou a considerar a ideia.

Além da possibilidade de tocar um orçamento vultoso, ele teria emprego assegurado até 2018, já que a APO permanecerá operante até dois anos após a realização dos jogos para responder a quaisquer questionamentos.


Frustração
No entanto, o PT, especialmente em São Paulo, minou a ambição de Orlando. Responsável pela montagem do governo Dilma, o então chefe da Casa Civil, Antonio Palocci, ligou para Renato Rabelo para frustrar os planos do dirigente.

"Estão reclamando que o PCdoB vai ficar muito forte, administrando duas pastas na Esplanada. Os aliados não estão gostando", disse ele a Rabelo, por telefone.

Com a negativa do Planalto, o PCdoB defendeu a permanência de Orlando no Esporte. Na semana passada, com o início da crise envolvendo o ministério, o titular da pasta teve o apoio de seu partido reforçado.


Não é apenas a questão econômica que move o PCdoB. Manter-se à frente de projetos como as Olimpíadas e a Copa do Mundo gera dividendos políticos importantes.

No Rio, o prefeito Eduardo Paes (PMDB) desidratou a APO para cuidar, ele próprio, das licitações e dos canteiros de obras da Rio 2016. Está com a reeleição para a prefeitura no ano que vem muito bem encaminhada e aposta no sucesso dos Jogos na Cidade Maravilhosa para tornar-se um candidato praticamente imbatível ao governo do Estado em 2018.


Desilusão
O esvaziamento do poder da APO levou o ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles a ficar desanimado com a possibilidade de assumir o cargo. Ele queria ser o grande gerente dos Jogos Olímpicos.

Desiludido, pediu à presidente Dilma para ser apenas o indicado do governo federal no Conselho de Governança da APO.
Há duas semanas, filiou-se ao PSD e poderá ser o candidato do partido à prefeitura de São Paulo.
Paulo de Tarso Lyra Correio Braziliense

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