"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

março 21, 2012

ELE$ QUEREM É FE$TA : REALIZAÇÃO DE EVENTOS R$ 70,73 milhões - PARA A SAÚDE R$ 4,4 milhões, VALOR 16 VEZES MENOR.

Emendas elaboradas pelos deputados priorizam
áreas como cultura e urbanismo e não refletem as necessidades da população.

Valor total destinado a saúde, educação, segurança e transporte corresponde à metade do aplicado em eventos.

Diretamente vinculadas à qualidade de vida, áreas como educação, saúde, segurança e transporte deveriam receber prioridade máxima de quem representa os interesses dos cidadãos.

Mas levantamento sobre a distribuição de emendas dos deputados distritais e a liberação dos recursos pelo governo demonstra claramente quais são as preferências dos políticos.

Entre 19 temas para os quais os deputados poderiam destinar recursos do orçamento, estão no topo da lista dos parlamentares urbanismo, ciência, tecnologia e cultura.

Em uma cidade carente de atendimento hospitalar, boas escolas e transporte público de qualidade parece um contrassenso que, no ranking, a saúde esteja em 11º lugar, o transporte em 15º e a educação ocupe a quinta posição. Como ocorre todos os anos, as emendas dos deputados são definidas em outubro do ano anterior ao atual exercício.

Cada distrital pode opinar em que áreas o governo deve aplicar até R$ 12 milhões. A liberação do dinheiro ocorre, em geral, de maneira gradativa, e depende, quase sempre, de uma intensa negociação entre o Legislativo e o Executivo.

Para 2012, os distritais opinaram em R$ 335,4 milhões. Se fizessem um esforço conjunto, conseguiram erguer três hospitais em cidades carentes ou reformar meia dúzia que já não contam com instalações decentes.

Mas se, em vez de hospitais, olhassem para as escolas, poderiam construir mais 70 instituições e acabar com o problema de superlotação nas salas de aula, um dos fatores que compromete o aprendizado dos estudantes.

Ainda que não vissem essas áreas como melhor opção, os parlamentares também poderiam ter mirado no transporte público, carente de ônibus novos, de organização e de vias mais bem cuidadas.

Descaso
Mesmo somadas, as áreas de transporte, educação, saúde e segurança chegam apenas à metade do que os distritais programaram para aplicar em cultura. A realização de eventos mereceu dos parlamentares a indicação de R$ 70,73 milhões para serem usados neste ano.

Para a saúde, eles enviaram R$ 4,4 milhões, ou seja, valor 16 vezes menor. E se a preferência é explícita na hora de escolher a cultura, também fica clara quando o dinheiro é liberado.

Dos mais de R$ 300 milhões que os deputados apresentaram em emendas, apenas R$ 2 milhões já foram empenhados. O empenho ocorre quando o governo faz o compromisso formal de pagamento. Em geral, do meio para o fim do ano é que ocorrem as liberações com maiores volumes de dinheiro.

E, muitas vezes, a autorização para a quitação fica condicionada a acertos políticos em votações de interesse do Executivo. Da pequena quantia que foi empenhada até agora, quase tudo (R$ 1,98 milhão) foi para a cultura.

Consulta ao relatório de execução orçamentária do governo informa que, entre janeiro e março deste ano, houve um aporte de R$ 500 mil para apoio a atividades culturais em São Sebastião.

A cidade é base eleitoral do deputado Agaciel Maia (PTC), que preside a Comissão de Economia, Orçamento e Finanças (Ceof) da Câmara e foi relator do orçamento.

Os deputados direcionaram outros R$ 50 mil para a Associação Recreativa Desportiva de São Sebastião. Mais R$ 100 mil foram reservados para ajudar a Associação Recreativa Unidos do Cruzeiro (Aruc) a fazer o carnaval deste ano.

Antes de Agaciel ocupar o trono do orçamento, um dos mais disputados na Câmara Legislativa, o posto era do colega Cristiano Araújo (PTB). Hoje, o deputado é o secretário de Ciência e Tecnologia, a área com o segundo maior volume (R$ 73,8 milhões) de recursos destinados pelos distritais.

Na extensa lista de temas que precisam da atenção dos políticos, apenas um item, além da cultura, teve dinheiro empenhado neste primeiro trimestre. Na capital onde ainda faltam equipamentos públicos na saúde, educação e transporte, R$ 50 mil já estão reservados para desporto e lazer.
Nenhum tostão ainda para hospitais ou escolas.

"Questão cultural"
Autor de uma emenda no valor de R$ 1 milhão para difusão cultural, o Agaciel Maia diz que os colegas são pressionados para manter as festividades nas cidades onde têm mais afinidade. Ele argumenta que em São Sebastião, por exemplo, 48% dos moradores têm menos de 30 anos.

"É uma questão cultural, se o deputado deixar de mandar o recurso vai ser mal falado no lugar. E jovem faz questão de são-joão, carnaval, shows", explica o distrital.

Segundo a Coordenadoria de Comunicação Social da Câmara Legislativa, os deputados têm, segundo a legislação que regulamenta a aplicação das emendas parlamentares, a prerrogativa de eleger livremente para quais áreas vão destinar os recursos do orçamento.

O porta-voz do GDF, Ugo Braga, comentou que a liberação das emendas pelo governo reflete a natureza das prioridades eleitas pelos distritais.

"A emenda existe para que o deputado faça seus representados receberem uma parte do orçamento do GDF, que libera o dinheiro de acordo com a vontade do distrital", avaliou.

LILIAN TAHAN Correio Braziliense
Distritais querem festa

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