Empresas brasileiras terão que enfrentar a nova crise mais endividadas em moeda estrangeira do que na última turbulência. Ao todo, 212 companhias acumulam US$ 90,2 bi em dívidas, US$ 38,4 bi a mais do que em 2008.
O risco é o repique do dólar
Volume de dívida de grandes empresas em moeda estrangeira é US$38 bi maior que em 2008
Após dois anos de farra na tomada de crédito a juros baixos no mercado internacional, as empresas brasileiras terão que enfrentar a nova turbulência da economia mundial endividadas como nunca em moeda estrangeira.
Um estudo da Economatica feito a pedido do GLOBO mostra que 212 empresas brasileiras de capital aberto acumulavam uma dívida de US$90,256 bilhões ao fim de março deste ano.
Esse montante representa um aumento de 74% - ou mais US$38,4 bilhões - frente ao endividamento delas em setembro de 2008 (US$51,868 bilhões), mês que marcou o ápice da crise financeira internacional com a quebra do banco Lehman Brothers.
Para especialistas, os riscos do pesado endividamento estão nos repiques de alta da moeda americana, um movimento clássico nas crises. Isso elevaria em reais os custos para as empresas pagarem suas dívidas.
Nas últimas três semanas, por exemplo, esses custo subiu R$8,67 bilhões após a valorização do dólar em R$0,10.
Nesse período, a taxa Ptax do Banco Central (BC) - uma cotação do dólar no mercado interbancário - avançou de R$1,534 (menor valor em 12 anos) para R$1,630, efeito do corte da nota de risco dos Estados Unidos pela agência Standard & Poor"s (S&P).
Petrobras eleva dívida em US$29 bi
Entre os economistas, poucos acreditam em uma forte valorização do dólar nos próximos meses. No boletim Focus do BC, por exemplo, a taxa média de câmbio projetada pelo mercado para o fim deste ano permanecia a R$1,60 na segunda-feira passada.
Poucos também acreditavam, contudo, que a moeda americana sairia de R$1,562 para R$2,536 entre julho e dezembro de 2008, o que de fato ocorreu após a quebra do banco Lehman Brothers.
- Eu não acredito numa alta abrupta do câmbio. Mas obviamente conhecemos a história e sabemos que grandes movimentos cambiais acontecem - avalia o economista Armando Castelar, professor da Fundação Getulio Vargas (FGV).
- Uma valorização mais forte do dólar pode ter impacto sobre a saúde financeira das empresas. Foi o que aprendemos com a experiência:
no pânico, todos correm para a mesma porta.
O avanço do endividamento em moeda estrangeira foi liderado pela Petrobras.
A estatal elevou em US$29,2 bilhões sua dívida em dólares nos últimos três anos, para US$44,9 bilhões ao fim de março passado. Em janeiro, por exemplo, a companhia captou US$6 bilhões no mercado de dívida externa, com emissão de bônus.
Outras empresas também tiveram forte aumento da dívida frente a setembro de 2008, como a Telemar Norte Leste (mais US$3,3 bilhões),
Fibria (US$2,6 bilhões)
e JBS (US$2,17 bilhões).
Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating, explica que esse forte aumento tem origem no casamento do acelerado crescimento da economia brasileira e uma farta oferta de crédito no mercado internacional.
- O Brasil saiu na frente após a crise, com bons números de emprego, produção e demanda por investimentos. Como aqui os juros são altos, as empresas foram pegar empréstimos nos EUA, Europa, Japão, que estão com juros baixíssimos para incentivar suas economias - explica Agostini. - O Brasil foi um dos maiores receptadores de crédito externo no mundo.
Proteção mais
cara após medidas
Para evitar perdas com o aumento do dólar, as empresas realizam em bancos uma espécie de seguro contra os solavancos da moeda, a chamada operação de hedge (proteção, em inglês). Os bancos assumem o risco da oscilação do dólar, operando contratos no mercado futuro, em troca de um prêmio pelo risco.
Mas esse prêmio é caro.
Por isso, muitas companhias acabam protegendo apenas parte das dívidas em moedas estrangeiras.
- Quem tem dívida muito longa, como dez anos, paga uma taxa gigantesca para proteger-se do câmbio. Por isso, empresas não cobrem 100% do que devem em dólar. Elas assumem uma parte do risco e de eventual perda - explica Ivan Nacsa, da consultoria FBM, para quem não há empresas excessivamente expostas nesses contratos, como em 2008 e que provocou grandes prejuízos à Aracruz e à Sadia.
Luis Otávio Leal, economista-chefe do banco ABC Brasil, lembra que fazer operações de proteção ficou mais caro após o governo adotar, no fim de julho, duras medidas para conter o derretimento da moeda americana.
Desde então, quem faz operações vendidas (aposta na queda do dólar) acima de US$10 milhões e não tem contrapartida em operações compradas (aposta na alta do dólar) passa a pagar Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) de 1% sobre a diferença:
- Esse custo foi repassado ao cliente. Ficou mais caro para as empresas se protegerem. Foi um efeito colateral da medida. Não tem como o governo conseguir separar o joio do trigo - disse Leal. - Mas também não acredito em uma forte alta do dólar. A tendência é de desvalorização.
Fernando Exel, da Economatica, diz que o lucro das empresas é maior que em 2008, logo, o tamanho relativo da dívida é menor.
E o forte endividamento foi puxado por Petrobras.
Bruno Villas Bôas O Globo
O risco é o repique do dólar
Volume de dívida de grandes empresas em moeda estrangeira é US$38 bi maior que em 2008
Após dois anos de farra na tomada de crédito a juros baixos no mercado internacional, as empresas brasileiras terão que enfrentar a nova turbulência da economia mundial endividadas como nunca em moeda estrangeira.
Um estudo da Economatica feito a pedido do GLOBO mostra que 212 empresas brasileiras de capital aberto acumulavam uma dívida de US$90,256 bilhões ao fim de março deste ano.
Esse montante representa um aumento de 74% - ou mais US$38,4 bilhões - frente ao endividamento delas em setembro de 2008 (US$51,868 bilhões), mês que marcou o ápice da crise financeira internacional com a quebra do banco Lehman Brothers.
Para especialistas, os riscos do pesado endividamento estão nos repiques de alta da moeda americana, um movimento clássico nas crises. Isso elevaria em reais os custos para as empresas pagarem suas dívidas.
Nas últimas três semanas, por exemplo, esses custo subiu R$8,67 bilhões após a valorização do dólar em R$0,10.
Nesse período, a taxa Ptax do Banco Central (BC) - uma cotação do dólar no mercado interbancário - avançou de R$1,534 (menor valor em 12 anos) para R$1,630, efeito do corte da nota de risco dos Estados Unidos pela agência Standard & Poor"s (S&P).
Petrobras eleva dívida em US$29 bi
Entre os economistas, poucos acreditam em uma forte valorização do dólar nos próximos meses. No boletim Focus do BC, por exemplo, a taxa média de câmbio projetada pelo mercado para o fim deste ano permanecia a R$1,60 na segunda-feira passada.
Poucos também acreditavam, contudo, que a moeda americana sairia de R$1,562 para R$2,536 entre julho e dezembro de 2008, o que de fato ocorreu após a quebra do banco Lehman Brothers.
- Eu não acredito numa alta abrupta do câmbio. Mas obviamente conhecemos a história e sabemos que grandes movimentos cambiais acontecem - avalia o economista Armando Castelar, professor da Fundação Getulio Vargas (FGV).
- Uma valorização mais forte do dólar pode ter impacto sobre a saúde financeira das empresas. Foi o que aprendemos com a experiência:
no pânico, todos correm para a mesma porta.
O avanço do endividamento em moeda estrangeira foi liderado pela Petrobras.
A estatal elevou em US$29,2 bilhões sua dívida em dólares nos últimos três anos, para US$44,9 bilhões ao fim de março passado. Em janeiro, por exemplo, a companhia captou US$6 bilhões no mercado de dívida externa, com emissão de bônus.
Outras empresas também tiveram forte aumento da dívida frente a setembro de 2008, como a Telemar Norte Leste (mais US$3,3 bilhões),
Fibria (US$2,6 bilhões)
e JBS (US$2,17 bilhões).
Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating, explica que esse forte aumento tem origem no casamento do acelerado crescimento da economia brasileira e uma farta oferta de crédito no mercado internacional.
- O Brasil saiu na frente após a crise, com bons números de emprego, produção e demanda por investimentos. Como aqui os juros são altos, as empresas foram pegar empréstimos nos EUA, Europa, Japão, que estão com juros baixíssimos para incentivar suas economias - explica Agostini. - O Brasil foi um dos maiores receptadores de crédito externo no mundo.
Proteção mais
cara após medidas
Para evitar perdas com o aumento do dólar, as empresas realizam em bancos uma espécie de seguro contra os solavancos da moeda, a chamada operação de hedge (proteção, em inglês). Os bancos assumem o risco da oscilação do dólar, operando contratos no mercado futuro, em troca de um prêmio pelo risco.
Mas esse prêmio é caro.
Por isso, muitas companhias acabam protegendo apenas parte das dívidas em moedas estrangeiras.
- Quem tem dívida muito longa, como dez anos, paga uma taxa gigantesca para proteger-se do câmbio. Por isso, empresas não cobrem 100% do que devem em dólar. Elas assumem uma parte do risco e de eventual perda - explica Ivan Nacsa, da consultoria FBM, para quem não há empresas excessivamente expostas nesses contratos, como em 2008 e que provocou grandes prejuízos à Aracruz e à Sadia.
Luis Otávio Leal, economista-chefe do banco ABC Brasil, lembra que fazer operações de proteção ficou mais caro após o governo adotar, no fim de julho, duras medidas para conter o derretimento da moeda americana.
Desde então, quem faz operações vendidas (aposta na queda do dólar) acima de US$10 milhões e não tem contrapartida em operações compradas (aposta na alta do dólar) passa a pagar Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) de 1% sobre a diferença:
- Esse custo foi repassado ao cliente. Ficou mais caro para as empresas se protegerem. Foi um efeito colateral da medida. Não tem como o governo conseguir separar o joio do trigo - disse Leal. - Mas também não acredito em uma forte alta do dólar. A tendência é de desvalorização.
Fernando Exel, da Economatica, diz que o lucro das empresas é maior que em 2008, logo, o tamanho relativo da dívida é menor.
E o forte endividamento foi puxado por Petrobras.
Bruno Villas Bôas O Globo
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