"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

outubro 07, 2010

MANO A MANO - E POUCO ESPAÇO PARA O ME ENGANA QUE EU GOSTO.


Se o PT pode retirar o tema do aborto do programa aprovado pelo partido porque atrapalha a campanha eleitoral, com a mesma facilidade pode repor o assunto na agenda quando achar que não há mais obstáculos.

Esse tipo de gesto dificilmente convenceria alguém e poderia representar um grave risco para a candidata Dilma Rousseff: os grupos religiosos não ficariam satisfeitos, as pessoas que concordam com a descriminalização do aborto ficariam insatisfeitas e a campanha deixaria a impressão geral de que quis fazer todo mundo de bobo.

Conforme ficou demonstrado pelo resultado do primeiro turno, o brasileiro não está naquele estado de idiotia que se imaginou.
Ainda sabe fazer umas contas, discerne razoavelmente umas coisas das outras e não se deixa levar pelo cabresto.

Por isso mesmo a maquiagem tem limite e, principalmente agora no segundo turno, os poderes do marketing também.
Há controvérsia sobre o velho dito segundo o qual eleição do segundo turno é outra eleição.

Quem discorda fala da quase impossibilidade de primeiro e segundo colocados inverterem as posições.
De fato, a virada não é a regra.
Mas é um outro tipo de processo.

Nele, há muito pouco espaço para enganação:
o mano a mano põe os candidatos face a face numa luta sem segunda chance.

O horário eleitoral deve prender atenção do eleitorado muito mais:
porque é mais curto - dez minutos para cada lado - e porque não tem mais aquele desfile de candidatos aos parlamentos.

São vinte e poucos dias de adrenalina.
Nesse período conta muito menos a propaganda e muito mais a estratégia.
Ou seja, a política, tudo o que faltou no primeiro turno.

Ambos os grupos adversários estarão com suas figuras de ponta eleitas e liberadas para cair na batalha.
vantagens e desvantagens para Dilma Rousseff e José Serra.

Ela continua com duas imensas vantagens:
o presidente Lula na chefia dos trabalhos e a dianteira de muitos milhões de votos.

Ele tem em seu favor o espaço de conquista de eleitores nos dois maiores colégios eleitorais, cujos governadores eleitos são do PSDB, e o ânimo renovado de militantes e eleitores pela possibilidade real de vitória, sentimento que tinha sido arquivado havia uns dois meses.

Dilma carrega passivos importantes:
os ecos do escândalo Erenice Guerra, os temas polêmicos (aborto, imprensa, casamento gay, direito de propriedade) que o partido abraça e que o governo incorporou no Plano Nacional de Direitos Humanos 3, achando que a concessão à esquerda não renderia problemas e poderia dar até certo charme à candidata.

Serra vem de uma campanha horrível em que ele errou mais que todos, mas não errou sozinho.
Achou que ganharia a eleição por gravidade, por sua bela formação, sua excelente trajetória.
Esqueceu-se apenas de compartilhar essa maravilha com o País e de dar a ela uma forma política que pudesse construir na cabeça das pessoas uma representação de alternativa de poder.

O PSDB tem as próximas semanas para mostrar se tem unidade, vontade e inteligência para falar direito com o eleitor.

A grande vantagem do tucano é que a campanha não pode piorar.

Já os petistas que achavam que a campanha não precisava mudar nada, tiveram de se deparar com a dura realidade relatada pelos governadores na primeira reunião pós-primeiro turno.
Aliás, realizada no Palácio da Alvorada, sob a égide da ilegalidade - para não perder o hábito.

O governador de Pernambuco, Eduardo Campos, puxou o assunto e vários concordaram:
Lula errou ao ser tão agressivo e o PT inteiro, candidata inclusive, ao se comportar como se a eleição estivesse ganha.

Consta que Lula prometeu ser elegante nos modos, que Dilma falará com Deus em público quando necessário e que os petistas serão humildes como discípulos de Francisco, o santo.

Isso com a colaboração de Ciro Gomes, que agora passa a integrar a coordenação de campanha, onde se prometeu também lugar de destaque para o PMDB.

Para quem?
Para o partido que segundo Ciro pode ser definido como um "ajuntamento de assaltantes".
Serão dias inesquecíveis.

Dora Kramer/O Estado de São Paulo

Nenhum comentário: