"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

novembro 01, 2012

O Nordeste à míngua

O Nordeste impôs ao PT uma derrota acachapante nestas eleições.

A região mostrou, em primeiro lugar, que não aceita tutela de quem quer que se arvore líder de sua população. Mas exprimiu, igualmente, repúdio a um governo que não vem dando a merecida atenção aos nordestinos.

Tanto Lula quanto Dilma Rousseff foram eleitos com votações acachapantes no Nordeste:
 tiveram 61% e 70% dos votos, respectivamente, nas eleições de 2006 e 2010. Em campanha, o PT prometeu a redenção da região, por meio de obras há muito aguardadas pela população. Mas, depois de uma década de governo petista, nada, rigorosamente nada, foi concluído.

A lista de promessas é robusta e, se tivesse sido concretizada, poderia ter contribuído para que a região diminuísse expressivamente o hiato que ainda a separa do restante do país - o Nordeste tem quase 28% da população brasileira, mas participa com pouco mais de 13% do PIB. Inclui refinarias, 
melhoria da malha rodoviária, em especial a BR-101, 
a conclusão da ferrovia Transnordestina 
e, principalmente, a transposição das águas do rio São Francisco.

Nesta semana, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) divulgou levantamento em que mostra que, de uma lista de 83 projetos prioritários para o Nordeste, somente 25% estão em andamento. Um extenso rol de obras continua na gaveta ou avançam a passos de cágado, como é mais notável no caso das ferrovias e dos portos.

Isso torna as condições logísticas da região muito prejudicadas, impedindo maior expansão da economia local. Enquanto a carteira de obra classificadas como prioritárias na região atinge R$ 25,8 bilhões, os gastos com transportes no Nordeste somam a R$ 30 bilhões. "Os investimentos nos projetos de infraestrutura teriam retorno em pouco mais de quatro anos", avalia o Valor Econômico.

O exemplo mais gritante da incúria do governo federal em relação ao Nordeste continua a ser a transposição das águas do Velho Chico. A obra foi apresentada no governo de Luiz Inácio Lula da Silva como a salvação do semiárido, assolado por frequentes estiagens e indesejáveis faltas d'água. Prometida para 2010, não deve ficar pronta sequer na gestão Dilma, sobrando para 2020.

Lançada como uma das vedetes do hoje esquecido PAC, em janeiro de 2007, a transposição deveria assegurar oferta de água a cerca de 400 municípios dos estados de Pernambuco, Ceará, Paraíba e Rio Grande do Norte. Mas oito dos 16 lotes que compõem a obra estão hoje paralisados - muitos a cargo da Construtora Delta, blindada pelo governo petista e sua base aliada na CPI do Cachoeira - e somente um foi concluído:
o chamado canal de aproximação do eixo norte, em Cabrobó (PE).

Mas, mesmo já inaugurado, este trecho não leva água alguma para as famílias do semiárido, conforme mostrou o (Correio Braziliense) há um mês:
"Ninguém foi beneficiado pelo canal com pouco mais de dois quilômetros porque, até hoje, uma estação de bombeamento e uma ponte não estão prontas." A ponte sequer começou a ser construída e a estação só deve ser finalizada no fim de 2014.

A transposição envolve obras numa extensão de 713 quilômetros de canais. Orçada inicialmente em R$ 4,5 bilhões, já praticamente dobrou de valor, mas continua longe da conclusão. Sobram denúncias de sobrepreços, superfaturamento e desvio de recursos públicos. A Controladoria Geral da União também já apontou deficiências graves nos projetos básico e executivo das obras e falhas de fiscalização por parte do Ministério da Integração Nacional.

Enquanto isso, o semiárido nordestino agoniza com a falta d'água e a perspectiva de um verão rigorosíssimo. A estiagem já atinge 80% de Pernambuco e 90% da produção agrícola de Ceará e Piauí está comprometida. O Jornal do Commercio mostra hoje em manchete que 2012 já é o ano mais seco na região desde 1985.

Alterar as condições climáticas é algo que escapa à intervenção humana. Mas ações que poderiam reduzir as agruras que o sol inclemente impõe ao Nordeste poderiam muito bem ser desenvolvidas pelo poder público. 

A região exige e merece mais atenção do governo federal, e não apenas promessas vãs e compromissos nunca honrados.

Fonte: Instituto Teotônio Vilela
O Nordeste à míngua

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