"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

setembro 14, 2009

Congresso fraco, Executivo forte e as consequências 

De Josias Souza(Uol)


Na última quarta-feira, ocorreram em Brasília três fatos que, dão uma idéia do estágio pouco civilizado a que chegou a democracia brasileira.

  

Fato 1: Depois de se entender com os líderes partidários, Michel Temer foi até Lula. Pediu-lhe que retirasse do pacote do pré-sal o selo da urgência.

Em vez da tramitação de 45 dias, prazo de 60 dias. O mínimo para que os deputados pudessem analisar quatro projetos de interesse estratégico.

Em troca do fim da urgência, o presidente da Câmara empenhou sua palavra: iria a voto, impreterivelmente, a partir do dia 10 de novembro. Lula assentiu.


 

Fato 2: Levados pelo ministro Alfredo Nascimento (Transportes), executivos de dez das maiores empreiteiras do país foram ao gabinete de Lula.

Falando a mesma linguagem do próprio Lula, queixaram-se dos rigores da malha fiscalizatória do Estado. Disseram que, mantidas as regras, as obras públicas estão comprometidas ao atraso.(Leia-se eleições 2010).


Conversa vai, vem, combinou-se que os empreiteiros redigirão um pacote de "intenções". Coisa rápida, para “os próximos dias”.

Buscam-se formas de "amarrar" os poderes de órgãos como TCU, Ministério Público e Ibama. Em outras palavras: um refresco à transgressão.

 

Fato 3: Relator do processo do mensalão, o ministro Joaquim Barbosa, do STF, endereçou a Lula um ofício.

No texto, o ministro informou ao presidente que ele fora arrolado como testemunha, por uma trinca de réus da “quadrilha” (definição do procurador-geral da República).
Lula terá de passar pelo constrangimento de depor. Poderá fazê-lo pessoalmente em dia, hora e local de sua preferência ou por escrito.
 

Na cena de número um, o que se viu foi o presidente de uma das Casas do Legislativo, implorando, rogando ao chefe do Executivo que lhe desse tempo.
Prazo para analisar projetos relacionados à exploração de jazidas que, só vão virar petróleo comercial depois de 2015.
 

Na cena de número dois, aparece o poder paralegislativo. Ou, por outra, uma espécie de neolegislativo, representado pelos empreiteiros.
É gente que vai a Lula para acertar os detalhes de assuntos que deveriam passar primeiro pelo Congresso.
A anormalidade do Legisaltivo paralelo tornou-se rotina. Deseja-se alterar os encargos trabalhistas? Lula chama as centrais sindicais.
É preciso encontrar uma saída para os reajustes “impossíveis” que o Senado injetou nas aposentadorias? Convocam-se as entidades que representam a classe.
Nesse jogo, deputados e senadores, transformados em pseudolegisladores, chegam sempre com atraso nas decisões.
Quando acordam, já estão com uma nova medida provisória. Ou com projetos prontos e com selo da urgência.


A cena de número três completa o quadro, emoldurando-o. Mostra um Lula que, embevecido pela popularidade lunar, sem questão de aprender com o passado.
Um passado tão recente quanto lamentável. Ao responder à inquirição do Supremo, o presidente com certeza irá usar o recurso aceito até o presente momento, a manjada e cínica fala: “Eu não sabia”.
No futuro, confirmando-se o amarramento da fiscalização tramada pela grande empreita, Lula não terá como desculpa a cequeira como defesa.
Nesse caso, os escândalos que aguardam na fila para acontecer terão como origem o encontro sinistro da "gangue" suspeita com o presidente.


Um presidente que, tendo a obrigação de proteger as arcas da Viúva, prefere vestir a camisa do time violador.
Entre as empreiteiras que cruzaram a porta do gabinete de Lula estava, por exemplo, a Camargo Corrêa, estrela da Operação Castelo de Arera.
Em relatório enviado ao Ministério Público, a Polícia Federal de Lula sustenta, entre outras coisas, que a empreiteira superfaturou uma obra da festejada Petrobras.
Uma refinaria chamada Abreu e Lima, assentada em Pernambuco. Por uma dessas ironias do destino, quem detectou o sobrepreço foi o TCU.
O mesmo TCU que Lula e o ministro Nascimento, em inusitado conluio com os fiscalizados, deseja amarrar.


Neste sábado (12), três dias depois da inusitada conversa, noticia-se que parte dos "interlocutores" de Lula está na bica de receber a visita de agentes da PF.
Lula despreza o grande, essencial, e o primeiro de todos os conselhos: “Meu filho, cuidado com as más companhias”.



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