Eu tinha, então,18 anos.
Em ato público na Universidade Católica, no Recife, dom Hélder Câmara discursava sobre o iminente fim da ditadura no Brasil.
E alertava os jovens estudantes para os riscos de ações extremistas que levassem a um possível retrocesso político. Recém-chegado do interior de Pernambuco, eu fazia jornalismo e já havia lido e ouvido muito sobre o então arcebispo.
Principalmente de sua luta destemida ao lado dos que defendiam a volta da democracia. Mas, naquela noite, ao vê-lo e ouvi-lo pela primeira vez ao vivo, eu me decepcionara.
É que eu ainda não havia entendido o verdadeiro sentido da coragem de um Hélder, de um Gandhi, de um Martin Luther King.
Essa gente que ousou desafiar o status quo de peito aberto.
Cuja única arma eram o verbo, as ideias (e não a verba surrupiada dos cofres públicos). Que apostava no senso de justiça dos homens.
Que fazia intransigente defesa da paz.
Não importava quantos tanques e soldados os poderosos pusessem nas ruas.
Eles os enfrentavam desarmados.
Na linha de frente.
Não se escondiam em esgotos nem encarregavam fanáticos de explodir aviões e carros-bombas para matar inocentes.
Nunca pregaram o extermínio ou tentaram calar a voz de ninguém.
Quer fosse rico,
pobre,
branco,
preto,
amarelo,
mulher,
homem,
gay.
Opunham-se à opressão, às desigualdades
sociais, à discriminação. Pregavam direitos e oportunidades iguais para todos. Vou reforçar: para todos.
Eu, então, um jovem imbecil de galocha, achava que a verdadeira revolução seria feita pela classe operária. Com o extermínio da burguesia e o controle dos meios de produção pelo Estado socialista, libertário, que enfim instalaria uma sociedade mais justa e igualitária na Terra. Como era tolo, meu Deus!
Quando muito mais tarde comecei a descobrir a verdadeira natureza dos revolucionários que eu admirava, veio a decepção.
Eram tão tiranos quanto qualquer ditador de direita.
Liberdade?
Só a de pensar igual a eles.
Pensou diferente?
Paredão.
Prisão.
Tortura.
Campos de concentração.
Com muita sorte, exílio.
Desolado, penso no que a presidente Dilma falou ontem na ONU sobre direitos humanos, sobre como a tortura a fez valorizar a democracia.
Lembro-me de Churchill, Orwell e então chego à inevitável conclusão:
se meus antigos heróis tivessem triunfado, a vida hoje, para mim, pelo menos, certamente seria um inferno.
Para começar, minha profissão nem existiria, pois não há imprensa sem liberdade de opinião e expressão. Haveria internet em um planeta comandado por burocratas e funcionários públicos? Duvido.
Muito menos Facebook e Twitter.
Aliás, nada que permitisse alguém pensar com o próprio cérebro.
Graças a Deus que não triunfamos.
Plácido Fernandes Vieira Correio Braziliense
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