Os brasileiros mostraram ontem que não perderam sua capacidade de se indignar. As marchas anticorrupção programadas ao redor do país tiveram boa adesão e a de Brasília chegou a rivalizar com o desfile militar da Independência.
Podem ter sido as primeiras manifestações mais explícitas de que a sociedade não tolera a forma como o bem público vem sendo tratado.
O ato mais expressivo ocorreu na capital federal. Enquanto militares marchavam de um lado da Esplanada, cerca de 25 mil pessoas protestavam do outro. Incomodada, a segurança presidencial interpôs imensos tapumes de mais de 2 metros de altura para impedir que as autoridades divisassem os manifestantes. Barras de metal isolaram os protestos.
As marchas anticorrupção nasceram voluntariamente e assim devem continuar a prosperar. Usaram instrumentos de mobilização contemporâneos, como as redes sociais, passando ao largo das formas tradicionais. Também assim surgiram, por exemplo, os movimentos da primavera árabe e os protestos por melhor educação no Chile.
Ao contrário do que gostariam muitos petistas, as manifestações de ontem não foram invenção da mídia. Foram atos espontâneos que pipocaram pelos quatro cantos do país, partindo de pessoas que se cansaram de ver o estado atual de deterioração das coisas.
Os manifestantes anticorrupção independem de líderes; a indignação é combustível suficiente para motivá-los. Os protestos de ontem não tiveram cor partidária; o que moveu os participantes foi a repulsa à roubalheira, à corrupção, à ocupação desenfreada da máquina pública por interesses espúrios.
"Os atos de ontem indicam uma reação estimulante e cidadã contra os níveis alarmantes de desrespeito e desfaçatez demonstrados por autoridades no trato com o dinheiro e os interesses da coletividade", comenta a Folha de S.Paulo em editorial.
Entidades como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e a Associação Brasileira de Imprensa (ABI) reforçaram o movimento. Não por coincidência são as mesmas que, quase vinte anos atrás, se mobilizaram pelo impeachment de Fernando Collor de Mello.
Em contrapartida, organizações antes inflamadas e dispostas a gritar "contra tudo o que está aí" hoje se refestelam nas benesses oficiais. A UNE engorda seus cofres com polpudos repasses de verba federal; a CUT encastela-se na máquina pública e a maior parte das demais centrais se regozija com o imposto sindical criado pela gestão petista.
"Alguns militantes trocaram de lado: das marchas anticorrupção no passado para as cadeias da Polícia Federal e as denúncias do Ministério Público, hoje", continua o editorial da Folha.
Recentemente, em meio ao turbilhão de falcatruas que assola o governo petista, um comentarista do jornal espanhol El Pais mostrou sua estupefação com a baixa capacidade de os brasileiros se indignarem. Àquela altura apenas dois dos quatro ministros de Estado demitidos do governo Dilma por corrupção haviam perdido o emprego.
Os acontecimentos de ontem parecem indicar que algo começa a mudar. Foi apenas um primeiro passo, ainda tímido para as proporções que a indignação contra a corrupção já vem tomando na opinião pública. Mas, neste 7 de setembro, a sociedade brasileira mostrou que quer ver o país independente, e não submetido às mazelas com que tem sido governado nos últimos anos.
Fonte: Instituto Teotônio Vilela
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