Para quem atuou no governo antes dos anos 90, era fácil perceber que não existia mais planejamento de longo prazo no Brasil. Quase 100% das energias eram concentradas no equacionamento do problema central, a inflação crônica e ascendente, e seus desdobramentos nocivos.
A sensação era de que o curto prazo era péssimo, mas uma hora as atenções se voltariam para o futuro, em que o Brasil sempre foi visto com muito otimismo. Não éramos o "país do futuro"?
Só que, mesmo tendo comemorado os 18 anos de vida do bem-sucedido Plano Real, o País parece ainda voltado basicamente para o curto prazo. Ou seja, falta planejamento estratégico de longo prazo, algo que é trivial para a maioria das empresas.
Falo de algo bem simples:
metas macroeconômicas básicas,
diagnóstico dos principais problemas
e delineamento de caminhos para chegar lá.
Em parte isso pode ser explicado pelas crises recentes.
É difícil falar de longo prazo quando estouram crises da magnitude das crises americana e europeia.
Mas o fato é que, no geral, os dirigentes políticos tendem a pensar principalmente na sua manutenção no poder, o que encurta fortemente o horizonte de tempo de suas análises, como se não fosse fundamental ter um roteiro básico de prazo mais longo para ir orientando os passos do País em suas ações diárias, anticrise ou não.
Bom, esse roteiro pode até existir na cabeça de alguns, mas os sinais emitidos sobre o seu conteúdo são sempre muito fracos. Seguem dois exemplos para ilustrar o significado da falta de planejamento de longo prazo.
Primeiro, a questão da poupança pública.
Os dados sobre a decomposição da poupança interna do País são complicados de analisar, mas há pouca dúvida de que a tendência da taxa de poupança pública seja descendente nas últimas décadas, e talvez tenha sido mesmo negativa em vários anos mais recentes no âmbito federal.
Isso explica a queda dos investimentos públicos e uma série de mazelas que a falta destes e a não substituição por um mínimo de inversões privadas têm causado. Como a carga tributária tem subido velozmente no mesmo período - o que é péssimo, por vários motivos conhecidos -, isso significa que os gastos correntes, não importa os seus eventuais efeitos favoráveis, têm crescido demasiadamente.
Como nenhum sinal na direção contrária tem sido emitido, é provável, tudo o mais mantido inalterado, que a poupança pública continue caindo à frente, e com ela os investimentos públicos e a capacidade de produção da economia, ou seja, o crescimento sustentável do Produto Interno Bruto (PIB).
Com efeito, em estudo recente, elaborado com parceiros, ficou evidente que a tendência futura de queda da poupança pública federal é explosiva.
Basta que se mantenham:
1) a atual regra de reajuste do salário mínimo, que prevê a correção anual pelo crescimento nominal do PIB;
2) mesmo apenas uma parte da intensidade dos reajustes salariais e do crescimento das contratações governamentais dos últimos anos;
e 3) os demais parâmetros em vigor na área de assistência social.
Além disso, que os fatores demográficos prossigam na direção de transformar o Brasil num país de idosos daqui a algumas décadas, numa velocidade bem maior do que ocorreu nos países mais desenvolvidos.
Nesses termos, era preciso que o País formulasse um roteiro bem elaborado, mesmo que não fosse para corrigir a poupança pública negativa de hoje, mas ao menos para impedir que a situação continue a se deteriorar nos próximos anos.
Mostrar à sociedade os problemas que ocorrerão ou se agravarão nos próximos anos - como os derivados do estado atual de terra arrasada na infraestrutura - pode ser um instrumento de defesa eficiente para conter as pressões por maiores gastos correntes cada vez mais presentes no dia a dia do Congresso Nacional.
A presidente está certa quando diz que não podemos brincar com o aumento de certo tipo de gasto num ambiente crítico como o atual. Mas faltou dizer que, com ou sem crise, é preciso cortar gastos correntes no setor público, para recolocar o País no trilho do maior crescimento sustentado.
Alguém pode argumentar que é preciso o governo gastar mais quando a economia está cambaleando, como agora. A resposta é afirmativa, mas apenas em investimentos comprovadamente produtivos, e não em gastos correntes camuflados de investimento. Assim, reativa-se a economia e, ao mesmo tempo, amplia-se a capacidade de produzir.
Outro exemplo é a falta de uma discussão mais completa sobre as reais possibilidades de crescimento sustentado do País, tema central do planejamento estratégico global. Autoridades vibraram à época quando saiu o crescimento do PIB em 2010:7,5%.
Lá fora, muitos pensaram que o Brasil estava chegando ao patamar chinês de crescimento: 10% ao ano. Agora, diante da perspectiva de o PIB crescer menos de 2%, baixou uma depressão geral.
Ora, se olharmos os fatores objetivos, o Brasil não crescerá mais de 3,5% ao ano de forma sustentável, a não ser que muita coisa mude, uma delas a reversão da trajetória descendente de poupança pública acima mencionada.
Mas isso já é assunto demais para um único artigo.
Raul Velloso O Estado de S. Paulo
A sensação era de que o curto prazo era péssimo, mas uma hora as atenções se voltariam para o futuro, em que o Brasil sempre foi visto com muito otimismo. Não éramos o "país do futuro"?
Só que, mesmo tendo comemorado os 18 anos de vida do bem-sucedido Plano Real, o País parece ainda voltado basicamente para o curto prazo. Ou seja, falta planejamento estratégico de longo prazo, algo que é trivial para a maioria das empresas.
Falo de algo bem simples:
metas macroeconômicas básicas,
diagnóstico dos principais problemas
e delineamento de caminhos para chegar lá.
Em parte isso pode ser explicado pelas crises recentes.
É difícil falar de longo prazo quando estouram crises da magnitude das crises americana e europeia.
Mas o fato é que, no geral, os dirigentes políticos tendem a pensar principalmente na sua manutenção no poder, o que encurta fortemente o horizonte de tempo de suas análises, como se não fosse fundamental ter um roteiro básico de prazo mais longo para ir orientando os passos do País em suas ações diárias, anticrise ou não.
Bom, esse roteiro pode até existir na cabeça de alguns, mas os sinais emitidos sobre o seu conteúdo são sempre muito fracos. Seguem dois exemplos para ilustrar o significado da falta de planejamento de longo prazo.
Primeiro, a questão da poupança pública.
Os dados sobre a decomposição da poupança interna do País são complicados de analisar, mas há pouca dúvida de que a tendência da taxa de poupança pública seja descendente nas últimas décadas, e talvez tenha sido mesmo negativa em vários anos mais recentes no âmbito federal.
Isso explica a queda dos investimentos públicos e uma série de mazelas que a falta destes e a não substituição por um mínimo de inversões privadas têm causado. Como a carga tributária tem subido velozmente no mesmo período - o que é péssimo, por vários motivos conhecidos -, isso significa que os gastos correntes, não importa os seus eventuais efeitos favoráveis, têm crescido demasiadamente.
Como nenhum sinal na direção contrária tem sido emitido, é provável, tudo o mais mantido inalterado, que a poupança pública continue caindo à frente, e com ela os investimentos públicos e a capacidade de produção da economia, ou seja, o crescimento sustentável do Produto Interno Bruto (PIB).
Com efeito, em estudo recente, elaborado com parceiros, ficou evidente que a tendência futura de queda da poupança pública federal é explosiva.
Basta que se mantenham:
1) a atual regra de reajuste do salário mínimo, que prevê a correção anual pelo crescimento nominal do PIB;
2) mesmo apenas uma parte da intensidade dos reajustes salariais e do crescimento das contratações governamentais dos últimos anos;
e 3) os demais parâmetros em vigor na área de assistência social.
Além disso, que os fatores demográficos prossigam na direção de transformar o Brasil num país de idosos daqui a algumas décadas, numa velocidade bem maior do que ocorreu nos países mais desenvolvidos.
Nesses termos, era preciso que o País formulasse um roteiro bem elaborado, mesmo que não fosse para corrigir a poupança pública negativa de hoje, mas ao menos para impedir que a situação continue a se deteriorar nos próximos anos.
Mostrar à sociedade os problemas que ocorrerão ou se agravarão nos próximos anos - como os derivados do estado atual de terra arrasada na infraestrutura - pode ser um instrumento de defesa eficiente para conter as pressões por maiores gastos correntes cada vez mais presentes no dia a dia do Congresso Nacional.
A presidente está certa quando diz que não podemos brincar com o aumento de certo tipo de gasto num ambiente crítico como o atual. Mas faltou dizer que, com ou sem crise, é preciso cortar gastos correntes no setor público, para recolocar o País no trilho do maior crescimento sustentado.
Alguém pode argumentar que é preciso o governo gastar mais quando a economia está cambaleando, como agora. A resposta é afirmativa, mas apenas em investimentos comprovadamente produtivos, e não em gastos correntes camuflados de investimento. Assim, reativa-se a economia e, ao mesmo tempo, amplia-se a capacidade de produzir.
Outro exemplo é a falta de uma discussão mais completa sobre as reais possibilidades de crescimento sustentado do País, tema central do planejamento estratégico global. Autoridades vibraram à época quando saiu o crescimento do PIB em 2010:7,5%.
Lá fora, muitos pensaram que o Brasil estava chegando ao patamar chinês de crescimento: 10% ao ano. Agora, diante da perspectiva de o PIB crescer menos de 2%, baixou uma depressão geral.
Ora, se olharmos os fatores objetivos, o Brasil não crescerá mais de 3,5% ao ano de forma sustentável, a não ser que muita coisa mude, uma delas a reversão da trajetória descendente de poupança pública acima mencionada.
Mas isso já é assunto demais para um único artigo.
Raul Velloso O Estado de S. Paulo
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