"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

novembro 15, 2012

POBRE BRASIL ! MINISTÉRIO CHIQUEIRO? Falta Cardozo dizer a que veio

Por mais chocantes que sejam, as declarações do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, sobre o sistema penitenciário nacional são a mais pura expressão da verdade. De fato, os cárceres brasileiros são "medievais" e violadores contumazes dos direitos humanos. 

Só que esse diagnóstico já é velho. 

Além disso, ele é a autoridade responsável pela segurança pública e pelas garantias constitucionais no país, e está prestes a completar dois anos no cargo. 

Mais: 
pertence a um partido (o PT) que, em 1º de janeiro próximo, fará aniversário de uma década no poder. Mas, embora tudo isso, ainda não se conhece plano capaz de tirar da falência — é essa a qualificação — a estrutura prisional do Brasil.

Houvesse necessidade de atestar a trágica realidade, isso o ministro teria feito, ao admitir que, "se fosse para cumprir muitos anos na prisão, em alguns dos nossos presídios, eu preferiria morrer". Mas, há mais de dois anos, outra autoridade também da mais alta estirpe já havia emitido opinião no mesmo sentido e com igual gravidade. 

Em abril de 2010, durante o 12º Congresso da ONU sobre Prevenção ao Crime e Justiça Criminal, em Salvador, o ministro do Supremo Tribunal Federal Cezar Peluso reconheceu que, em alguns casos, o tratamento dispensado aos prisioneiros no país "é um crime do Estado contra o cidadão".

Sete meses atrás, o quadro de caos foi mensurado pelo próprio Ministério da Justiça, com a simples divulgação de balanço anual. Afinal, medida precisa pode ser tomada com o cálculo da proporção entre a abertura de 8.222 vagas e a prisão de mais 18.331 pessoas ao longo de 2011. 

O resultado da equação é apenas um: 
o aumento do deficit de lugares em celas, que passou de 197.976, em dezembro de 2010, para 208.085 no fim do ano passado — o correspondente a 40% da população carcerária. O que não existe é uma fórmula mágica que combine superpopulação com ressocialização.

Pelo contrário; transformadas em escolas do crime, nossas penitenciárias multiplicam o problema em progressão geométrica. A reincidência beira os 70%. E o sistema jurídico nacional contribui para potencializar a calamidade. Primeiro, pela cultura de que prender é a solução. Basta ver que o Brasil só perde para os Estados Unidos, a China e a Rússia em número de presos. 

Aqui, manda-se para a cadeia até quem não teve processo transitado em julgado, situação de mais de um terço da população carcerária. Parece que depositar malfeitores atrás das grades é garantia de segurança. É, sim, uma ilusão, uma falsa sensação de combate à impunidade.

Urge construir vagas com mais celeridade, mas sobretudo abrir outras, liberando trancafiados que nem foram condenados e tirando para fora — não para a liberdade irresponsável, mas vigiada — os de baixa periculosidade. Esses devem prestar serviços à sociedade, sob a responsabilidade do Estado. Aliás, também os presos precisam ser arrancados do ócio e postos a trabalhar. 

Portanto, em vez de alarmismo, cabe ao ministro José Eduardo Cardozo liderar a revolução necessária ao setor. Mas foi bom que ele tivesse desabafado. 

Agora está obrigado a dizer a que veio.
 Correio Braziliense

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