"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

abril 23, 2011

EM DEZ ANOS, MEIO BRASIL DO BRASIL , SÓ COM AUMENTO DOS IMPOSTOS.


Em dez anos a carga tributária do Brasil subiu cinco pontos percentuais do PIB. É um peso de impostos muito maior do que o de muitos países ricos que oferecem serviços melhores aos cidadãos.

Os impostos são mal distribuídos; pesam mais sobre o trabalho e a produção do que sobre o patrimônio.
As isenções e os Refis criam desigualdades entre os contribuintes.


De acordo com um estudo do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), o Brasil tem a décima quarta maior carga tributária entre os países da OCDE.
O país não faz parte dessa organização onde está a maioria dos países mais ricos do mundo; mas se fizesse, estaria nesta posição no ranking.
Têm carga menor que a do Brasil países como Estados Unidos, Canadá e Espanha. Só para ficar em alguns.


Ninguém é contra o pagamento de impostos, mas hoje, a carga tributária virou um problema econômico, segundo o presidente do IBPT, João Elói Olenike.

- É insustentável continuar aumentando os impostos assim. Isso cria distorção e atrapalha o crescimento. Para se ter uma ideia, em 2001, a carga era 30,03% e em 2010, foi para 35,13%. Isso significa que o governo tirou a mais da sociedade, só com esse crescimento, no acumulado de dez anos, R$1,850 trilhão.
Tirou meio Brasil do Brasil em dez anos, só com o aumento dos impostos.


Bianca Xavier, que é coordenadora de pós-graduação de Direito Tributário da Fundação Getulio Vargas, pondera que o refinanciamento das dívidas fiscais só pode ser um instrumento usado uma vez. Se é um mecanismo frequente, alguma coisa está errada.

- Houve Refis em 2000, 2003, 2006, 2009 e daqui a três anos vão esperar que aconteça outro. É um sintoma de que o governo reconhece que as empresas precisam de um mecanismo de recuperação fiscal, ou seja, que a carga é alta demais.

A Procuradoria da Receita Federal tem dito que isso causa um problema de isonomia. Afinal, quem paga em dia é prejudicado. Quem não paga e entra no Refis tem 180 meses para pagar e juros mais baixos.


Conversei com os dois especialistas no programa da Globonews desta semana.
O que fica claro para quem se detém um pouco nesse tema é o emaranhado que é a estrutura de impostos no Brasil.
Mesmo quem sabe que o país tem impostos e taxas demais, fica espantado com a informação dada por Bianca Xavier de que a cada hora duas normas tributárias são baixadas no Brasil.

Ela conta que frequentemente tem de desdizer numa aula o que disse na aula anterior, porque entre uma e outra, a norma que havia explicado é alterada.


João Elói lembra outra perversidade:
há muitos impostos indiretos que recaem sobre o consumo e isso pesa desigualmente sobre os brasileiros.
Quem é mais pobre acaba pagando relativamente mais.
Nos produtos, todos os consumidores, independentemente do seu poder aquisitivo, pagam o mesmo imposto.
E não há transparência.


- Em outros países, há o Imposto sobre Valor Adicionado e as notas discriminam o quanto de imposto está sendo pago em cada produto. No Brasil, o consumidor não sabe quanto está pagando em cada mercadoria.
O imposto sobre patrimônio no Brasil é baixo; 70% da carga recaem sobre produção, faturamento e salário.

As empresas têm de pagar R$120 de impostos, taxas e contribuições em cada R$100 pagos de salário. Isso incentiva a informalidade ou o pagamento de parte do salário por fora.


A informalidade é outro problema decorrente dos excessos de regras, impostos e carga tributária no Brasil.
Os dois especialistas acham que nos últimos anos a tendência tem sido diminuir a informalidade, com as notas fiscais eletrônicas e outros mecanismos de fiscalização.

Mesmo assim, diz João Elói, de cada R$1 arrecadado, pelo menos R$0,30 estão sendo sonegados. Bianca Xavier lembra que isso deveria estar reduzindo o peso dos impostos sobre os contribuintes.


- Se numa mesa de restaurante alguns saem sem pagar, a conta fica maior para quem fica. Mas se há mais pessoas entre os pagantes, a conta deveria ficar relativamente mais leve. E isso não está acontecendo.

Segundo um texto divulgado recentemente pelo IBPT, "o brasileiro, em geral, não é contra o pagamento de tributos, até mesmo porque tem consciência de sua importância para custear a máquina pública.
O que o angustia e causa revolta é saber que paga - e paga muito - ao governo e não tem um retorno minimamente satisfatório".
De acordo com João Elói, o maior peso recai sobre a classe média.


As isenções dadas a algumas empresas ou a alguns setores criam outras injustiças.

- Isenção é política fiscal. Toda vez que o governo dá uma isenção, alguém vai ter de pagar por isso. É preciso saber quem está sendo desonerado, as razões dos benefícios e quem pagará por eles.
Tem de ser isonômico.
Não se pode dar para uma empresa e não para o concorrente.

Até recentemente, para citar um exemplo, a LG tinha um benefício que a Phillips não tinha no mesmo produto. Tributo tem de ser neutro. Desonerações são privilégios - diz Bianca Xavier.


Quando o governo sustenta que a carga brasileira não é alta, certamente não está pensando em tudo isso:
que ela é mais alta que a de muitos países que oferecem serviços melhor, que é desigualmente distribuída, que as desonerações são arbitrárias, que tem aumentado ano a ano, que existem normas, impostos e taxas demais enlouquecendo o contribuinte.

Além disso, não há no horizonte um alívio desse peso e destas complicações que atormentam o contribuinte brasileiro.

Míriam Leitão/O Globo

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