"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

agosto 24, 2012

O "PRECEDENTE" DO PRECEDENTE ! "um menino inteligente e estudioso da mamãe" e AFILHADO ...

Ao rebater as denúncias contra o deputado João Paulo Cunha (PT-SP), o ministro Ricardo Lewandowski abriu uma porta para a absolvição de pelo menos 16 acusados de receber dinheiro das empresas de Marcos Valério.

Para inocentar presidentes de partidos e parlamentares, o revisor do processo do mensalão pode se basear num precedente ocorrido em 1994 no julgamento do ex-presidente — hoje senador — Fernando Collor de Mello (PTB), no Supremo Tribunal Federal.

O argumento é de que, para caracterizar o crime de corrupção passiva, é necessário comprovar ato de ofício praticado pelo réu como contrapartida à vantagem recebida.

Significa comprovar que houve uma troca. Um funcionário público praticou ato que estava sob sua responsabilidade direta em razão do cargo e recebeu como vantagem algum tipo de benefício.

Essa relação direta não foi comprovada, na visão dos ministros do STF, quando estavam em discussão crimes praticados por Collor em sua passagem pela presidência da República, mesmo depois de sofrer impeachment no Congresso.


No caso de Collor, a acusação era de que recebeu um Fiat Elba. Não se comprovou, no entanto, qual ato foi praticado em troca do presente. Desde então, formou-se a convicção do meio político de que a denúncia, assinada pelo então procurador-geral da República, Aristides Junqueira, foi inepta, ou seja, continha brechas para absolver Collor.

Um dos integrantes do STF na época, Celso de Mello, que concordou com a tese, vai votar agora também no mensalão. Esse raciocínio foi lembrado ontem por Lewandowski para absolver o deputado João Paulo Cunha. O petista recebeu R$ 50 mil das empresas de Marcos Valério por meio da mulher, Márcia Regina Cunha.

Ela sacou o dinheiro em espécie da conta da SMP&B. João Paulo justificou a operação como a entrega de dinheiro do PT para pagar pesquisas eleitorais no município de Osasco (SP).
Para Lewandowski, o Ministério Público "não conseguiu provas, nem sequer indícios" de que João Paulo Cunha tenha adotado qualquer medida para favorecer a SMP&B na licitação para contratação de agências de publicidade na Câmara dos Deputados em 2003, quando presidia a Casa.

O revisor ressalta que ficou provado nos autos que os R$ 50 mil que a mulher de João Paulo sacou da conta da SMP&B representam uma transferência de recursos do PT para pagar a pesquisa eleitoral, ou seja, foi dinheiro do partido que passou pelas empresas de Marcos Valério.

O revisor considerou que tal medida não representou corrupção passiva, peculato ou lavagem de dinheiro.

Isonomia

Seguindo a lógica de Lewandowski, outros políticos que receberam dinheiro de Marcos Valério sob o argumento de que a origem seria o PT podem ter esperança de receber tratamento isonômico no voto do revisor.

Se não houve ato de ofício entre o presidente da Câmara que mantinha um contrato com a empresa que repassou o pagamento, outros políticos podem ser ainda mais beneficiados.


Na denúncia, a Procuradoria Geral da República sustenta que os pagamentos foram feitos em troca de apoio político no Congresso ao governo Lula, entre 2003 e 2005. Será necessário, no entanto, comprovar, na visão de Lewandowski, em detalhes, que atos foram praticados em benefício de Marcos Valério.

A posição do revisor abre uma divergência, mas não significa que será aceita pelos demais ministros.

O clima entre advogados no plenário retratava o sentimento da defesa em relação ao voto de Lewandowski. A manifestação do revisor devolveu aos defensores a esperança de que seus clientes poderão ser absolvidos.

"Está estabelecido o contraditório", comemorou Márcio Thomaz Bastos, advogado da ex-presidente do Banco Rural Kátia Rabello, e autor da tese de caixa dois, quando exercia o cargo de ministro da Justiça no governo Lula.


Um experiente jurista que defende um dos réus avalia que o voto do revisor foi "impressionantemente bem articulado".

Os repasses
Confira os acusados de receber dinheiro no mensalão


Pedro Corrêa (PP)
Era presidente do PP e deputado federal por Pernambuco. Teve o mandato cassado. Teria recebido uma parte dos R$ 4,1 milhões repassados por Marcos Valério ao PP.
Alega que recebeu do PT

Pedro Henry (PP)
Era deputado por Mato Grosso e líder do PP na Câmara. Ainda exerce mandato de deputado federal. É acusado de ter recebido uma parte de R$ 2,9 milhões repassados por Marcos Valério ao PP.
Seria dinheiro do PT

João Cláudio Genú (PP)
Era assessor do deputado José Janene (PP-PR), que morreu em setembro de 2010. Suposto homem de confiança da cúpula do PP. Responde como intermediário do repasse das empresas de Marcos Valério para o partido

Valdemar Costa Neto (PL, hoje PR)
Deputado federal pelo PR-SP, era o presidente do PL.
Teria recebido R$ 8,85 milhões, sendo R$ 6 milhões por meio da empresa Guaranhuns Empreendimentos;
R$ 1,5 milhão diretamente de Marcos Valério;
R$ 1 milhão por intermédio de Jacinto Lamas;
R$ 350 mil de Antonio Lamas

Jacinto Lamas (PL, hoje PR)
Tesoureiro do PL até fevereiro de 2005, é apontado como intermediário dos repasses do esquema de Marcos Valério

Bispo Rodrigues (PL, hoje PR)
Era deputado pelo PL do Rio de Janeiro e vice-presidente do partido. Teria recebido R$ 150 mil de Simone Vasconcelos, então diretora administrativa-financeira da SMP&B.
Alega que era dinheiro do PT

Roberto Jefferson (PTB)
Presidente nacional do PTB, era deputado federal e perdeu o mandato em decorrência das denúncias que ele mesmo fez. Recebeu R$ 4 milhões de Marcos Valério na sede do PTB, num acordo com o PT que previa o repasse de R$ 20 milhões

Emerson Palmieri (PTB)
Era tesoureiro informal do PTB. Recebeu R$ 4 milhões do esquema de Marcos Valério.
Também recebeu R$ 1 milhão e repassou ao ex-presidente do PTB José Carlos Martinez

Romeu Queiroz (PTB)
Era deputado federal pelo PTB de Minas Gerais. Recebeu R$ 102,8 mil que seria para o próprio. Ao lado de Emerson Palmieri, também teria levado R$ 1 milhão para o PTB

José Borba (PMDB)
Atual prefeito de Jandaia do Sul (PR), era deputado pelo Paraná e líder do PMDB. Recebeu R$ 200 mil de Simone Vasconcelos.
Alega que era dinheiro do PT

Paulo Rocha
Era presidente do PT no Pará e líder do PT na Câmara. Recebeu R$ 820 mil das empresas de Marcos Valério.
Disse que era para o partido

Anita Leocádia
Era assessora do então deputado Paulo Rocha. Recebeu R$ 620 mil das empresas de Marcos Valério em nome do chefe.

Professor Luizinho
Era deputado federal pelo PT-SP. Recebeu R$ 20 mil de Marcos Valério.

João Magno
Era deputado pelo PT-MG. Recebeu R$ 360 mil das empresas de Marcos Valério.

Anderson Adauto
Atual prefeito de Uberaba (MG), ele era ministro dos Transportes até 2004.
A acusação é de que recebeu R$ 940 mil de Marcos Valério.

José Luiz Naves
Era chefe de gabinete de Anderson Adauto.
Recebeu R$ 600 mil em nome do então ministro dos Transportes.

ANA MARIA CAMPOS e DIEGO ABREU Correio Braziliense


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